quarta-feira, 6 de novembro de 2024

BETH GIBBONS, BIBLIOTECA DE PRINCESA!

Enquanto aguardamos uma qualquer milagrosa confirmação de um concerto por perto da princesa Beth Gibbons (esqueçam o Primavera Sound Porto), surgiu ontem a divulgação, via Canal Arte, de uma deslumbrante gravação ao vivo realizada em Julho passado na sala oval da Biblioteca Nacional de França, bem no centro de Paris. 

Enquadrado na notável série "Passengers" que aposta em levar artistas e bandas a locais inusitados (Fever Ray, Metronomy, Jungle ou L´Imperatrice já aderiram), o alinhamento contempla a quase totalidade dos temas do excelente disco "Lives Outgrown", um dos melhores do ano, a que foi acrecentado "Mysteries", original de 2002 ao lado de Rustin Mann (Paul Webb) incluído em "Out of Season". 

Luminosos e inesperados, estes são quarenta e cinco minutos imperdíveis de majestosa delicadeza que se espera possam vir a ser ampliados e sentidos, a três dimensões, no próximo ano...

BLITZ, 40 ANOS!





















Sobre O jornal "Blitz" e o seu efeito "bíblia" já por aqui discorremos há muito. A imagem de capa do primeiro número saído a 6 de Novembro de 1984 foi sacada assim, maravilhosamente queimada, no blog "O Velho Blitz" de que ainda se mantém o link ali ao lado, mas há hoje uma versão limpinha em oferta oficial.   

Se porventura esse papel sujo se tivesse sido mantido até os dias de hoje, não temos qualquer dúvida que a ida ao quiosque também ela, sagrada, se repetiria todas as semanas... Seja como for, parabéns BLITZ!


terça-feira, 5 de novembro de 2024

LUBOMYR MELNIK, Auditório de Espinho, 2 de Novembro de 2024

Nas palavras do próprio Lubomyr Melnik, passaram já cinquenta anos sobre a "invenção" da continuous music, um género único que se obtém rodando as diversas faces das teclas de um piano em efeitos melódicos ou sincopados e onde a repetição se evidencia vital e fecunda. Não há, por isso, muitas pautas para a aprender ou seguir, não restando também muitos a dedicar-lhe prática corrente e crescente. Melnyk, que já era uma preciosidade quando esgotou a Catedral de Viseu há nove anos atrás, tornou-se, por isso, nos dias de hoje, uma raridade a que não se deve olhar a meios na preservação e fortalecimento. 

Aos setenta e cinco e anos e em plena forma, o mestre escolheu um alinhamento de quatro longas peças que introduziu demoradamente e onde, pela agilidade e velocidade de execução, como que agitou uma penumbra sonora de que apetece não ver o fim e que se alonga, misteriosa, em intrépidas sequências circulares que só a pausa, que se sabe irá acontecer, consegue, por magia, suspender. 

Na defesa e promoção de tão invulgar receita melodiosa, Melnyk tem recorrido a parcerias com músicos do seu país natal, apostando na sua inclusão, mesmo que indirecta, em concertos, como foi o caso da composição "Antiphons 2", executada com o suporte pré-gravado de um quarteto de cordas ucraniano, variação, ainda assim, de diferente efeito e absorvência. 

Para a despedida e aproveitando o embalo, estava programada "The Sacred Thousand", peça de recente decalque em disco como homenagem aos soldados ucranianos que resistiram ao exército russo em Mariupol, uma guerra que Melnyk condenou e culpou, justamente, pela tirania, ultraje e horror praticados pela potência invasora. Pena que, alguns, do conforto da cadeira, não tenham sabido respeitar esse sofrimento, interpelando, a despropósito, o músico quanto à dispensa da política em favor da audição musical, como se, no caso, elas fossem separáveis e alienáveis. Sentido, Melnyk fez notar, na resposta, a grandeza eterna da arte como forma de luta, recebendo forte aplauso e vivas de uma plateia incomodada e empertigada, mas que, em silencio venerado, como que lhe foi pedindo desculpa ao longo dos vinte e cinco minutos da rendição, agora, ainda mais urgente.           

