quinta-feira, 28 de abril de 2022

WILCO, LAVOR E TRABALHO!





















Já não é para nós surpresa abrir a caixa de correio electrónico e deparar com uma mensagem de título New Wilco Album! Tem sido assim, de forma natural e inesperada, que na última década o sexteto de Chicago tem marcado e vincado a força do seu trabalho imediatamente validado por aficionados, ainda e sempre, sedentos de melodias. Hoje foi mais um desses dias. 

No final de Maio, então, lá chegará o décimo segundo disco de estúdio, o que neste caso é literalmente verdade já que o resultado contido em "Cruel Country" é fruto de esforço colectivo e presencial simultâneo no The Loft, um género de oficina própria de canções em revisão e afinação permanente que já não assistia a tamanha azáfama desde o registo de "The Whole Love" de 2011. 

Trata-se de um duplo álbum de vinte e um temas a ser estreados ao vivo no Festival Solid Sound que a banda tem por hábito organizar ao longo de três dias em North Adams, Massachusetts, a coincidir com a data de lançamento mas que, certamente, se estenderá à restante digressão com datas europeias logo em Junho. 

Como sugere a imagem de capa, um primeiro e cruel lavor bordado por Tweedy e rendilhado à maneira pela restante comunidade chama-se "Falling Apart (Right Now)" e não engana...

JENS LEKMAN, ESCAVAÇÕES SONORAS!





















A longevidade artística do sueco Jens Lekman alcançou já a vintena de anos e, por isso, há lá para trás no tempo canções que devem merecer expedição sonora em jeito de escavação metódica de forma a lembrar qualidades intactas ainda modernas que por aqui descobrimos num antanho longínquo. A programação aprovada contempla a reedição com títulos modificados dos dois primeiros álbuns com adição de inúmeras valias que assentam na reinterpretação da totalidade dos temas e novas melodias até agora inéditas. 

Temos, assim, "The Cherry Trees Are Still In Blossom" que retoma o disco "Oh You're So Silent" de 2005 e "The Linden Trees Are Still In Blossom" referente a "Night Falls Over Kortedala" de 2007, ambos com retoques no desenho de capa e edição física prevista para Junho pela Secretely Canadian. O conjunto atinge a quarentena de canções como, por exemplo, a magnífica "Maple Leaves" que recebeu video pleno de imagens captadas em 2003 pelo próprio e pela amiga e também cantora Lisa Nilsson. Do velho se faz novo...

quarta-feira, 27 de abril de 2022

(RE)VISTO #96





















BILLIE 
de James Erskine. Reino Unido; 2019 
TV Cine Edition, Portugal, (arquivo)
Há quase sempre na aura de músicos e cantores lendários uma pequena abertura por onde, mais cedo ou mais tarde, sairá um vapor escuro pronto a surpreender a opinião pública. No caso de Billie Holiday, unanimemente considerada uma das melhores vozes do século XX, a amargura foi desde cedo comentada e vasculhada sem, contudo, se entender e perceber a dimensão íntima dessa tragédia que uma vida curta (1915-1959) esconderia até ao limite.       

Durante os anos setenta a jornalista americana Linda Lipnack Kuehl procedeu à gravação de mais de duzentas horas de entrevistas com pessoas que tinham convivido com Holiday, desde músicos, amigos, familiares ou até amantes com o objectivo de escrever e publicar uma biografia que, tragicamente, nunca chegaria a terminar. O realizador James Erskine teve acesso a esse manancial audio de cassetes e fitas e juntou-lhe imagens de arquivo alusivas ou de circunstância em formato de documentário onde se revela uma nova e surpreendente dimensão da mulher e da artista de Filadélfia.

O destino da jovem Eleanora parecia condenado à desgraça imposta por uma América defeituosa na segregação e racismo, limitando acessos e direitos, o que cedo levou ao seu resvalo para a prostituição e o vício do haxixe que, apesar de legal, acelerou problemas e azedumes. Mas havia uma voz, única e inconfundível, que lhe permitiu seduzir homens e mulheres sem freio e que o mundo do jazz aprendeu a respeitar em ligações sucessivas a outras estrelas como Artie Shaw, Jimmy Rowles, Lester Young ou Count Basie que lhe chamou, para todo o sempre, Lady Day. O rodopio ao vivo onde se juntavam intérpretes brancos e negros irritava donos de hotéis, de bares ou de locais de concertos e confundia uma artista em ascensão, calada na sua revolta que aditivos mais duros e consequentes corroíam sem remédio. 

O icónico "Strange Fruit", escrito pela própria, serviria como grito explícito contra o racismo colado na sua pele, somando admiração e até veneração mas despertando cercos de vigilância policial e jurídica que o filme acentua de forma intencional, polémica que deu azo a película ficcional que o mesmo canal estreou em Fevereiro e que tem repetição, agora complementar, agendada para breve. A canção passou a ser obrigatória em qualquer espectáculo, mesmo que raros e com uma Lady Day cada vez mais magra e chagada por casamentos violentos a tocar o masoquismo, períodos solitários de prisão e dependência crescente e perigosa de drogas duras. 

