terça-feira, 17 de setembro de 2024

MESKEREM MEES + BILLIE MARTEN + STILL CORNERS, Festival Manta, CC Vila Flor, Guimarães, 14 de Setembro de 2024

A edição dezassete do Manta vimaranense concentrou no segundo dia uma ementa particularmente suculenta se bem que imprevisível. Exemplo dessa incógnita era a jovem belga Meskerem Mees que se estreava no país para apresentar as canções que, desde muito cedo na juventude, decidiu compor. Dona de uma voz intrigante, começou com uma versão de Jonnhy Flynn, por sinal, uma boa aposta no despertar da atenção quanto à doçura da receita mas, essa, foi mesmo a melhor de um curto e desequilibrado alinhamento. Os vários originais escolhidos transpareceram ainda em bruto e quase inocentes, nada que a perseverança e confiança demonstradas travem numa progressão, certamente, proveitosa. 

 

De outro calibre de refinação é a britânica Billie Marten, senhora de uma carreira já sustentada em cinco álbuns de originais de proeminente acústica. A lembrar, no louro dos cabelos e até na figura, a conterrânea Laura Marling, a coincidência aproxima-as também nos recursos sóbrios da composição e das líricas. Como não admirar "Felling" com que abriu o concerto ou "Toulouse", uma pérola de popicidade adulta e misteriosa que nos levam, sem outro remédio, a ter que começar a ouvir os seus discos como deve ser e como merecem. Excelente surpresa!

 

A segunda investida dos Still Corners pelo Minho em menos de um mês talvez explique a enchente de público, uma expectativa que se agarrou a uma sensação de nostalgia que a sua música evoca desde 2007. As canções, sonhadoras e viajantes, adornam-se pelo fascínio da guitarra de Greg Huges e da voz Tessa Murray, uma marca muito própria que comporta vantagens e óbvios perigos. O exagero é um deles, e essa ratoeira foi notória na noite de Sábado, onde ao "despachar" das canções se juntou uma rotina instrumental que, mesmo sem contratempos, pouco se entranhou e cresceu e que, talvez, um baixista de profundidade apurada pudesse abanar. O pecado ficou demonstrado nalguma da frieza com que a plateia lhes bateu palmas, um envolvimento sonífero que só mesmo os riffs e guitarradas a la Knopfler ou Chris Isaak causaram um leve, mas inconsequente, estremunhar...

JIM WHITE & MARISA ANDERSON, Jazz ao Largo, Claustro da Câmara Municipal de Barcelos, 14 de Setembro de 2024

As seis peças de "Swallowtail", o segundo projecto colaborativo de Jim White e Marisa Anderson, são elucidativas quanto ao poder da música - mesmo que separadas formalmente no disco, a sua apresentação ao vivo mereceu uma perfomamnce contínua ao longo de uma hora, período onde a guitarra e a percussão se fundiram sem pausas ou intervalos num género de fluxo espiritual. 

O fenómeno, presenciado por cerca de sessenta testemunhas de todas as idades, teve no pátio murado do claustro do município barcelence um género de contenção física que não impediu que a energia emanada tenha flutuado muito acima de tudo e de todos no seu intrépido impulso de improvisação, virtuosismo e liberdade. A criação, certamente, irrepetível, navegou constante numa pulsação majestosa, próxima e de um hipnostismo imediato que teve em Jim White um íman atencional. 

A subtileza, a classe, a qualidade de um baterista talvez não sejam mesuráveis, mas sempre que White tira as botas para lá colocar o jogo de baquetas e se senta por trás dela, um círculo mágico parece fechar-se único na grandeza e numa envolvência de inimitável e diferenciador carimbo. Juntar-lhe os redemoinhos e variações da guitarra de Anderson, efusão improvável mas expansiva, é só mesmo um fenómeno de inevitável poder transformado em estrondo. E que bem alto, e ao largo, ele se fez ouvir...  

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

DUETOS IMPROVÁVEIS #293

M. WARD & FOLK BITCH TRIO 
Cry (Godley & Creme) 
Álbum "For Beginners: The Best of M. Ward", 
Merge Records, E.U.A., Setembro de 2024.

BILL MACKAY, Pequeno Auditório, Teatro Rivoli, Porto, 13 de Agosto de 2024

Uma sexta feira 13 foi o dia escolhido para a estreia tardia de Bill MacKay na cidade apesar do compositor e guitarrista de Chicago acumular excelentes discos há muito mais que uma década. Mesmo que parceiro e cúmplice de, entre outros, Ryley Walker, Steve Gunn ou Nathan Bowles, foi sempre sozinho que ganhou reconhecimento, mantendo, contudo, uma discrição mediática que o converteu num segredo bem (a)guardado. 

Paisagens, devaneios, viagens ou memórias, juntaram-se como por simbiose sonora pela guitarra eléctrica que domina de forma hábil e virtuosa e a que juntou, em algumas canções, a voz para contar histórias que foi introduzindo num português colonial surpreendente e divertido. Parte delas, escolheu-as de "Locust Land", disco deste ano na Drag City que o confirma como um músico meticuloso e de uma sagacidade apreciável. O vibrante rasganço, já de pé, com que encerrou o serão entre muitas palmas, teve o condão de revalidar a obrigação de um regresso rápido e de bom caminho. Para o efeito, qualquer dia de um mês será sempre um dia de sorte...

sexta-feira, 13 de setembro de 2024

HURRAY FOR THE RIFF RAFF, ENTRE SÁLVIAS!