Também por isso, o serão em Espinho foi, pois, mais uma dessas sessões inesquecíveis em que uma imparável e vibrante tensão nos esganou nos movimentos e na respiração, um género de castigo deleitante que só a música e este som, seja lá o que isso for, impõem sem contemplações. E, sim, a música, esta música, será sempre uma arma...    

segunda-feira, 4 de novembro de 2024

DUETOS IMPROVÁVEIS #297

PAUL WELLER & KATHRYN WILLIAMS 
So Quietly (Weller) 
EP "Suplemment: 66", Polydor Records
Inglaterra, Outubro de 2024

QUINCY JONES (1933-2024)















Para quem teve nos anos oitenta do século passado o período onde nenhum estilo de música era desprezado, o nome de Quincy Jones é de natural reconhecimento - foi ele que produziu, consecutivamente, três álbuns de Michael Jackson ("Off the Wall" de 1979, "Thriller" de 1982 e "Bad" de 1987") e muitos dos hits planetários daí retirados. É também dele a produção de um late Frank Sinatra de que "LA. Is My Lady" é só uma variação notada a roçar a perfeição. 

Mas Jones tinha ainda outros predicados e é também fácil reconhecer no seu próprio hit "Ai no Corrida", que afinal era uma versão melhorada de tema do inglês Chaz Jankel, um efeito agitador que ainda hoje não derrapa na idade. Quincy Jones morreu ontem na sua casa de Bel Air, California. Peace!


sexta-feira, 1 de novembro de 2024

KOKOROKO, MENSAGEM RECEBIDA!



















O magistral colectivo londrino Kokoroko, que tem por hábito agitar e incendiar plateias dançantes, lança no dia de hoje um novo EP com quatro temas de onda afrobeat e jazz que se recomenda sem limites. Chama-se "Get the Message" e pretende, simplesmente, festejar a alegria e a felicidade em fazer e ouvir boa música. Motivo, por isso, para uma nova, intensa e muito esgotada digressão europeia ao longo de todo o mês. 

A peça mais antiga é "Three Piece Suit", que ainda em bruto tinha o mesmo título do EP, e é um tributo aos emigrantes nigerianos chegados nos anos sessenta a Londres e de que são herdeiros Onome Edgeworth, percussionista da banda e Azekel, artista convidado a dar voz ao tema e que já participou em discos dos Massive Attack ou Gorillaz.  

Mensagem recebida!


DAMIEN JURADO, AO VIVO NA CATEDRAL!





















As notícias referentes a Damien Jurado contemplam, quase sempre, discos inéditos. Esta não foge à regra. Trata-se de um registo ao vivo efectuado em Agosto passado na St. Mark's Cathedral de Seattle e conta com uma edição de vinil rapidamente esgotada, apesar do lançamento só estar agendado para 12 de Novembro! O alinhamento das doze canções mistura clássicos antigos e novos temas, alguns deles, dos álbuns que editou de forma consecutiva e estranha há um ano atrás

O novo disco foi produzido e tocado pelo próprio com a ajuda de Lacey Brown, artista que tem sido parte da banda que o acompanha e com quem realizou um dueto de "Cloudy Shoes", tema antigo e, precisamente, o único disponível para audição. 

Estranheza é, pois, o que agora envolve um músico em suposto retiro curativo quanto à assumida doença mental, mas que projecta para os fãs o que se irá seguir - logo em Janeiro, concertos ao vivo onde tocará, de fia pavio, discos seus sem ordem ou razão; mais algumas, muitas, edições de discos; "residencies", naquilo que considera ser o seu futuro sem viagens ou hotéis e gozando o conforto da "sua" cama. Tudo isto foi anunciado na rebuscada plataforma Substack em papel batido numa máquina de escrever!

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

UAUU #730

SHARON VAN ETTEN E UMA BANDA!





















Não o sabíamos, mas Sharon Van Etten não gostava de fazer jam sessions, isto é, improvisar com outros músicos sem qualquer ensaio. Mudou de opinião após um convite à banda que a rodeia e, curiosa, apreciou logo o que se conseguia ouvir e criar. O resultado cresceu para a gravação de um álbum, registado no estúdio londrino The Church sob batuta da jovem produtora Marta Salogni, ao lado de Jorge Balbi na bateria, Devra Hoff no baixo e vozes e Teeny Lieberson no sintetizador, piano, guitarra e vozes. Oficialmente, o projecto recebeu o título homónimo de Sharan Van Etten & The Attachment Theory e terá edição no início de Fevereiro pela Jagjaguwar em diversos formatos

