sexta-feira, 30 de novembro de 2018
(RE)VISTO #72
AINDA TENHO UM SONHO OU DOIS
A HISTÓRIA DOS POP DELL'ARTE
de Nuno Duarte e Nuno Galopim, RTP/Antena3, 2018
RTP2, 28 de Novembro de 2018
Mesmo fazendo parte do festival Porto/Post/Doc por onde passou no passado sábado, foi via serviço público televisivo que acabamos por ver este documento.
Se há banda portuguesa que merecia uma distinção retrospectiva em forma de filme, essa era os Pop Dell'Arte, uns mais que injustiçados ao longo de trinta e cinco anos de actividade o que sempre nos causou estranheza e, por isso mesmo, muito respeito. Sem constrangimentos quanto a rótulos, tendências ou ondas, a banda de João Peste fez sempre o que muito bem quis das suas canções e discos, promovendo uma liberdade criativa invejável e até arrojada que o filme aborda ao de leve e que talvez fosse digna de uma exploração mais profunda e intencional. A matriz adoptada, que não foge à tradicional "chapa3" - entrevista+capa de disco+actuação ao vivo - é talvez um guião ao qual não se pode (deve?) fugir mas atendendo ao vanguardismo criativo que os Pop Dell'Arte sempre evidenciaram, o filme redunda numa redutora abordagem quanto à sua sonoridade e estética tão marcantes. Certamente, como sempre, os prazos foram curtos e os orçamentos irrisórios e, assim, o trilho cronológico da viagem foi o caminho mais fácil escolhido como guião principal, sendo, a esse nível, um exemplo irrepreensível de recolha documental que vai desde os anos oitenta lisboetas até aos mais recentes pára/arranca, uma postura natural dos seus músicos que é, afinal, o modus operandi de um projecto artístico não sujeito a pressões e contra-golpes. No fundo, esta pode não ser a homenagem definitiva nem o melhor dos documentários do género realizados entre nós, mas deveria dar direito a visualização forçada para todos os que hoje se queixam que em Portugal é muito difícil fazer música, ainda e sempre, de qualidade!
quinta-feira, 29 de novembro de 2018
(RE)VISTO #71
RYUICHI SAKAMOTO: async
At the Park Avenue Armory
de Stephen Nomura Schible, Boderland Media, 2018
Festival Porto/Post/Doc, Passos Manuel, 27 de Novembro de 2018
Passaram mais de vinte anos mas nunca mais esquecemos. Ryuichi Sakamoto em formato trio enchia o Coliseu do Porto no dia 13 de Julho de 1996, uma tournée mundial ainda hoje memorável que o levou a quinze países e quase quarenta espectáculos com direito a CD/DVD posterior, hoje uma raridade difícil de encontrar mas disponível virtualmente... Sobre essa passagem pelo Porto e nos diários que então escreveu, confessou elogios à sala, ao público e suspirou aqui voltar para lá registar um qualquer andamento ou peça certamente tocantes. Mesmo que ainda não tenha sido possível cumprir a promessa e no âmbito do jovem festival portuense, um documento recentemente registado durante uma perfomance nova-iorquina atraiu ali ao lado, ao Passos Manuel, uma boa plateia interessada em experimentar e absorver do seu talento e espírito. O disco "async" do ano passado é uma obra prima e uma elegia à musica sem tempo nem lugar mesmo que inicialmente pensado para uma banda sonora de um filme imaginário de Tarkovsky mas é também um manifesto de coragem quanto à luta contra a doença e o declínio artístico. O filme que estreou no Festival de Berlin confirma a abnegação mas também a beleza dos temas, das experiências e dos ambientes como que cobertos por um género de céu projectado no tecto da sala onde passam texturas a preto e branco que sinalizam muito do que (não) vemos quando fechamos os olhos para abrir a porta simplesmente à audição e à imaginação. Um filme belo que nos fragiliza maravilhosamente na sua pureza e eternidade e que, tal como aconteceu no final desta sessão certeira, não precisa de palmas ou ovações mas simplesmente de gratidão.
SPRINGSTEEN ON BROADWAY, AS EXTENSÕES!
Um ano depois do início da residência artística solitária no Walter Kerr Theatre da Broadway de Nova Iorque, uma catadupa de cinco concertos semanais em série com prolongamentos e acrescentos que durarão até Dezembro, Bruce Springsteen terá em breve a sua aventura documentada em disco e televisão. A Columbia Records tem já pronto o lançamento da banda sonora completa agendado para o próximo dia 14 desse mês que no formato de vinil chega aos quatro álbuns. Contam-se histórias e anedotas, revelam-se segredos e apresentam-se quinze canções à guitarra ou ao piano ao jeito de uma autobiografia evocada ao vivo baseada em "Born To Run", livro editado em 2016 que já lemos com todo o prazer e de que aqui trataremos não falta nada. Escusado será dizer que a luta pelas entradas de acesso a tão invulgar experiência atingiu recordes e deu azo a protestos e azedumes mas prometido está um remédio visual para compensar as queixas.
