quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

DAVID LYNCH (1946-2025)















Quando "Twin Peaks" estreou em Portugal em 1990 o nome de David Lynch era para nós um exotismo distante elogiado na imprensa, mas de que nunca tínhamos testado qualquer filme. Lembramos bem esses serões televisivos do "Diário Secreto de Laura Palmer", um notável enredo de surpreendente e assombroso efeito que um genérico instrumental adensava no mistério... eternamente. 

Vistos e revistos os filmes mais antigos, não falhamos todos os outros que se seguiram, descobrindo que o homem também era músico, tinha gosto requintado pelas canções e era até litógrafo artístico! Ficou por ver o return de "Twin Peaks" de 2017, mas algo nos afastou desse remake quase abusivo, às tantas, injustamente. David Lynch faleceu hoje. Surreal. Peace!

quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

WILL SAMSON, SENSO-EXPERIÊNCIAS!

                                                                  fotografia: Vera Marmelo













A música de Will Samson é, por vezes, descrita como “demasiado experimental” ou como “demasiado indie", um terreno movediço que se agudizou depois da pandemia quando o músico foi surpreendido com a suspensão do seu contrato discográfico. 

A desilusão não impediu que as experiências tivessem cessado ou adormecido, sendo o sinal desse desassossego o novo álbum "Songs of Beginning & Belonging", uma renovação meditativa que reflecte uma vontade de soterrar o passado, avançar para uma nova fase criativa e, finalmente, conseguir alguma paz interior. O disco foi registado entre Novembro de 2022 e Maio de 2024 no seu antigo estúdio da margem do rio Tejo, em Almada, espaço partilhado com Casper Clausen dos Efterklang, usando novamente o "Uher 4200", gravador de 1970 também primordial no anterior trabalho "Harp Wells". 

Uma primeira faixa de nome "Loshult", resultado de uma estadia na mesma localidade sueca, é a prova do impulso artístico que Samson pretende despertar e que terá apresentação ao vivo no final de Fevereiro e início de Março em Lisboa (27, Zé dos Bois), Braga (28, local ainda não divulgado) e Coimbra (1, Salão Brazil), momentos onde terá o acompanhamento da violinista Beatrijs De Klerck.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

SONDRE LERCHE, DE PERDER DE VISTA!





















Numa noite de final de Outubro, sozinho num quarto de hotel em Shibuiya, Japão, Sondre Lerche imaginou uma série de temas instrumentais que não demoraram a ganhar forma. Logo em Novembro e já em território norueguês, sessões entre Oslo e Bergen moldaram as peças no sentido certo, se bem que e logo depois, umas pequenas férias em Veneza puseram o conjunto a marinar até ao ponto certo mesmo antes do Natal. 

Testado, o projecto denominado "Sea of Sights" cola-se em cinco pedaços inspirados nos mestres Sakamoto e Yoshimira e em todos os veteranos da música experimental europeia, um majestoso minimalismo, ainda assim, pleno de arranjos e sonoridades sofisticadas. Há retomas de originais antigos como "Sentimentalist" do álbum "Please" de 2014, agora travado na boa progressão com o auxílio de Gabriela Garrubo, amiga com quem tinha já feito um dueto de "Amor Ainda Espera", variação do original "My Love Still Waits". 

O resultado final, traduzido numa inesperada sequência de trinta e cinco minutos, é mesmo uma viagem de atmosfera relaxada e de leve inquietude que merece atenção e desfrute obrigatório, um prazer de perder de vista!  



sábado, 11 de janeiro de 2025

UAUU #735

BRIGID MAE POWER, VERSÕES CARINHO!





















Não é de hoje o gosto de Brigid Mae Power pelas versões. Já em 2021 um luminoso EP aclarava as capacidades de recriação desta irlandesa a quem, aqui pela casa, se abrem sempre as janelas de par em par. A tendência não foi esquecida em 2023 aquando da edição do álbum "Dream from the Deep Well", flutuando por lá uma brilhante variação de "I Must Have Been Blind" de Tim Buckley. Acrescenta-se agora "Songs for You", um disco com nove covers inéditas, na sua maioria, a solo ou com a simples ajuda de bateria e baixo. 