A jogada, ainda não perceptível na sua total validade, bem que era necessária atendendo à desilusão quanto a "We've Been Going About This All Wrong", disco com pouco mais de dois anos, mas de esquecimento penoso. Esperemos que o inédito e libertador modus operendi permita o reencontro com outra dimensão de uma artista de cepa antiga. Que este prometedor "Afterlife" seja mesmo isso, uma nova vida depois da sonolência...

terça-feira, 29 de outubro de 2024

ARNALDO ANTUNES & VITOR ARAÚJO, Ponto C, Penafiel, 27 de Outubro de 2024

Num reencontro, depois de férias, com um amigo e produtor cultural, veio à conversa qual o maior dos recentes concertos do ano até aí vividos - o de Arnaldo Antunes & Vitor Araújo no MIMO amarantino era para ele, sem qualquer dúvida, o melhor de todos. "Da próxima, não faltes"! Foi o que fizemos no fim de tarde de Domingo em Penafiel, um espectáculo que encerrava uma semana de Escritaria em homenagem a Arnaldo Antunes e que, confirmado, é mesmo imperdível. 

O disco "Lágrimas do Mar", editado aquando da chegada pandémica, reúne nove temas cantados por Antunes e arranjados ao piano, na totalidade, por Araújo, reinventando "Como 2 e 2" de Caetano Veloso e "Manhãs de love", parceria no original com Erasmo Carlos. Estica-se ainda a temas de Itamar Assumpção e do próprio cantor e acrescenta quatro canções inéditas, uma diversidade a que se adicionam várias outras surpresas e muitas certezas, ou não já estivesse o duo mais que rodado em digressões pelo Brasil, E.U.A. e Europa (já em 2022 tinham passado por Lisboa e Coimbra e a experiência mereceu recente álbum oficial ao vivo). 

Para quem tinha dúvidas quanto ao âmbito literário do agendamento do concerto, qualquer um dos primeiros temas ("João" ou "Lágrimas no Mar"), frisados nas líricas pela voz grave de Antunes e pelo bailado do piano, confirmavam o porquê da homenagem ao poeta e músico de São Paulo. Essa força da palavra e da, como que escangalhada, métrica das rimas, situa-se num nível de modernismo e actualidade exasperante e quase milagroso - "O Real Resiste" deveria ser de urgente e insistente rodagem radiofónica e "Na Barriga do Vento" soprada aos ouvidos dos que resistem ao amor. 

As escolhas semi-alheias não foram inocentes - "Vilarejo" de Marisa Monte (que também passou por Penafiel) que os Tribalistas consagraram é, talvez, umas das maiores canções brasileiras das últimas décadas, também muito à custa de uma lírica única no desejo de uma felicidade colectiva em constante ameaça; "O Pulso" dos Titãs é, sem parecer, um hino à vida ameaçada nas doenças soletradas e vencidas. Poderosas, e a que se juntou outra pedra chamada "Lua Vermelha", brilhante na cenografia e imagens em palco. 

Também assinalável o pedacinho a solo de Vitor Araújo, variando "Merry Christmas Mr. Lawrence" de Sakamoto e um tema de cariz tropical, validando uma destreza e um dão de domínio incontestável. Para "Se Tudo Pode Acontecer" e o referido "Como 2 e 2" de Veloso haveria de formar-se um dueto surpresa com Marcia Xavier, parceria já testada noutras ocasiões e estúdios. O incontornável "Saia de Mim" dos Titãs, deixado para o fim, haveria de funcionar como um murro num estômago ainda inteiro mas prestes a rebentar pelo abalo tumultuoso. Uma peça relaxante ("Alta Noite") no único encore haveria de nos acalmar na satisfação e fortalecer, na reverência, a um músico poeta de escritaria superior. Uma bendição!   

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

PANDA BEAR, SÉTIMO SELO!





