Assim, a agora global Netfix tem um registo documental do evento para emissão exclusiva no dia 16 de Dezembro, um dia depois do último dos espectáculos desta façanha com bilhetes aparentemente ainda disponíveis mas cujos preços nos parecem um erro de tipografia...
quarta-feira, 28 de novembro de 2018
A GIRL CALLED EDDY, ÚLTIMOS PORMENORES!
Não, não é ainda um novo trabalho de Erin Moran aka A Girl Called Eddy mas quase. O importante é, no entanto, haver boas notícias!
Quase uma década e meia depois do maravilhoso álbum homónimo de 2004 produzido por Richard Hawley, eis que há um epílogo feliz quanto ao misterioso e longo retiro com a saída de um disco inteiro de canções onde a menina surge ao lado do amigo Mehdi Zannad (Fugu) sob o nome de The Last Detail. Com selo da Elefant Records espanhola, trata-se da confirmação dos rumores quanto à efectiva actividade compositora da americana e que, numa primeira audição, causa alguma estranheza quanto à partilha alternada das vozes mas o sumo pop lá se vai entranhando sem dificuldade.
Mas há mais. Prometido até ao fim do ano está um novo single em nome de A Girl Called Eddy que anunciará um álbum de originais logo em Janeiro! Será sempre muito difícil bater a primeira obra-prima atendendo ao tempo de espera e às centenas de vezes que ouvimos as canções de 2004, mas nada como manter as expectativas bem altas. Ao que parece, vai haver até digressão ao vivo... (suspiro)!
SHARON VAN ETTEN, LEMBRETE!
De tanto reclamar por um álbum novo de Sharon Van Etten, a menina fez-nos o favor de o anunciar para Janeiro próximo o que impede a sua eleição, mesmo às escuras, para as listas de melhores de 2018... Vai ter que esperar para o ano mas, com toda a certeza, não o vamos esquecer atendendo a estes dois monumentais adiantamentos de "Remind Me Tomorrow", o regresso ao fim de cinco longos anos por entre estúdios de Los Angeles ao lado da inseparável Heather Woods Broderick e de um punhado de outros músicos de eleição de bandas como Xiu Xiu, Midlake ou Last Shadow Puppets. Adivinha-se digressão intensa que começa na Europa a 21 de Março mas sem datas sequer a rondar o nosso jardim. Temos que lhe enviar um lembrete...
terça-feira, 27 de novembro de 2018
ENTRETANTO EM VIGO...
Fomos involuntariamente recebendo informação sobre um novo festival de música previsto para dia 15 de Dezembro em Vigo, um evento em primeira edição. Pois bem, o Most! foi agora cancelado sem grandes explicações mas que residem, sente-se à distância, numa fraca venda de bilhetes, o que deverá ser motivo de análise e reflexão atendendo ao exponencial volume de festivais pelas nossas bandas. Mas, atendendo à data escolhida e ao teor do cartaz de indisfarçável frouxidão, ainda não é desta que da Galiza sopram bons ventos, uma corrente de ar que já não acontece como deve ser desde 2011!
segunda-feira, 26 de novembro de 2018
HOLLY MIRANDA, Hard Club, Porto, 25 de Novembro de 2018
Durante a caminhada apressada pelas ruas desertas e ventosas da Invicta uma série de dúvidas pairavam entre os nossos pensamentos até chegar à porta do Ferreira Borges - quanta gente corajosa saiu de casa para um concerto de Holly Miranda? Quanta dela já a ouviu como deve ser? Quantas versões vai a menina cantar?
Dado o tiro de partida para a estreia na cidade, as incertezas prévias rapidamente se dissiparam perante uma sala quase cheia e plena de boa onda de ambos os lados da partilha e uma artista sorridente e pronta a cativar toda a atenção. Dona de uma voz de estremecer as paredes e logo após os dois primeiros originais, zás, uma cover de "I'm Your Man" de Leonard Cohen para nos pôr a respirar um pouco mais depressa e a marcar terreno quanto a um imaginário campeonato de versões inusitadas onde Miranda deve ir todos os anos à liga intercontinental! Para que conste, foram oito as maravilhosas reviengas ao piano ou à guitarra para além da do mestre canadiano e sem eleger Elvis apesar da t-shirt vestida, a saber: John Lennon, Nina Simone, Jeff Buckley, Morphine, Odetta, Gloria Gaynor e Ted Lucas com que finou uma hora e meia de recital nocturno em quase vinte canções. Todas com uma notável e aparente facilidade daquela voz se entrelaçar aos acordes de forma tão natural e de que é impossível não ter inveja da façanha, do talento, da capacidade de suster uma plateia e onde até os originais, caramba, são ainda mais potentes assim, crus, sem os arranjos instrumentais que tantas vezes ouvimos nos discos e de que ali, obviamente, nos esquecemos. Uma experiência premiada em todas as categorias muito por culpa de uma surpreendente sagacidade de nos colocar de olhos esbugalhados e ouvidos amaciados com uma simples voz, uma guitarra ou um belo de um piano. Holly grail!
sábado, 24 de novembro de 2018
SCOTT MATTHEWS, COIMBRA TEM MAIS ENCANTO!