A nova insistência advêm de um denominador comum: os temas eram da preferência do pai da artista ou canções escutadas quando dele cuidava durante o fatídico ano de 2024, funcionando o conjunto como um tributo discreto, mas sentido, em sua carinhosa memória. Entre alguma melancolia e subtileza da sequência, surpreendem originais de Cass McCombs ("Angel Blood"), o mais recente, ou dos Television ("See No Evil"), sendo a restante selecção de um ecletismo inesperado que se alonga, mesmo assim, a nomes mais renomados como Roy Orbinson ("In Dreams"), Neil Young ou Ray Charles ("You Don't Know Me"). 



sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

DESTROYER ENTRAM NA DANÇA!





















Curado da labirintite anterior, Dan Bejar e os seus inconfundíveis Destroyer prepararam outra inflamação sonora com base num passado desconhecido - imaginou-se, a partir dele, um género de cantor lounge, também bandido, cheio de fantasias e contradições cujas histórias se enroscam a nove canções de salão de casino ou bar de fim de noite. Ao conjunto chamou-se "Dan's Boogie" e prometidos estão desaterros surpreendentes. 

O primeiro recebeu o rótulo de "Bologna", onde Bejar confessa dificuldade em cantar, sabe-se lá porquê, o primeiro e o terceiro verso. Para acentuar a gravidade e coragem foi, então, convidada Simone Schmidt aka Fiver, colaboradora antiga da banda e que assegura ao tema o necessário voo rasteiro. As imagens ficaram a cargo de David Galloway, compincha que desde 2019, e com "Crimson Tide", é o autor de uma série diversa de narrativas visuais para temas dos Destroyer. 

Afigura-se, sem dúvida, desafiante imaginar tamanho boogie em cima de um palco como o que os espera a 12 de Junho no primeiro dia do Primavera Sound Porto. A menina dança?

3X20 JANEIRO

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

FAROL #157















No passado fim de semana, David Longstreth aka Dirty Projectors teve o privilégio de participar num concerto em Los Angeles que serviu para celebrar a vida e a música de David Berman no dia daquilo que seria o seu 58º aniversário (4 de Janeiro). O talentoso poeta e compositor, falecido em 2019, comandou projectos sedutores e estelares como os Silver Jews ou os Purple Mountains. 

Nesse sábado, Longstreth apresentou três versões de outros tantos originais de Berman - "Black and Brown Blues", "Pet Politics" e "Random Rules - e não descansou enquanto não os eternizou à sua maneira. Na manhã seguinte, montados os microfones lá de casa, registou-os para nossa sorte e bênção que agora se encontra disponível à distância de um estalido com o nome de "Covers For A Belated Birthday". Click..

ELVIS 90!















Parabéns para o Rei!

BONNIE PRINCE BILLY, ANDORINHA EM JANEIRO!





















Um novo disco de Will Oldhman aka Bonnie "Prince" Billy pode já não ser notícia de destaque por esse mundo fora. No nosso, o facto é sempre motivo de expectativa e regozijo, na certeza que do músico norte-americano não se conhecem falhanços ou salamaleques escusados. 

No final do mês chega, então, "The Purple Bird", pra aí o vigésimo quinto álbum em nome próprio e que, atendendo aos já três pressupostos sonoros, só pode vir a acrescentar ainda mais patina a uma já longa tradição folk-country. A composição não engana, não pode enganar, qualquer que seja ouvido, novo ou velho, a que se juntaram, desta vez, amigos como John Anderson, lenda de Nashville que canta a mielas em "Downstrem", descrita como uma eco-balada, por sinal, lindíssima! 

Nashville foi, pois, o local de gravação ao lado do produtor Dave Ferguson, um raridade funcional só agora uma segunda vez repetida num encorpado songbook com mais de trinta anos. Para que o efeito se eternize, juntaram-se dos melhores músicos da cidade e ainda Tim O'Brian, nome histórico do bluegrass americano, uma entreajuda que motivou a partilha dos créditos da composição pelos vários intervenientes, estando Ferguson, "Ferg" para os amigos, creditado como co-autor em sete das doze canções. Em Maio, há digressão pela Europa e... 



segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

LAURA MARLING, A HORA DO (EN)CANTO!





