O, há muito, cidadão luso-americano Noah Lennox aka Panda Bear terá o sétimo disco editado em Fevereiro de 2025 pela Domino Records. O registo de "Sinister Grift", que foi totalmente realizado no seu Estúdio Campo de Lisboa, conta com Josh Dibb, parceiro nos Animal Collective, como co-produtor e instrumentista e o auxílio de Rivka Ravede do projecto Spirit of the Beehive com sede em Filadélfia. Revela-se ainda a colaboração de Cindy Lee no primeiro single "Defense", tema com direito a 7" de vinil a que se junta "Virginia Tech", inédito que não será incluído no álbum. A rodela pode já ser encontrada em sites portugueses

A promoção do novo trabalho têm digressão europeia anunciada para Dezembro com três datas nacionais (dia 4, Salão Brazil, Coimbra; dia 7, Plano B, Porto; dia 8, Galeria Zé dos Bois, Lisboa) a que se juntarão, em Março do próximo ano, passagens pelo Theatro Circo, Braga (dia 21) e Teatro das Figuras, Faro (dia 28). Ao seu lado, em palco, terá a companhia dos portugueses Maria Reis e TOMÉ.


sábado, 26 de outubro de 2024

THE UNTHANKS, JÁ SE PODE FALAR DO NATAL?





















A resposta das The Unthanks é de óbvia aprovação, ou não fosse "In Winter" uma inédita e venturosa vénia ao quente/frio de uma estação do ano que se quer mágica mas que é, muitas vezes, agridoce. Fazê-lo com temas de Natal de toda a Europa, acrescentando variações a alguns tradicionais e gerando novas canções, demorou uma semana em estúdio situado no parque North York Moors do norte de Inglaterra, uma safra fantástica com aquele toque tradicional que só as manas Rachel e Becky tem o dão de prolongar. 

Para já, o aquecimento de conforto pode começar ao som de "Dear Companions", por sinal, um hino escolhido para encerrar o décimo sexto álbum de um projecto de mérito premiado e que, ao seu estilo, se reinventa de forma surpreendente - uma música alemã de Natal ao jeito dos Beach Boys ("O Tannenbaum"); uma canção espanhola refeita por folkies britânicos e com um filtro em Tom Waits ("Carol Of The Birds") ou até histórias antigas coloridas com folk noir e laivos de "Feliz Natal Charlie Brown" de Vincent Guaraldi. Quentinho e a pedir proximidade da família, de amigos ou de enamorados... 

ANNA B. SAVAGE, A CRIAR RAÍZES!





















Depois de uma recente digressão a fazer a primeira parte dos espectáculos de St. Vincent na Europa, Anna B. Savage anunciou o terceiro álbum de originais, a que deu o nome de "You and i are Earth", a sair em Janeiro via City Slang. De forma simples, a inglesa diz que compôs as canções como uma carta de amor a um homem e a um país, neste caso, a Irlanda onde agora reside. O disco sugere estar, pois, coberto de uma gentileza que o novo acolhimento geográfico proporciona e que tem na primeira canção "Agnes" a ajuda de Anna Miek, convidada agora conterrânea e cúmplice na criação de raízes. 

Após o memorável "in|FLUX" de 2021, esta parece ser mais uma maravilhosa aventura sonora que, há muito, suspiramos ver ao vivo, o que torna a rasar a aspiração já que a tournée anunciada para Abril de 2025 destapa uma data nacional (Galeria Zé dos Bois, dia 23) sem subidas a norte, região onde já espalhou sementes... 

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

MARCO PAULO (1945-2024)

Fotografia: Arquivo do JN















A música popular, aquela a que depois se chamou pimba, não nos passou ao lado. Era impossível. Na rádio, na televisão a preto e branco, nas festas de São Bento das Pêras, em Rio Tinto, e até nas saudosas viagens de regresso dos jogos de voleibol em dia de vitória, havia um nome comum na animação - Marco Paulo! Nunca o vimos ao vivo e não compramos, na altura, nenhum dos seus discos, já que eram outros os tempos de empolgamento com "o direito à diferença". Contudo, a indiferença, mesmo sem o notarmos, nunca aconteceu e bastavam os acordes de algum dos êxitos para a esquecermos em cantoria, muita vezes, colectiva. 

Quando amigos e familiares começaram a insistir para ficarmos com os discos de vinil que já não queriam, substituídos pelos CD's, fomos acumulando as rodelas pequenas de todo o género. As do Marco Paulo, eram, quase sempre, as mais comuns, as mais diversas e, desde logo, as mais acarinhadas entre uma imensa "azeitice" quase sempre dispensável. De várias cores ("Eu Tenho Dois Amores" têm quatro tonalidades), de irresistível colecção, é delas que nos fomos servindo sempre que é preciso pegar fogo a uma festarola, um São João ou uma comemoração. 