O ano novo começa, desde já, a ter encantamentos prometedores - o grande Scott Matthews, isso mesmo, o que interessa, com "um s no fim" do nome, regressa aparentemente a solo como merece ao nosso país para tocar no Teatro Académico Gil Vicente de Coimbra no dia 31 de Janeiro, quinta-feira. Há um grande álbum de nome "The Great Untold", mais um, para apresentar. Great!
sexta-feira, 23 de novembro de 2018
THE SAXOPHONES, Hard Club, Porto, 22 de Novembro de 2018
As canções dos The Saxophones são, aparentemente, só isso mesmo, canções. Contudo, ouvindo o álbum de estreia intitulado, lá está, "Songs of..." percebemos de imediato que a sua audição requer uma abordagem cuidadosa e faseada quanto aos efeitos imprevisíveis de uma dependência musical saudável e emotiva. Passam, então, a funcionar como afectos reveladores de uma sintonia artística de fragilidade assinalável, uma construção instrumental e lírica simples mas, como sempre, nada fácil de transmitir ao vivo. A escolha de um local perfeito para essa apresentação não é, assim, uma questão menor - basta equacionar as hipóteses de um pequeno auditório de lugares sentados ou de uma sala mais pequena e informal com direito a bebidas como a do clube portuense - mas a condicionante principal residirá sempre na atitude de público que lá vai estar.
É sempre bom o aparecimento de uma nova produtora de concertos na cidade com sangue na guelra que aposta em colmatar exageros centralistas e o entusiasmo desta primeira grande apresentação foi notório desde o início quer na boa disposição latente quer nas ovações estridentes no final de cada canção que banda tão magistralmente foi desfilando. Pena que alguns, suspeitamos de uns pela coincidência das t-shirts envergadas, lá tivessem caído de pára-quedas numa descontraída postura de quem sai uma sexta-feira à noite para uns copos nas galerias da baixa, tagarelando em contínuo ou fazendo transmissões ao vivo comentadas via telemóvel em momentos de delicada fruição, atitudes que, atendendo à geração mais que adulta em causa, têm tanto de descabido como de incompreensível.
Mesmo assim e perante tamanho entusiasmo, o trio em cima do palco respondeu com enorme bondade e reconhecida simpatia surpreendido pela dimensão da plateia e tão calorosa recepção, uma relação de amizade que tem tudo para se transformar num romance de longa duração cujo capítulo inicial teve, na noite chuvosa de ontem, uma primeira troca de olhares comprometedores e apaixonados. Esperam-se, pois, "desenvolvimentos"...
É sempre bom o aparecimento de uma nova produtora de concertos na cidade com sangue na guelra que aposta em colmatar exageros centralistas e o entusiasmo desta primeira grande apresentação foi notório desde o início quer na boa disposição latente quer nas ovações estridentes no final de cada canção que banda tão magistralmente foi desfilando. Pena que alguns, suspeitamos de uns pela coincidência das t-shirts envergadas, lá tivessem caído de pára-quedas numa descontraída postura de quem sai uma sexta-feira à noite para uns copos nas galerias da baixa, tagarelando em contínuo ou fazendo transmissões ao vivo comentadas via telemóvel em momentos de delicada fruição, atitudes que, atendendo à geração mais que adulta em causa, têm tanto de descabido como de incompreensível.
Mesmo assim e perante tamanho entusiasmo, o trio em cima do palco respondeu com enorme bondade e reconhecida simpatia surpreendido pela dimensão da plateia e tão calorosa recepção, uma relação de amizade que tem tudo para se transformar num romance de longa duração cujo capítulo inicial teve, na noite chuvosa de ontem, uma primeira troca de olhares comprometedores e apaixonados. Esperam-se, pois, "desenvolvimentos"...
quinta-feira, 22 de novembro de 2018
PREFAB SPROUT, ONDA MEGAHERTEZIANA!