Perdida que foi a passagem de Alynda Segarra aka Hurray For The Rifdf Raff por Coura e na expectativa de um regresso rápido, aqui fica (mais) uma demonstração fascinante das suas canções

Gravado em Junho último para a série This Field Recording da NPR americana, no âmbito do Aspen Ideas Festival, o cenário montanhoso do Colorado serve da melhor maneira, entre sálvias e ao longo de vinte minutos, para fazer flutuar ao vento cinco temas ao lado do guitarrista Johnny Wilson, um formato que adoraríamos ver repetido bem por perto... 

LUBOMYR MELNYK, SUA SANTIDADE EM ESPINHO!















Entre a agenda de novos concertos do Auditório de Espinho para o Outuno destaca-se o regresso do mestre pianista Lubomyr Melnyk ao norte do país, depois da passagem por Braga em 2019

Da combinação feliz de minimalismo e meditação que o fizeram um dos mais reputados executantes do mundo, espera-se uma noite de magia e devoção marcada para sábado, dia 2 de Novembro, e onde, certamente, a homenagem sentida aos seus concidadãos ucranianos não deverá faltar. Já há bilhetes.

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

MY BRIGHTEST DIAMOND A DAR LUSTRO!





















Para Shara Nova a relativa distância entre Detroit e Chicago teve as suas compensações - trabalhar no registo de um novo disco do alter ego My Brightest Diamond no estúdio The Loft dos Wilco ao longo de cinco dias do verão do ano passado. Pensava ela em regravar as demos de muitas das canções que foi alinhando previamente, mas Tom Schick, experiente produtor e habitual residente do estúdio, insistiu que a verdura e alguma da rudeza que ouviu se deveria manter e melhorar. 

O resultado está em "Fight the Real Terror", o regresso de Shara aos discos ao fim de oito anos de espera. O tema título é um manifesto tributo a Sinead O'Connor, cuja morte por aqueles dias de Julho levou Nova a não dispensar uma abordagem ao tema do abuso de crianças e que O'Connor denunciou corajosamente numa perfomamce inesquecível a capella de "War" de Bob Marley num programa do SNL em 1992. O toque de desafio e inquietude está, assim, dado para um álbum que fervilha de criatividade e também de alguma revolta na procura de um mundo melhor. A fraternidade e também a solidadriedade, essas precisarão sempre de(ste) lustro...   



JOAN SHELLEY, ANEL DE BELEZA!

Um novo Ep de Joan Shelley está anunciado para Outubro pela No Quarter Records, existindo já em pré-encomenda uma bonita rodela branca gravada de um só lado e limitada nas cópias. A pintura de capa, magnífica, é de Mia Bergeron

A peça de vinil, em jeito de tesouro, guarda cinco novos temas, todos de inspiração no nascimento da filha e numa recente mudança do Kentucky natal, mas as conexões das líricas tocam, naturalmente, outras temáticas. É o caso do tema título "Mood Ring", inebriante canção que só ela sabe embelezar, uma ode ao que nos interliga na amizade ou no amor, afinal, aquilo que nos impele a ir vivendo... 

Shelley toca muitos dos instrumentos e o marido e pai Nathan Salsburg é o autor de algus rifs de guitarra, como os que se ouvem eléctricos perto do final do tema, também ele já rendido à paternidade como entusiasmo artístico. Radiante!

sábado, 7 de setembro de 2024

WILLIAM TYLER, ESTRANHEZAS!















Em 2023 William Tyler editou dois temas em colaboração com Kieran Hebden dos Fourtet, uma manobra arriscada mas saborosa atendendo ao tradicional som da guitarra a que nos habituou, ali polvilhado de samples, beats e vozes soul. Para alguém que já andou pelos Lambchop ou Silver Jews, claro que o avanço efectuado nada têm de inusitado, um espírito aberto que tem levado Tyler a outras dimensões sonoras que, de facto, crescem e florescem devagar. 

Nota-se esse enroscado exploratório no novo tema "Final Flight", desta vez a solo, saído o mês passado e que é o pronúncio de alguma provocação em relação ao passado folk e de que se esperam outras aventuras em 2025. Para já, à estranheza inicial segue-se mais estranheza. Há que insistir... 

Entretanto, a digressão pela Europa agendada para este e o próximo mês foi anulada por doença, mesmo que tal facto não esteja afixado oficialmente pelo artista em nenhum lado. Estranho. 

Certo é que o anunciado e exclusivo concerto ao lado de Ryley Walker marcado para 4 de Outubro no GNRration minhoto já não contará com a sua presença, mantendo-se o evento confirmado somente com Walker. Olhando ao cartaz afixado pelo mesmo Walker desde Agosto, está lá uma outra data, na véspera, dia 3 de Outubro, também no GNRation mas, já na altura, sem referências à parceria em cima do palco com Tyler no dia seguinte. Estranho, mais uma vez!

UAUU #726

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

THE INNOCENSE MISSION, UMA RIQUEZA!





















Depois do disco de antiguidades e registos antigos ao vivo de 2022, onde se escondiam verdadeiras pérolas, os The Innocence Mission anunciam o décimo terceiro álbum de originais, uma já robusta arca de tesouros fortalecida desde 1985. Chama-se "Midwinter Swimmers", terá edição pela Bella Union no final do mês de Novembro, e promete acrescentar novas riquezas a um erário, desta vez, de sons vintage

Numa confissão de Karen Peris, o disco é como se tivesse sido gravado em Western Electric nos anos 60 a pensar em Vashti Bunyan ou Sibylle Baier, mas as harmonias das canções revelam-se, ainda e sempre, de sedução imediata. Ouvindo a primeira amostra "This Thread Is A Green Street", não restam dúvidas quanto a isso, canção com video de corta e cose, colagens e animações da própria Karen. Tudo uma riqueza!