Na hora certa, a alegria que transmitem, o contágio que provocam, o entusiasmo que aceleram, são, ainda e sempre, de uma imbatível e imediata felicidade só nossa. Os dois exemplos de abaixo são, pois, um dos top-mais possíveis de um vasto leque de escolhas. Paz!


segunda-feira, 21 de outubro de 2024

RYUICHI SAKAMOTO EM POESIA VISUAL!















Chama-se "Apichatpong Weerasethakul - A Conversation with the Sun", é um espectáculo visual que implica, parcialmente, a utilização de óculos de realidade virtual acompanhada por ondas provocadas pela música de Ryuichi Sakamoto. Estará no Teatro Rivoli, em estreia nacional, entre a próxima quarta-feira e sábado (23 e 26 de Outubro) em diversos horários, com entradas de público de trinta em trinta minutos, que circulará, para o efeito, pelo espaço e plateia do recinto. Ainda há alguns bilhetes

O tailandês Apichatpong Weerasethakul é dado como um dos mais importantes realizadores e artistas visuais a nível internacional, diversas vezes premiado em Cannes e autor de instalações onde, através de uma linguagem única, questiona temáticas como a memória, o desejo ou a identidade. Poesia visual do nosso e doutros tempos...

KAMASI WASHINGTON DE SECRETÁRIA!

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

RODRIGO AMARANTE, Ponto C, Penafiel, 13 de Outubro de 2024

Foto: facebook de Ponto C - Cultura e Criatividade 





















Na cidade de Penafiel nasceu, de forma harmoniosa, um novo espaço que se expande a diversas artes criativas e espectáculos culturais. Ponto C - Cultura e Criatividade é o seu nome e a presença de Rodrigo Amarante levou até lá muita gente curiosa num final de tarde de Domingo, o que esgotou o recinto com alguma naturalidade e antecipação. Pena que para lá chegar, sem indicações ou sinalização, se tenha mostrado difícil. Um descuido. 

Também descuidada pareceu-nos a primeira meia-hora do brasileiro em palco, um período a que a um confessado constrangimento e timidez se juntou um tom de voz e instrumentação da guitarra algo desajustadas, o que, aliás, já ao de leve tinha acontecido na passagem pela Casa da Música em 2022. O nivelamento haveria de estabilizar, em alta, a partir da monumental "Tara" seguida dos indispensáveis "Irene", "The Ribbon" ou na beleza da nova "In Time" retirada de uma banda sonora recente para o filme "His Three Daughters". Continuamos na dúvida se era mesmo necessário escolher "Coração Vagabundo", tão intocável no seu original caetaneano, em disco ou ao vivo, que não há, nunca, forma de o superar... 

Perto do fim e para ocupar o grande piano em palco, Amarante não dispensou "Fall Asleep" e "The End", confirmando que esta variação de piano-voz podia e deveria ser alvo de uma escolha intercalada mais comum, o que não retiraria, de forma alguma, nobreza e ternura a mais um concerto de abraços e partilhas que se querem renovadas e sinceras. Amarrante! 

terça-feira, 15 de outubro de 2024

HALEY HEYNDERICKX, REFLORESCER!





















A semente inicial do muito aguardado segundo álbum de Haley Heynderickx tem o mesmo nome - "Seed of Love" é uma enorme canção cujo rebento, em dois meses e meio, se mostra vigoroso e vistoso. Junta-se agora uma outra haste também ela saudável, sonhada há muito pela autora na sua necessidade de pacificar e acalmar o dia-a-dia - "Foxlove" é de um luxo folk tão grande que até fere. Para dia 1 de Novembro está prometida a floração plena pela Mama Bird Recordings.

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

FAROL #155















A recomendação podia e devia já ter acontecido, mas mais vale tarde... Certo é que só nas últimas semanas temos dado mais atenção ao álbum "Diamond Jubilee" do projecto canadiano Cindy Lee, uma sétima insistência de alvor psicadélico e minimalista da responsabilidade quase total de Patrick Flegel que, na sua rudeza retro, acaba por ser viciante. 

São e trinta e duas canções em dois discos sem formato físico, streaming ou outras modernices a não ser a audição via youtube ou a descarga gratuita em formato WAV, sim, WAV. Com um pouco de paciência conseguem ouvi-las no iTunes, se ainda o não deitaram fora. Nada como tentar...

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

A GIRL CALLED EDDY, TESOURO FAZ 20 ANOS!





