Temos em Paddy MacAloon um dos nossos predilectos compositores pop, uma notabilidade que se propagou em plenos anos oitenta com os saudosos Prefab Sprout mas que acabou por se auto-diluir numa atitude de recolhimento e privacidade que só esporadicamente foi ultrapassada. Sinal dessa solidão assumida foi o disco "I Trawl the Megahertz" editado em 2003, aventura instrumental de composição cinemática e sonhadora que evidenciava um classicismo pop de homenagem a Debussy e Ravel, dois dos seus compositores de eleição e que passou despercebida mesmo entre os ouvidos atentos dos aficionados. Mas os pouco mais de cinquenta minutos do álbum resultam também de um refúgio lateral a um incómodo problema de saúde - a perca de visão devido a uma lesão na retina - que levou MacAloon a ter uma outra percepção do mundo e do dia-dia, abandonando quase completamente a leitura para se distrair com madrugadores programas de conversa nas ondas da rádio enquanto insistia na terapia auditiva dada pela música e pela composição.
Chegou agora a hora da redescoberta. A Rough Trade prepara uma reedição do álbum para Janeiro com direito a nova capa e onde se assume a autoria em nome dos Prefab Sprout, suspiro saudoso quanto à intenção de, na altura, todos estes sons fazerem ainda sentido ao lado dos companheiros da banda. A edição em vinil terá uma versão branca limitada a mil cópias, uma nívea pérola à altura de tamanha beleza épica...
quarta-feira, 21 de novembro de 2018
McCARTNEY, OLHA O SINGLE!
Uma das grandes canções do ano é, sem surpresas, "I Don't Know", mais uma das muitas a que Paul McCartney nos habituou ao longo de décadas e que, ao lado de "Come In To Me", foi um dos primeiros sinais vintage do novo álbum "Egypt Station" saídos digitalmente em Junho passado. Como era urgente e desde ontem, há agora um bonito single de vinil com os dois temas que serve para assinalar a próxima e irritante Black Friday e o melhor é que da peça há por aí espalhados 5000 exemplares o que, aparentemente, espanta qualquer demanda apressada e inatingível.
terça-feira, 20 de novembro de 2018
THE SAXOPHONES, NOVA SUITE!
O duo Alexi Erenkov e Alison Alderdice, marido e mulher que se escondem atrás do nome The Saxophones tem concerto marcado para a próxima quinta-feira pelo Porto. Como que comemorando a aparição, anuncia-se agora um novo EP em formato de sete polegadas de vinil a sair em Fevereiro próximo e limitado a 400 exemplares que tem por base o tema "Singing Desperately" já incluído no álbum entretanto publicado. Sweet! Encomendas aqui.
F.R.I.C.S. - Fanfarra Recreativa Improvisada Colher de Sopa, Galeria Municipal do Porto, 18 de Novembro de 2018
No âmbito da exposição "Musonautas, Visões & Avarias" que terminou no Domingo na Galeria Municipal do Porto (gostamos muito da mostra e ficamos à espera do livro/catálogo prometido que faça justiça a todo o brilhante trabalho de pesquisa e descoberta), apresentou-se devidamente ensaiada e concentrada no mesmo espaço a F.R.I.C.S. - Fanfarra Recreativa Improvisada Colher de Sopa, colectivo sonoro das "mais obscuras celebridades do underground portuense" e que não escolhe segmentos ou géneros. Podem ser aficionados e praticantes de metal, jazz, rock, electrónica ou música sinfónica que o importante é que o espírito ruidoso e vigoroso do conjunto permita a festa anárquica e a descontracção o que, escusado será dizer, foi plenamente conseguido. Aqui fica, para a eternidade, a fricalhada...
segunda-feira, 19 de novembro de 2018
NÚRIA GRAHAM + NILS FRAHM, Festival Para Gente Sentada, Theatro Circo, Braga, 17 de Novembro de 2018
foto. facebook do festival |
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Ele há dias de manhã que, afinal, se pode sair à noite... Que o diga a catalã Núria Graham que, viajando directamente de Montreal, saiu do aeroporto no final da viagem de mãos vazias e sem as malas com o guarda-roupa e a guitarra essenciais para atacar o palco bracarense convenientemente. Nada que o afamado desenrascanço lusitano não consiga ultrapassar e, mesmo com guitarra emprestada e fatiota informal, a aparição de fundo aveludado serviu para desfiar um punhado de temas a solo de alto teor aditivo, uma receita que alguns tinham já saboreado num fim de tarde soalheiro do parque da cidade. A poção, pareceu-nos, funcionou ainda melhor desta vez, uma aprovação notada por entre uma plateia que imediatamente lhe prestou desvelo carinhoso quanto às canções e ao que as envolve. Trata-se de uma patine pop de recortado talento a lembrar, como fez notar um amigo destas e de outras lides, a misteriosa Erin Morian aka A Girl Called Eddy, bastando para isso nomear dois fabulosos exemplos - "Birds Hits Its Head Against the Wall" que abriu o recital e "The Stable", um inédito sensacional vertido em emo-canção com que encerrou a presença segura, simpática e bonita e a merecer todas as palmas com que foi merecidamente brindada. Molt bé!