Enquanto as canções do brilhante "Patterns In Repeat" de Laura Marling se vão agigantando a cada audição, há afinal mais um conjunto de outros embalos ensaiados e registados em ambiente caseiro ao lado da filha. São onze temas da autoria de Raffi Cavoukian, Raffi para milhares de crianças que o consagraram como autor preferido de música infantil, mas da edição, exclusiva em vinil de 10" via Rough Trade, não estão disponíveis escutas digitais a não ser um leve esvoaçar no tiktok

A inspiração é assumida no semelhante "Tumble Tee", disco de outra Laura, Laura Veirs, gravado em 2011 com uma série de tradicionais americanos da folk e em honra ao nascimento do primeiro filho da norte-americana. Uma sande de manteiga de amendoim, sapos salpicados de verde, patinhos ou uma baleia branca bebé, são os motivos de algumas das histórias que se contam, cantam e tornam a (en)cantar todas as idades...  

ADRIAN CROWLEY, ALEGRIA MEDIDA!

                                                        Fotografia:  Mathieu Zazzo
















Ao irlandês Adrian Crowley está destinado um dos primeiros álbuns do novo ano, por sinal, o décimo de originais e o primeiro desde 2021, se exceptuarmos a colaboração de excelência com Marry Waterson datada de Março último. O regresso acontece com a ajuda primordial de John Parish na produção e no desempenho de alguns instrumentos como em "Tangled", canção que recebe ainda, para além do clarinete do próprio, a voz de Nadine Khouri e o contrabaixo do engenheiro de som Jim Barr. Para audição prévia, soma-se o vibrante tema título "Measure of a Joy". 

O disco marca a estreia de uma nova editora parisiense, a Valley Of Eyes Records, e terá saída a 7 de Fevereiro, a que se segue, em Março, digressão pela Europa que se espera alcance palcos e cidades ibéricas. Para além dos nomes citados, Crowley reuniu uma série notável de participantes colaborantes como o trio de cordas Cora Venus Lunny, Maria Ryan e Mary Barnecutt e a escritora argentina Mariana Enriquez, autora de uma biografia a incluir no booklet.


terça-feira, 24 de dezembro de 2024

BOM NATAL!

Para todos e para Mr. Sakamoto 💛

SINGLES #57





















FRANCK LESTER - Chritmas Rock (il est né le devin enfant)
 
França: Barclay, 602016, 1974 
Da série, iniciada o ano passado, referente a "canções de Natal a quem ninguém liga nenhuma", ora aqui está mais um misterioso acaso. Sobre um desconhecido Franck Lester não há vestígios nem sinais detectáveis, embora esteja mais que confirmada a sua artística ascendência francesa - o tema de Natal que dá motivo à recreação é "Il Est Né le Devin Enfant", hino secular com origem no século XIX algures na Lorena e já com centenas de versões de gente tão diferente como Tino Rossi, Mireille Mathieu, Annie Lennox e até os Siouxie And The Banshees

O disquito com cinquenta anos faz, de início, uso dessa canção popular para depois se esticar numa correria rock FM que culmina em "We Wish You A Merry Christmas", outro clássico da época. A letra é do melhor, com pérolas do género "they gave him a name / and they call him Jesus / but if he born in the USA / with rock & roll / he will leave the way". Nada católica, a coisa soa, assim, tão má que é tão boa. A versão instrumental então... 

[aos prezados ouvintes, apresentam-se desculpas pela deficiente qualidade da captação video]  

segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

SONDRE LERCHE, CUMPRE-SE A TRADISOM!




















Em vésperas de Natal e mantendo a "tradisom", o norueguês Sondre Lerche registou uma versão de um suposto hit de 2024. O hábito, que já deu origem a disco compilatório, recaiu em "Good Luck, Babe!" de uma tal Charlotte Roan. A cover, segundo o próprio, tem uma certa influência de Ryuichi Sakamoto!

FIONN REGAN, PRIMAVERA EM DEZEMBRO!

A juntar ao magnífico pecúlio reunido em "O Avalanche" de Fionn Regan, um dos álbuns do ano aqui pelo domicílio, dá-se a ouvir o inédito e primaveril "June Song", tema novo do músico irlandês. 

São desconhecidos pormenores da canção, mas deverá ser resultado da mesma estadia por Maiorca onde compôs a maior parte do referido disco. As imagens do video parecem prová-lo.

sábado, 21 de dezembro de 2024

3X20 ESPECIAL 2024

















20 CANÇÕES X 20 ÁLBUNS X 20 CONCERTOS 
+ 10 Low + 10 High 2024 
Dizem que fazer listas reduz a ansiedade. Bem que precisamos... 