Em Agosto de 2004 a Anti-Records editou o disco de estreia de A Girl Called Eddy, incluindo versões, muitas, em CD e algumas, poucas, em vinil, um formato, nessa altura, quase em desuso. O êxito não foi grande apesar do unânime elogio da critica, da produção sublime de Richard Hawley e da preciosidade das canções. Para uma imensa minoria de fãs espalhados por todo o lado, este é um daqueles álbuns para levar para uma ilha deserta, para guardar com estima em local adequado (o nosso caso) e que não perderá nunca a classe! 

Atrás dessa rapariga escondia-se Erin Moran, fotografada de perfil para a capa, uma jovem americana que se converteu, pouco tempo depois, a uma clausura e anonimato até 2019, ano de edição de um segundo disco de originais também ele notável e que sugeria um regresso à vida artística. Certo é que, desde aí, outra vez se adensou o mistério sobre quando e como será o próximo ressurgimento que agora tem, pelo menos, uma comemoração especial. 

Assinalando os vinte anos do referido álbum de estreia, a casa escocesa Last Night From Glasgow irá reeditar em vinil pesado e transparente tamanho tesouro em duas cores à escolha (Dusk Blue e Sunrise Yellow), havendo cinquenta cópias de cada com direito a assinatura no interior. Disponível também um bundle com tudo isto e um Test Pressing, o que eleva a conta acima dos três dígitos. A remasterização respeitadora, que ficou a cargo do experiente Paul McGeechan, começa a ser expedida a partir de dia 11 de Novembro. Para os interessados, o melhor é arrepiar caminho...

CAMPAINHA ELÉCTRICA, 18 ANINHOS!















Seis mil oitocentas e quarenta e sete (com)postagens depois, faz hoje dezoito anos desde que um primeiro toque foi ouvido na rede. Sinceramente, ainda não percebemos, e não queremos perceber, como é que o raio da Campainha Eléctrica ainda não avariou ou se tornou obsoleta. Coisas da maioridade e que idade! 

Ficamos à espera sentados de uma daquelas placas neo vintage "blog de tradição" para afixar na porta e a que ninguém liga pevide. 

Triiiiiiiiiiin... 

Eighteen, balding, star
Golden, fallen heart

3X20 OUTUBRO

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

JULIA JACKLIN, Teatro Jordão, Guimarães, 6 de Outubro de 2024

Coincidência, ou não, Julia Jacklin tem escolhido o nosso país para terminar digressões europeias, sinal que do jardim à beira mar plantado continua a emanar um perfume de respeito e reverência que não se acomoda no simples aplauso, mas que têm nas suas canções uma inesgotável fonte de estímulo e inspiração, talvez, recíproca. 

Do berço da nação, contudo, não foram notadas presenças nesta segunda noite de concertos, uma estranha carestia que se confirmou quando Jacklin tentou perceber as proveniências de tão ferrenha e fiel devoção, obtendo respostas como "Austrália" - nada menos que os pais da artista, logo ovacionados e, diríamos, benzidos na germinação. A mãe teria direito a protagonismo humorístico mais à frente (ver ali abaixo em 46:04), uma boa onda que percorreu um concerto de intimidade pré-requisitada que, sem excessos, se alongou a conversas, confissões, súplicas de aviso a músicos australianos para virem a Portugal e de canções que alteraram, de certeza, o alinhamento previsto. Da nossa parte, foi por pouco que não pedimos para avisar a Kylie Minogue também para vir (Jacklin já comprou bilhete para um dos seus espectáculos... e afinal Minogue vêm mesmo), mas não foi preciso reclamar "Ignore Tenderness" porque alguém, e bem, o faria de imediato. 

De Melbourne viajou Jacob Diamond, comparsa a quem Jacklin emprestou vozes e coros no último disco lançado em Agosto. Coube aos dois e de uma assentada, a execução de quatro versões, a saber, dos The Roches, Fionna Apple, Bill Fay (maravilhosa, a única com edição oficial) e The Cranberries, esta última numa arriscada variação a capella, de confiante transpiração, prestada no limite da frente de palco. Surpreendente, mas tendo em conta que o concerto lisboeta de 2022 findou com uma rendição de Celine Dion... 