foto. facebook do festival |
Depois do agradável banho primaveril de Junho passado, um mergulho notável e corajoso de Nils Frahm atendendo às condicionantes e contingências, chegava o momento certo para fazer emergir de forma exemplar um explorador sonoro de excelência. Para trás, lá muito para trás, fica simplesmente o pianista que Braga teve a felicidade de descobrir ao lado de Heather Woods Broderick numa noite longínqua de talentosa partilha, embora o piano continue a ser o ponto de partida obrigatório de um labirinto de sons que quase sempre arriscam a não classificação mas que podemos rotular, helás, de pós-classicismo ambiental. Sinal espelhado dessa diversidade de aventuras e caminhos é o disco deste ano "All Melody", enorme e intrincado repositório de provas analógicas que assusta os mais incautos mas alcança cada vez mais adeptos atraídos pelos meandros dos sons, dos arpejos ou das batidas em tempos instantâneos onde um simples telemóvel se pode transformar num potencial instrumento de composição. Frahm, pelo contrário, continua interessado no velhinho bater das teclas, nos barulhos das madeiras, no manobrar manual dos botões do volume, dos efeitos, das repetições nem que para isso tenha que correr de teclado em teclado, de aparelho em aparelho até que um climax suado e ofegante o faço regressar simplesmente a um piano para momentos de eterna beleza. Os sorrisos de satisfação com que se dirigiu à plateia rendida ao cabo de duas horas e dez minutos de récita, limpando a cara do suor como que saído de uma nave espacial no final de uma descida rompante pela atmosfera, são a prova que Frahm é, afinal, um ser humano mas que viaja irrequieto e para nossa sorte, de planeta em planeta imaginários. Um galáctico é o que é...
domingo, 18 de novembro de 2018
ALICE PHOEBE LOU + MARLON WILLIAMS, Festival Para Gente Sentada, Theatro Circo, Braga, 16 de Novembro de 2018
foto. facebook do Theatro Circo |
foto. facebook do Theatro Circo |
A primeira noite do festival bracarense talvez se possa resumir ao jeito da velha máxima "vi o filme mas gostei mais do livro" ou vice-versa. Vamos lá às supostas explicações... por partes.
Na primeira, a estreia da jovem Alice Phoebe Lou acabou por constituir uma boa surpresa e, no nosso caso, uma redescoberta de uma artista a que demos alguma atenção na escuta de "Orbit", álbum que acabamos por esquecer perdido entre muitos outros num mar imenso de gigabytes. Bem disposta, a menina e o trio de acompanhamento conseguiram verdadeiramente aquecer a plateia entre algumas recordações e muitas canções novas de um disco a sair em Janeiro no que sugere ser um leque de composição bem aberto a influências como as de Jeff Buckley ou Angel Olsen e até de uns surpreendentes Timber Timbre de que arriscaram, e muito, uma versão da fantástica pérola "Hot Dreams" de 2014. Tamanho "bebedouro" teve tanto de açucarado como de fresco, um conjunto segurado numa experiência de alguns anos de estrada e muitas canções tocadas em ruas e praças que tinha um auge anunciado em "She", fenómeno de popularidade (mais de quatro milhões de olhadelas!) deixado para o final. Ou seja, o concerto é, até ver, melhor que o disco!
foto. facebook do Theatro Circo |
foto. facebook do Theatro Circo |
Quanto a Marlon Williams, o seu regresso ao Minho depois de Paredes de Coura suscitava, desde há muito, uma nuvem de suspiros. Corrida a cortina, foi sentado junto do teclado que a voz poderosa do neozelandêz emergiu da penumbra em "Love Is A Terrible Thing" (?), o que não só não acalmou os ânimos como acelerou as expectativa para o que, previsivelmente, se adivinhava ser um crescendo espectacular. Não foi, contudo, isso que notamos. Já acompanhado da respectiva banda, sentimos que o concerto se perdeu numa primeira meia hora entre canções sem muita garra e, nalguns casos, mal calibrado como foi o caso perturbante de "Carried Way", uma cover de Barry Gibb de arrepiar os nervos... auditivos! Mesmo o inevitável "What Chasing You", canção superior que merecia um tratamento mais cuidado, tinha sido como que atropelada numa rodagem de palco que só começou a acertar na rota certa com o vibrante "Vampire Again", esse sim um momento pleno de intensidade e panache que Williams não mais perdeu mesmo que a agora amiga Aldous Harding não tenha comparecido para o acompanhar no monumental "Nobody Gets What They Want". Abram alas para o amor que, finalmente, o serão haveria de alcançar uma entusiasta onda de partilha e prazer que atingiu o apogeu já no encore com a sensacional versão de "Portrait of A Man" de Screamin' Jay Hawkins. I'm the man, ora bem, mas mesmo assim gostamos muito mais do disco.
sexta-feira, 16 de novembro de 2018
UM DISCO PEQUENO, TRÊS GRANDES CANÇÕES!