20 Canções: 
1. HURRAY FOR THE RIFF RAFF - The World Is Dangerous »»» 
2. NICK CAVE & THE BAD SEEDS - Song of the Lake »»» 
3. ADRIANNE LENKER - Ruined »»» 
4. JESSICA PRATT - Better Hate »»» 
5. CHROMEO - BTS »»» 
6. JULIA HOLTER - Something in the Room She Moves »»» 
7. RICHARD HAWLEY - Prism in Jeans »»» 
8. WAXAHATCHEE - Right Back to It (feat. MJ Lenderman) »»« 
9. EMPIRE OF THE SUN - Music On The Radio »»» 
10. MC.GKEE - Candy »»» 
11. BNNY - Something Blue »»« 
12. FAT WHITE FAMILLY - Visions of Pain »»» 
13. AROOJ AFTAB - Whiskey »»« 
14. BRITANY HOWARD - Every Color In Blue »»» 
15. ELEPHANT9 - Party Among The Stars »»» 
16. THE WOODENTOPS - Liquid Thinking »»» 
17. LITLE WINGS - Green Grass of Spring »»» 
18. BADBADNOTGOOD - Sétima Regra »»» 
19. KHRUANGBIN - Pon Pón »»» 
20. KACEY MUSGRAVES - Dinner with Friends »»» 

20 Álbuns: 
1. JESSICA PRATT - Here in the Pitch 
2. HURRAY FOR THE RIFF RAFF - The Past Is Still Alive 
3. BETH GIBBONS - Lives Outgrown 
4. ELEPHANT9 - Mythical River 
5. LAURA MARLING - Patterns in Repeat 
6. FIONN REGAN - O Avalanche 
7. HERMANOS GUTIERREZ - Sonido Cósmico 
8. CASSANDRA JENKINS - My Light, My Destroyer 
9. JAKE XERXES FUSSELL - When I'm Called 
10. THE AMAZING - Piggies 
11. BADBADNOTGOOD - Mid Spiral 
12. NILUFER YANIA - My Method Actor 
13. GEORDIE GREPP - The New Sound 
14. NUBYA GARCIA - Odyssey 
15. MK.GEE - Two Star & The Dream Police 
16. RYUICHI SAKAMOTO - Opus 
17. ISOBEL CAMPBELL - Bow To Love 
18. HIGH LLAMAS - Hey Panda 
19. GHOST FUNK ORCHESTRA - A Trip to the Moon 
20. ANDREW COMBS - Dream Pictures 

20 Concertos: 
1. PULP, Primavera Sound Porto, 8 de Junho »»» 
2. RICHARD HAWLEY, Teatro Salesianos, Vigo, 21 de Setembro »»» 
3. KEVIN MORBY & ENSEMBLE DA ESMESPINHO, Auditório de Espinho, 24 de Novembro »»» 
4. RYLEY WALKER, GNRation, Braga, 4 de Outubro »»» 
5. PJ HARVEY, Primavera Sound Porto, 6 de Junho »»» 
6. ARNALDO ANTUNES & VITOR ARAÚJO, Ponto C, Penafiel, 27 de Outubro »»» 
7. PANDA BEAR, Plano B, Porto, 7 de Dezembro »»» 
8. LUBOMYR MELNYK, Auditório de Espinho, 2 de Novembro »»» 
9. BEACH FOSSILS, Festival Paredes de Coura, 16 de Agosto »»» 
10. MOSES BOYD, Matosinhos em Jazz, 13 de Julho »»» 
11. SOUNDWALK COLLECTIVE & PATTI SMITH, Theatro Circo, Braga, 24 de Março »»» 
12. SCOTT MATTHEWS, Sala do Capítulo, Museu de Leira, 17 de Novembro »»» 
13. JULIA JACKLIN, Teatro Jordão, Guimarães, 6 de Outubro »»» 
14. JIM WHITE & MARISA ANDERSON, Claustro da CMBarcelos, 14 de Setembro »»» 
15. CAT POWER SINGS BOB DYLAN, Festival Paredes de Coura, 16 de Agosto »»» 
16. ALABASTER DEPLUME, GNRation, Braga, 2 de Março »»» 
17. BILL MACKAY, Teatro Rivoli, Porto, 13 de Setembro »»» 
18. KARA JACKSON, GNRation, Braga, 15 de Junho »»» 
19. LAMBCHOP, Primavera Sound Porto, 7 de Junho »»» 
20. ROBERT FORSTER, M.Ou.Co., Porto, 3 de Junho »»» 