O término apoteótico, acertado e arranjado em mútuo acordo com o público negociante, incluiu "Body", "Head Alone" e o hit "Pressure to Party" (para quando uma rodela pequena de vinil que faça eterna justiça a esta malha?), tudo culminado com um "Comfort" de tocante e vibrante tensão, ou não fosse ela mais uma nobre canção sobre relações falhadas, esse borrão marcante de tantas vidas e sem as quais tudo seria uma chatice. 

Deve, pois, marcar-se já a próxima celebração de devotos a santa e aliviada Julia que, já agora, pode ser no mesmo e excelente recinto, quem sabe, um pouco mais cedo no horário mas sempre no momento certo, seja ele qual for. Que venha o novo álbum!

terça-feira, 8 de outubro de 2024

DANIEL JOHNSTON, SAUDÁVEL VÍCIO!





















Depois do assinalável tributo de 2020, a reedição prevista para este mês do álbum "Artistic Vice" de Daniel Johnston (1991) é outro acto de amor e carinho - às fotografias raras, um livro com as letras e uma recolha de testemunhos emotivos dos parceiros da então EYE Band, junta-se um segundo disco recheado de raridades, demos, ensaios e inéditos descartados como "All Good Children Got to Die", que hoje se deu conhecer numa animação video vintage.  

A versão dupla de vinil prevista e já em pré-encomenda é de um rosa e um azul lindos, tendo a totalidade das canções recebido uma remasterização sónica a cargo de Kramer, produtor e amigo de Johnston que trabalhou com os Galaxie 500 ou Will Oldham e que era também o dono da Shimmy-Disc, editora de Nova Iorque ainda activa e na qual foi originalmente editado o disco.

segunda-feira, 7 de outubro de 2024

UAUU #728

RYLEY WALKER, GNRation, Braga, 4 de Outubro de 2024

Sete anos depois, Ryley Walker regressou ao GNRation numa noite anunciada em parceria com William Tyler. A inédita partilha foi, entretanto, abortada, pairando a notícia que esta seria a última das oportunidades para ver e ouvir o artista, dito como farto da estrada e das digressões. Quer para o cancelamento, quer para o cansaço, apesar de sentado, não houve nenhuma explicação ou teoria por parte de Ryley, que, pelo contrário, se mostrou desejoso de regressar à primeira oportunidade a um país que adora. Não duvidamos da preferência...

No escuro da sala quase preenchida instalou-se, num instante, entre canções e afinações, um misto tangível da afamada pândega apalhaçada de alto teor de sarcasmo e non sense - a variedade vertida recaiu sobre o paraíso americano dos anos 60, a irritação inventada com o pai, cigarros nacionais de qualidade, viagens para a Baviera, sandes de frango das estações de serviço, negócios lisboetas de cocaína ou a nossa sexy beleza colectiva - e um desempenho sério e prazente da guitarra onde demonstrou a sua notável versatilidade e talento. 

Esticando os originais num género de jam introdutória, o que só permitiu identificar os temas ao fim de alguns minutos, a colecção confirmou-se de avultada estirpe americana, um género de reinvenção folk que ganha aos pontos a muita da bajuladora mainstream radiofónica. As raízes, essas foram como que adornadas cortesmente em duas enormes versões de John Martin (uauu!) e Anne Briggs! 

A herança perece estar, assim, mais que assegurada e em boas mãos, brotando da profundidade do Illinois em jorros fundidos de tradição e modernidade e que um toque de psicadelismo encosta num estilo muito próprio e diferenciador. À aptidão, que se espera de longa e duração, faltará somar uma canção portuguesa ou sobre Portugal, prometida e ensaiada, naquilo que poderá ser só mais uma das pérolas de um cancioneiro plural e excepcional - que tal chamar-lhe "Fish Tray"? Ryley é fixe!

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

DUETOS IMPROVÁVEIS #295

FAYE WEBSTER & JULIA JACKLIN 
Good Guy (Jacklin) 
Ao vivo no pub The Gem, Collingwood, Austrália,
Setembro de 2024

ED HARCOURT, MAIS E MAIS MAGNÍFICO!





















Uma edição especial do álbum "El Magnífico" de Ed Harcourt editado no final de Março continha um sete polegadas de vinil que só alguns ouviram. A rodela acrescentava uma brilhante versão de "Song to the Siren" de Tim Buckley e o original (?) "Let's Run Away From Ot All" às onze canções do disco e que podem ser devidamente apreciadas digitalmente a partir de hoje. Magnífico a dobrar!