No dia de hoje pode não acontecer mais nada (é errado) que, seja como for, já está ganho! Há um disquinho surpresa a sair que junta Jason Lytle (Grandaddy) aos amigos Kyle Field (Little Wings) e Kramies Windt (Kramies) para três grandes canções acústicas onde a premissa impunha, sem truques de estúdio, a utilização de um único instrumento, a voz e um microfone. Chama-se "3ingle", está já disponível para aquisição digital e talvez um dia as pérolas, que se podem escutar abaixo, acabem a repousar num sete polegadas de vinil como merecem. O desenho bonito é do "artista" Kyle Field.
quinta-feira, 15 de novembro de 2018
MERCURY REV, VISITA A BOBBIE GENTRY!
O nome de Bobbie Gentry pode não ser muito conhecido na Europa mas a cantora goza de fama antiga pelos Estados Unidos muito à custa de ter sido das primeiras mulheres a compor e produzir as suas próprias canções de raízes especadas à volta do Mississipi e do sul do país. Em plenos anos sessenta alcançou vários hit singles tendo "Ode to Billie Joe" chegado a número um em 1967 ao longo de várias semanas, o que a trouxe a Inglaterra onde florescia uma base de fãs assinalável. O seu segundo álbum "The Delta Sweete" lançado no ano seguinte abordava de forma conceptual a sua infância em Chickasaw County em pleno Mississipi, onde se denotam as capacidades inatas de misturar o folk, os blues, o country e até a velhinha soul de forma seminal acompanhada da sua inseparável pequena guitarra. O disco, votado ao esquecimento como acontece a muitos tesouros, teria várias sequências mas o sucesso inicial não se viria a repetir o que a levou cedo a desistir da carreira e das actuações ao vivo no início dos anos setenta.
Como sempre nestes casos, o tempo para destapar e escavar o tesouro parece estar a chegar. Inspirados neste álbum (não esquecer, por exemplo, "The Delta Sun Bottleneck Stomp"), os Mercury Rev criaram e 1998 uma outra ode à América profunda de nome "Deserter's Songs", uma expedição sonora que teve comemoração a preceito ao longo do corrente ano mas que continuará a ser evocado já em Fevereiro próximo. Através da Bella Union, a banda anunciou o lançamento de "Bobbie Gentry's The Delta Sweete Revisited", isso mesmo, uma reinterpretação das canções do disco-mãe que conta com a ajuda na produção de Jesse Chandler dos Midlake e no qual surge uma série imbatível de colaborações e ajudas, a saber: Vashti Bunyan, Rachel Goswell (Slowdive), Hope Sandoval (Mazzy Star), Lucinda Williams, Beth Orton, Norah Jones, Marissa Nadler, Susanne Sundfor, Phoebe Bridgers, Kaela Sinclair (M83), Clarice Van Houten ou a grande Laetitia Sadier. Aqui fica a primeira "visita" a cargo de Margo Price.
Como sempre nestes casos, o tempo para destapar e escavar o tesouro parece estar a chegar. Inspirados neste álbum (não esquecer, por exemplo, "The Delta Sun Bottleneck Stomp"), os Mercury Rev criaram e 1998 uma outra ode à América profunda de nome "Deserter's Songs", uma expedição sonora que teve comemoração a preceito ao longo do corrente ano mas que continuará a ser evocado já em Fevereiro próximo. Através da Bella Union, a banda anunciou o lançamento de "Bobbie Gentry's The Delta Sweete Revisited", isso mesmo, uma reinterpretação das canções do disco-mãe que conta com a ajuda na produção de Jesse Chandler dos Midlake e no qual surge uma série imbatível de colaborações e ajudas, a saber: Vashti Bunyan, Rachel Goswell (Slowdive), Hope Sandoval (Mazzy Star), Lucinda Williams, Beth Orton, Norah Jones, Marissa Nadler, Susanne Sundfor, Phoebe Bridgers, Kaela Sinclair (M83), Clarice Van Houten ou a grande Laetitia Sadier. Aqui fica a primeira "visita" a cargo de Margo Price.
quarta-feira, 14 de novembro de 2018
BAIRD & LATTIMORE, MÁGICO!