10 Low: 
. o álbum que não saiu dos Três Tristes Tigres; 
. o retorno do devil Trump; 
. a ofensiva criminosa de Israel; 
. a partida do imprescindível Paul Auster; 
. a lição esquecida dos incêndios; 
. o figurão Musk a lançar e a recolher a teia; 
. a banhada do e no Primavera Sound Porto; 
. o racismo e a xenofobia perfeitamente instalados; 
. o "estoumecagandismo" da empresa Metro do Porto; 
. a inacreditável facilidade para fugir de uma prisão portuguesa; 

 10 High: 
. o convívio galego com Richard Hawley; 
. o milagroso futebol feminino português; 
. o "Opus" de Mr. Sakamoto venerado num grande ecrã; 
. não uma, mas duas medalhas olímpicas de Iúri Leitão; 
. as crónicas dominicais do Valter Hugo Mãe; 
. a beleza embriagante do disco da Jessica Pratt; 
. o "Coyote" e o novo imão "Sinais de Fumo" do Pedro Costa na Ant3na; 
. a exposição "Para Ser Eterno Basta Ser Um Livro..." na Casa do Design; 
. o portentoso Tadej Pogcar em cima de uma bicicleta; 
. o mar de gente que ainda celebra a preciosa liberdade de Abril.

UAUU #734

sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

(RE)LIDO #125





















GRANT & I 
Inside and Outside The Go-Betweens 
de Robert Forster. Londres; Omnibus Press, 2017 
Os Go-Betweens foram a melhor banda dos anos oitenta e foram, por sinal, a mais desprezada. Quando em 1989 Robert Forster e Grant McLennan decidiram acabar com o projecto ao fim de seis álbuns de originais, restava entre os dois uma amizade inabalável que não impediu caminhos a solo. A separação implicou dores, desconfianças e receios, mas nunca rancores definitivos, não se estranhando que os dois tenham decidido reatar o grupo em 2000, gravando mais um excelente par de discos. A morte inesperada de McLennan em 2006 haveria, em definitivo, por fechar o pano dos Go-Betweens não sem que uma promessa fosse assumida por Forster - contar tudo do princípio ao fim, homenageando o amigo perdido e assumindo uma faceta de narrador de histórias ou crítico de música que a paixão superior pelo pop/rock sempre coartou. 

O resultado, datado de 2017, mas de validade eterna, é este livro de reluzente narrativa e frenética cadência, funcionando como uma memória do rock de inquestionável perspicácia e talento que, desde o início, parece destinado a selar e cristalizar uma amizade, como muitas, de profundidade crescente. Foram três décadas de irmandade cúmplice, ainda que a aproximação entre ambos se tenha afigurado difícil - a relutância de McLennan em assumir um instrumento para tocar seria superada por uma estratégia, quiçá, literária de Forster ao fazer das líricas das primeiras canções um chamariz irresistível. Nick Cave haveria de topar essas letras, apelidando-o como o mais verdadeiro e estranho poeta da sua geração. 

A clareza, a piada com que Forster nos aproxima a esses momentos de partilha, denotando uma rara franqueza e até uma desarmante ousadia, funciona como uma sequência cinematográfica sem intervalo que nos põe a reconstituir os cenários, os ambientes ou as expressões de dois personagens tão diferentes e, ao mesmo tempo, tão iguais e de que, por si só, a estadia primeira em Londres, vindos da Austrália, resultaria em argumento fílmico de imediata eficácia. A inconstância dos contratos com as editoras, a relutância em fazer alguns concertos e tournées, as parcerias e ajudas inesperadas, são assumidas como vitórias saborosas e não como pecadilhos profissionais de arrependimento, sinceridade que se espelha numa prosa de celebração contínua em que as canções são, e serão, o mais importante. 

A digressão com Lloyd Cole, de que fomos testemunhas, aporta a única referência a Portugal, concretamente a um campo de golfe lisboeta para uma disputa com o próprio Cole apostada num backstage. Pena que uma anterior e atribulada estadia que trouxe os Go-Betweens a Lisboa e ao Porto em 1989 não mereça maior destaque, quando do quarteto faziam parte duas raparigas, uma delas, Amanda Brown, aceleradora de corações a que McLennan não resistiu na paixão. Quando no Passos Manuel em 2019 lhe fizemos a desafio, entre conversas de pós-concerto, para recordar esses tempos, Forster remeteu-nos para o livro que ainda não lhe tínhamos pedido para assinar. Quando o fizemos, logo percebeu que, ou a leitura foi mal feita ou ainda não tinha ocorrido, pois a resposta foi um simples "You'll get it!". Percebido, amigo!

Sempre que pretenderem fazer de um funeral uma impossível boa memória, o concelho é para que marquem e o aprendam nas últimas páginas deste magnífico livro, uma especial e sentida sequência festiva de homenagem a um amigo que foi, por dentro e por fora, como um verdadeiro irmão. Acreditem, o "I am a Believer" que o Neil Diamond escreveu para os The Monkees em 1966 nunca deverá ter soado tão perfeito!  


KINGS OF LEON A BOM CAMINHO!















Os Kings of Leon, como confessado e documentado, continuam a despertar o nosso interesse e devoção. Nunca mereceram, no entanto, qualquer agendamento nortenho, estando já confirmada a sua presença, a terceira, em Lisboa a 12 de Julho de 2025 no âmbito do NOS Alive

Fazendo por aqui um aparte, remoque aos organizadores do principal festival da Invicta que se realizará pela décima segunda vez na primavera e cientes que há bandas que já duplicaram ou triplicaram a presença no mesmo evento, lembramos que, para além dos KOL e só para citar alguns, Django Django, Alt-J, Artic Monkeys, Arcade Fire, LCD Soundsystem, The Black Keys, Jack White, Hot Chip, Phoenix, BADBADNOTGOOD, The Smile, Vampire Weekend ou The Strokes nunca tocaram no Parque da Cidade! 

Por isso, a notícia que os KOL serão uns dos cabeças de cartaz do concorrente O Son do Camino, festival que acontece em Santiago de Compostela, precisamente, nos dias do Primavera Sound Porto, é mesmo uma atraente boa-nova, constituindo a oportunidade perfeita para colmatar a lacuna e um forte início de uma troca de galhardetes - se antes eram os espanhóis a vir ao Porto, adivinha-se que começará a acontecer o contrário.

A banda norte-americana fará, na ocasião, a apresentação do nobre disco "Can We Please Have Fun" de 2024, estando ainda por divulgar o dia, de quinta a sábado, em que ocorrerá a estreia galega. Os bilhetes diários, por isso, ainda não estão disponíveis, mas o abono completo está já à venda. Manteremos a atenção! 


quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

DUETOS IMPROVÁVEIS #299

SUSANNA HOFFS & ELVIS COSTELLO 
Connection (Jagger/Richards) 
Keith Richards 81st birthday celebration, 
Baroque Folk Records, E.U.A., Dezembro de 2024.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

WAXAHATCHEE DE SECRETÁRIA!

PEARL CHARLES, RAÍNHA DO DESERTO!





















A californiana Pearl Charles está de volta às canções para um álbum novo a sair no próximo mês de Abril. Em "Desert Queen" parece manter-se uma invejável queda para uma pop retrovisora embaciada pelo kitcsh do disco ou da boa onda west coast, o que se confirma em dois primeiros avanços, um deles, "Does This Song Sound Familiar?" com direto a uma "7" Version" mas cujo single de vinil não conseguimos localizar! 

O álbum terá edição em casa própria chamada Taurus Risng Records, com diferentes variações de capa entre os E.U.A. e a Europa, continente que têm na distribuição da Last Night From Glasgow uma série de pacotes e conjuntos coloridos em pré-encomenda

O regresso aos originais mereceu já digressão britânica em Outubro, seguida, depois, pela California e na qual Charles também se assumiu como dj em vinil ao lado do marido Michael Rault, também ele músico e dj

Uma noitada deste calibre seria bem-vinda, atendendo até ao inexplicável adiamento e, posterior, cancelamento de um concerto portuense ocorrido em 2021 e para o qual se preparavam os passos de dança e se começavam a limpar as lantejoulas e os espelhos...


sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

LAST CHRISTMAS NO MERCADO 48!





















Agora que o single dos Wham! faz quarenta anos, que a loja Mercado 48 faz dez e que, tchhhh, a chafarica Campainha Eléctrica faz dezoito, está prometida animação para o próximo Domingo, 15 de Dezembro, pelas 19h00 na loja da Rua da Conceição. Motivo? 