Três dias depois da passagem pelo Porto, Meg Baird e Mary Lattimore acompanharam Kurt Vile até Bruxelas e deram um saltinho à cidade de Gent para registar um pequeno momento de magia no lindíssimo Hotel d'Hane Steenhouse. A canção "Painter of Tygers" faz parte do álbum em parceria "Ghost Forests" lançado sexta feira passada e é simplesmente imperdível!
terça-feira, 13 de novembro de 2018
DUETOS IMPROVÁVEIS #210
THE WEATHER STATION & JENNIFER CASTLE
I Tried to Wear the World (Station)
Estúdios Sugar Shack, London, Ontario, Canadá, Agosto de 2018
Split single, Paradise of Bachelors Records, Outubro de 2018
I Tried to Wear the World (Station)
Estúdios Sugar Shack, London, Ontario, Canadá, Agosto de 2018
Split single, Paradise of Bachelors Records, Outubro de 2018
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
SUFJAN STEVENS, JÁ CHEIRA A NATAL!
Não, ainda não ouvimos o "Last Christmas" na rádio ou num elevador mas deve estar a faltar pouco... O solzinho de hoje acelera o olfacto para o Natal que se aproxima e começam a chegar as canções de época que se inventam e reinventam a cada ano como é o caso de "Lonely Man Of Winter" de Sufjan Stevens datada de 2007 mas só agora disponível para audição pública. A história antiga de amizade e entreajuda, valores que associamos sempre ao período natalício, conhece agora um epílogo palpável na forma de um sete polegadas de vinil que vamos querer muito na nossa colecção!
sexta-feira, 9 de novembro de 2018
ROCKY RACOON #14
Como anunciado, o dia de hoje marca o lançamento da versão especial "The White Álbum" dos The Beatles que assinala os cinquenta anos de um monumento sonoro inigualável. Atentos ao burburinho estão todos os que, jogando por antecipação, despertam nos muitos aficionados da banda impulsos recoletores de memórias coleccionáveis de qualidade superior. É o caso da Snap Galleries de Londres que, repetindo a gracinha quanto a fotografias dos Fab Four, tem à venda uma série limitada de cinco originais do fotógrafo Ian Macmillan, o tal da passadeira londrina que resultou na capa de "Abbey Road", o álbum seguinte e que, lá está, em 2019 fará também cinquenta anos. São cinco imagens icónicas devidamente assinadas que contam uma história rebatida a que se acrescentam constantemente pormenores deliciosos mas curioso é o facto destas mesmas reproduções terem já sido notícia há quatro anos atrás por estarem em leilão conjunto com as expectativas de venda a chegarem às 70 000 libras! O acaso raro que agora se repete (!) tem o módico preço fixo de 25 000 libras esterlinas o que se afigura depreciativo quanto ao efectivo fervor da chamada beetlemania. Estranho. Mesmo assim e se nos dessem a escolher uma delas, a eleita seria a do "frame 2" (acima) onde McCartney tem ainda (já?) as sandálias calçadas e os quatro atravessam a estrada no sentido contrário ao da fotografia original o que faria um vistoso pendant afixado numa parede ao lado da nossa velhinha capa do disco português gasto até à exaustão!
quarta-feira, 7 de novembro de 2018
THESE NEW PURITANS, STOP THE PRESS!
Uma das grandes bandas da última década e uma das nossas referências fetiche são os ingleses These New Puritans. Talvez denotando algum exagero, os irmãos ingleses Jack e George Garnett arriscam muito pouco, medindo todos os passos da sua carreira o que nos leva por vezes ao desespero mas nunca ao esquecimento. Desde 2013, entre arranques e recuos de indisfarçável obscuridade, não havia sinais oficiais de temas novos mas, párem as máquinas, caído do céu, aqui está "Into the Fire", nova canção pronúncio de um disco maior que terá edição em 7" de vinil lá para Janeiro e onde se nota a colaboração de David Tibet dos Current 93. Brutal e lindo como convêm!
ANDREW BIRD PACIFICADOR!
Apesar de alguns sinais positivos, os resultados das eleições americanas de ontem continuam a evidenciar um manifesto apoio a Trump espalhado por diferentes irmandades e grupos sociais que, manifestamente, se afigura muito difícil evitar uma reeleição. A comunidade artística aplicou-se sem medo no sentido de uma reinversão só parcialmente conseguida, encarando de frente o "problema" como foi o caso, entre outros já por aqui destacados, de Andrew Bird. Sem notícia de qualquer disco novo, o músico lançou sexta-feira passado o inédito tema "Bloodless" com direito a edição de sete polegadas e onde expressa a sua franca opinião sobre os perigos escorregadios da actual situação americana, filmando, sob direcção do amigo Matthew Daniel Siskin, nas ruas de Los Angeles um subtil video alusivo às disparidades e, já agora, injustiças de uma sociedade em invisível "guerra civil". Para meditar enquanto o ambiente, apesar de tudo, continua pacífico...
terça-feira, 6 de novembro de 2018
segunda-feira, 5 de novembro de 2018
BENJAMIN CLEMENTINE, QUE LUXO!