O amigo Daniel Knox gravou uma versão do incontornável hit de George Michael em 2010 e que tem agora edição limitada em vinil quadrado transparente pronta para lançamento nessa tarde e noite. O artista fará um pequeno showcase ao piano. No mesmo single, que toca só de um lado, há uma surpresa chamada "Lost Christmas" e a capa, linda, é da autoria do Zé Carlos Moutinho. Aceitam-se encomendas online

Lá estaremos a desempoeirar rodelas pequenas, algumas delas de feição natalícia ou espirituosa, mas prometemos não chatear com a Mariah Carey! 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

UAUU #733

AMANDA WHITING, ABRACINHO DE NATAL!

Se ainda não estão em "modo Natal" fazem bem. Para, aos poucos, entrarem na onda, que tem tanto de irritante como de fofinho, podem sintonizar um conjunto de peças que harpista maravilha Amanda Whiting decidiu gravar para o álbum "A Christmas Cwtch", o segundo no mesmo ano

A estranha palavra significa abraço, mas também conforto ou segurança num dialecto galês, o que é fácil de sentir ao ouvir qualquer uma das catorze recriações de clássicos de Bill Evans, Tchaikovsky ou Vince Guaraldi. O conjunto, que devia ser obrigatório como música de fundo em qualquer loja com bom gosto, propaga-se pela magia da harpa e dos arranjos do restante trio de jazz numa fofura cozy e de capa schulziana.



terça-feira, 10 de dezembro de 2024

3X20 DEZEMBRO

PANDA BEAR, Plano B, Porto, 7 de Dezembro de 2024

O disco "Sinister Grift" que Noah Lennox aka Panda Bear prometeu para Fevereiro próximo tem digressão prévia em plena rodagem, tendo a circulação servido para encabeçar a comemoração dos dezoito anos do clube portuense. Uma sorte que, mesmo assim, não esgotou o pequeno espaço da cave... 

Com direito a banda de quatro músicos, uma fórmula bem diferente daquela em que o vimos pela primeira vez ao vivo (tchhhh, 2007!) ou ao lado de Sonic Boom com que regressou ao Porto há dois anos, a noite haveria de confirmar a plenitude de uma receita multi-sonora de profundeza desconhecida e infinita, tendo o mergulho contemplado novos e velhos temas, sem que o tempo pareça que os separe. 

A tudo se poderá chamar, simplesmente, pop, mas o patamar de psicadelismo que a rodeia é de uma fertilidade criativa de indisfarçável espanto e que só alguma pobreza da amplificação não permitiu alastrar ainda mais. A contínua acrobacia das canções, como que unidas por uma liquefacção instrumental, tanto sugere ser válida para ambientes nocturnos e madrugadores ou para fins-de tarde ao ar livre de brisa fresca, variação que caberia libertadora, imaginámos, num qualquer festival de verão apetitoso. 

Tamanha reinvenção, seja onde for, deverá anunciar-se como irresistível e excepcional ou não fosse a arca deste Noah uma das mais antigas, das presentes e das futuras tábuas da salvação da música.  

segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

LUCINDA WILLIAMS, A MANIA DOS BEATLES!





















Em 1963, aos dez anos de idade e a viver a infância em Santiago do Chile, Lucinda Williams foi uma das muitas crianças fascinada com o fenómeno The Beatles. Ouvidos pregados ao rádio, posters colados na parede, recortes contínuos de notícias e fotografias dos jornais ou revistas e paixonetas por Paul McCartney ou George Harrison. Da Beetlemania, infecciosa, não mais se livrou... 

Não se estranha por isso que um disco chamado "Lucinda Williams Sings the Beatles From Abbey Road" tenha saído a semana passada, mais uma colecção, a sétima, de versões que a cantora de Nashville tem dedicado a bandas e artistas preferidos, um género de "jukebox series" iniciadas durante a pandemia e que já contemplou vénias a Bob Dylan, The Rolling Stones ou Tom Petty. Todas a funcionar como uma terapia curadora de um ataque cardíaco que nunca mais lhe permitiu tocar guitarra, mas que lhe manteve a força para continuar a compor, gravar e cantar. 