Tal como aquando da colaboração com a Burberry, continua a dar que pensar nestes novos tempos de ironia e abismo que Benjamin Clementine, um artista resgatado in extremis das ruas de Paris, faça agora parcerias artísticas com estúdios famosos como Abbey Road e, sobretudo, com marcas de relógios de luxo como a Vacheron Constantin em que cada peça se situa, pela base, acima de quinze mil euros... Seja como for, grande canção!
ED HARCOURT, PIANO PIANO!
De Ed Harcourt espera-se sempre alguma inquietação. Talvez desiludido com os resultados obtidos com o último álbum "Furnaces", rotulado como o mais arrojado e ambicioso da carreira, o músico decidiu em Fevereiro passado sentar-se junto de um renovado piano - um Hopkinson Baby Grand de 1910 - do estúdio "Wolf Cabin" em Oxfordshire, refúgio montado pela esposa Gita Langley e respirar fundo. Inspirado em clássicos que fizeram a sua formação musical como Mozart, Grieg ou Satie mas também autores modernos como Glass ou Arvo Part, apostou simplesmente em instrumentais calmantes do corrupio diário, da enxurrada de más notícias ou do caos das redes sociais, remetendo para pousio as líricas e a sua voz tão saliente. O resultado é um novo álbum novo a sair já este mês com o magnífico título de "Beyond the End" e ao planar das teclas juntam-se, por vezes, uns pozinhos de violino e de violoncelo a cargo da esposa e da sua irmã Amy Langley que ajudam a testar um regresso as origens que, pelas amostras, tem tanto de saboroso como de surpreendente. Piano piano...
domingo, 4 de novembro de 2018
KOZELEK, O MAR DE ESPINHO E UM PAR DE MEIAS...
O prometido segundo disco de originais de 2018 de Mark Kozelek, agora sob o nome de Sun Kill Moon, está prestes a sair na habitual Caldo Verde Records. Chama-se "This Is My Dinner" e é mais um descomunal exemplo de "borrifanço" para a crítica, o mainstream ou o raio da carreira, uma sobranceria saudável só possível para quem grava, edita e lança o que muito bem entende na própria editora para irritação de muitos e prazer de alguns (nós). Nos últimos anos, tornou-se um hábito Kozelek aproveitar as canções para contar histórias em jeito de extensos monólogos, confissões ou desabafos inspirados no dia-a-dia de digressões, concertos, viagens e estadias e que deu já direito à nossa "I Love Portugal", um desses confessados e sinceros elogios que muito nos honra. O novo registo não foge à regra e tirando versões de "Rock N' 'Roll Singer" dos AC/DC e "Come On Get Happy" dos Partridge Family, as outras oito canções foram escritas durante a digressão europeia de final do ano passado numa só noite e, na maioria das vezes, apresentadas ao vivo no dia seguinte em homenagem a cidades como Copenhaga, Estocolmo, Frankfurt ou Varsóvia ("Linda Blair") e, claro, sem deixar escapar um louvor a Espinho! A passagem esgotada pelo Auditório da Costa Verde faz parte do enredo do tema "Soap For Joyful Hands" que começa num concerto cancelado em Madrid e um par de meias de estimação lavadas num quarto de hotel (!), chega a Espinho e ao seu inspirador mar e hotel e passa pelo concerto e pelo encontro com uma curiosa fã no final do espectáculo realizado a 24 de Novembro de 2017. Certo é que, dois dias depois no Shepherd's Bush Empire de Londres, o nova tema foi devidamente apresentado como se comprova no video abaixo e, tal como noutras oportunidades, essa foi a única e exclusiva vez que isso aconteceu ao vivo. O que nos vale ela tem o número nove e podemos ouvi-la sempre que quisermos. It's possible!
sexta-feira, 2 de novembro de 2018
PUBLIC SERVICE BROADCASTING, CINCO ESTRELAS!
A passagem conturbada dos Public Service Broadcasting pelo húmido Parque da Cidade em Junho passado merecia, como suspirado na altura, uma continuação adequada em sala fechada e confortável. A oportunidade está marcada para o dia 3 de Dezembro, segunda-feira, no Hard Club e a banda lançou há dias um pequeno registo de quatro originais que deverá ser devidamente escutado com magnífico álbum "Every Valley" de 2017. Esperemos que na oportunidade já haja em vinil "White Star Liner", o tal novo lançamento que tem no tema-título mais um exemplar cinco estrelas...
RUFUS WAINWRIGHT, A ESPADA DA INSEGURANÇA!
quinta-feira, 1 de novembro de 2018
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