Aquando de um série de concertos em Londres, a sugestão do marido para que o registo fosse nos Abbey Road Studios, local mítico donde os The Beatles emanaram a maior parte dos hits planetários, parecia tola. Certo é que ela se tornou uma das primeiras a gravar os Fab Four na casa, na sala de estar, dos Fab Four, sendo a maior dificuldade escolher que canções eleger entre os dois centos que os de Liverpool germinaram. 

Doze era o número pré-definido e a melhor estratégia seria concentrar a seleccção no tal período inicial e de descoberta dos The Beatles, mas tornou-se irresistível e tentador estender a recriação a mais recentes fases, sendo por isso que o álbum contempla canções como "Something", "Let It Be", "While My Guitar Gently Weeps" ou "Yer Blues". Apesar de ouvidas milhares de vezes, Williams confessa a sua dificuldade em cantá-las. A classe, contudo, com que o faz é magistral e até surpreendente. Fab!



sábado, 7 de dezembro de 2024

PETER BRODERICK, UM MIMINHO!





















Tem uma semana a passagem de Peter Broderick pelo Porto e ficaram prometidos novos projectos e músicas ao fim de algum tempo envolvido com o mundo de Arthur Russell. 

Pois, não demorou nada para que surgissem novidades como é o caso do single digital "Mimi", com fotografia de capa do próprio e saído na Erased Tapes a meio da semana. A explicação, numa tradução informal, é dada pelo próprio: 

"A família pediu-me para tocar violino no funeral da minha avó Mimi. Escrevi esta peça para a querida matriarca da nossa família. Para minha grande surpresa, quando o primo John Doran ouviu isso no funeral, ficou inspirado para escrever um acompanhamento de órgão. Enquanto isso, outra grande Mimi faleceu na mesma época – a voz angelical Mimi Parker dos Low. Aprendi a música deles "Laser Beam" e a minha irmã Heather Woods Broderick teve a gentileza de cantar em harmonia. Com essas duas músicas me curvo em homenagem às grandes Mimi’s perdidas deste mundo."


sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

JAMES BLACKSHAW, DESVENDA-SE UMA MARAVILHA!





















Sendo certo que o hiato prometido em 2015 teve algumas, e boas, interrupções, James Blackshaw cumpriu no final do mês passado o regresso oficial aos discos com "Unraveling in Your Hands", mais uma maravilha da composição à guitarra de doze ou seis cordas e não só... 

São três as peças compiladas, sendo o tema título um longo sobe e desce de vinte e sete minutos pleno de arpejos sinuosos, sugerindo momentos de improvisação e de uma prévia harmonia. Na sua maneira incontornável, mais um clássico

Segue-se "Dexter", uma surpresa ambiental, já que é um orgão o instrumento principal escolhido, a que se juntam cordas de Charlotte Glasson, autora a meias da composição. 

A trilogia completa-se com "Why Keep Still", sem dúvida, a peça mais tradicional e convencional onde às seis cordas da guitarra se faz ouvir um piano a fazer lembrar o trabalho que gravou com Lubomyr Melnyk em 2013

O disco foi auto-produzido e é dedicado a John Hannon, produtor e violinista inglês falecido, repentinamente, em 2021. O desenho da capa é da autoria de Nicole M Boitos Hayhorth, habitual colaboradora de Blackshaw que também já desenhou para Michel Gira ou Neurosis.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

NICK DRAKE, FELIZ ANIMAÇÃO!



















A probabilidade de existirem imagens em movimento de Nick Drake adulto guardadas em algum arquivo ou gaveta esquecida é, ainda hoje, muito ténue. Restam especulações quanto a ser ele num registo ocasional, supostamente, de passagem por um festival ao ar livre em Inglaterra, autenticidade negada pelo seu mais recente biógrafo, Richard Morton Jack. 

O gif de acima, em que ele nos pisca o olho, é já, nos nossos dias, arqueologia digital, pois a imparável inteligência artificial tende a fazer milagres como estes três de abaixo que animam, de forma competente, fotografias clássicas do cantautor inglês. Todos, sem excepção, nos fazem sorrir...



KEATON HENSON, DESALENTO NATALÍCIO!

No seu jeito solitário e até amargurado, Keaton Henson gravou uma canção de Natal sem ser de Natal, apesar do título. Letra sombria, miserabilista e nada festiva, talvez a intenção seja alertar para os efeitos perversos da época que se aproxima, onde algum desalento pode, mesmo assim, ser revertido. Não deixa, no entanto, de ser uma grande canção, mais uma!