O descontrole evidente entra olhos dentro num grau de tristeza e desgosto que nos fere sem dó e, como cantado, sem explicação para tal vida de sofrimento. A misteriosa morte de Linda Lipnack que o filme insinua, sem cumprir o seu desígnio obsessivo, só serve para agudizar dúvidas enterradas numa teia de silêncios que este excelente documento deve reclamar, com mérito, ter em definitivo começado a desfazer...


 

PATRICK WATSON, SOMBRA ILUMINADA!





















Apesar da pandemia, os últimos anos foram para a canadiano Patrick Watson uma roda viva de trabalho. Depois do álbum "Wave" de 2019, houve tempo para compor mais um punhado de temas, contando-se entre eles "A Mermaid in Lisbon" ao lado de Teresa Salgueiro, parcialmente registado na capital nos Estúdios Atlântico Blue, ou para espectáculos de gala com a BBC Orchestra no Barbican de Londres. Chega agora nova maravilha. 

No álbum "Better In The Shade" o agora quarentão acentua uma maturidade artística sedutora que teve inspirações literárias em Virginia Wolf, Denis Johnson e Samanta Schweblin, de onde foi retirando pensamentos transformados em letras para as sete novas canções agora polvilhadas de mais sonoridades electrónicas a lembrar tendências do passado inicial. Há um género de dueto com a amiga Ariel Engle aka La Force em "Height of the Feeling" mas foi com "Blue" que a sombra nos iluminou ainda mais...



terça-feira, 26 de abril de 2022

UAUU #641

DAMIEN JURADO, DISCO DEZOITO!















Os sinais emitidos o mês passado faziam prever um novo disco de Damien Jurado que agora se anuncia para 24 de Junho próximo. Trata-se do décimo oitavo trabalho em nome próprio e nele estão incluídos doze novos temas de elevado calibre cinemático e cuja auto-produção, com a ajuda de Josh Gordon em diversos instrumentos, se evidencia contagiante sob o título de "Reggae Film Star". 

Deixamos "Taped In Front Of A Live Studio Audience" como teste definitivo que se junta aos anteriores "Roger" e "What Happened To The Class Of '65?". Ficámos à espera de nova experiência presencial e a cores... 

segunda-feira, 25 de abril de 2022

SINGLES #52





















SARL - S.A.R.L. LDA 
De Como A Canção Social Tem Uma Função Capital... Quer Dizer.../
Funchal, 23 
Portugal: Movieplay SP 20.147, 45rpm, 1974 (?) 
Nestes tempos de incerteza e mágoa talvez um pouco de humor, mesmo que inofensivo, sirva de consolação. O deste pequeno disco é algo datado mas mantêm uma actualidade fresca atendendo à realidade política da Europa e fora dela, gozando com os chamados vira-casacas e com o canto de intervenção do pós-25 de Abril num jogo de leve anarquia e subversão. 

Sobre os SARL há pouca informação concreta, exceptuando as incluídas na Discogs onde o single se vende barato. Aí se diz: 

"O mistério só foi desvendado em 1999. 
O autor da canção [Funchal, 23] é José Niza que a compôs em casa de Daniel Proença de Carvalho ao ler no "Diário de Lisboa" a notícia da partida do Funchal para o Brasil no dia 23 de Maio (daí o título) de Moreira Baptista e Silva Cunha (ministros da ditadura deposta). 
José Niza limitou-se a musicar o texto da notícia. 
Dias depois, José Niza, Daniel Proença de Carvalho, Carlos Perez Álvaro, então director da Movieplay, Rui Ressurreição, Thilo Krasmann e José Manuel Pedrosa gravaram "Funchal, 23" e "De Como A Canção Social Tem Uma Função Capital... Quer Dizer..." no estúdio da Musicorde.

A sigla SARL significa Sociedade Artística e Recreativa Lusitana e teve continuidade, nomeadamente, com "Uma Canção Comercial" concorrente em 1979 ao Festival da Canção e onde se confirma, pelo video disponível, a presença do cantor Samuel, de Carlos Alberto Moniz e do futuro maestro Pedro Osório, autor dos temas de dois outros singles dos SARL já nos anos oitenta

Nota ainda para a contracapa da rodela que acima se reproduz onde as designações de lado A e lado B são substituídas por face Esquerda e face Direita e se alude ao "buraco" do centro de forma iminente e política. Talvez o agora reformado advogado Daniel Proença de Carvalho, que publicou por estes dias uma biografia em jeito de memórias, tenha tido tempo para aí tecer mais esclarecimentos e explicações... divertidas!


domingo, 24 de abril de 2022

FAZ HOJE (17) ANOS #73





















JOAN AS POLICE WOMAN + RUFUS WAINWRIGHT, Coliseu dos Recreios, Lisboa, 24 de Abril de 2005; Coliseu do Porto, 25 de Abril de 2005
. A Capital, por Ana Garcia Martis, fotografia de Pedro Lopes, 26 de Abril de 2005, p. 39 
. Diário de Notícias, por Nuno Galopim, fotografia de Pedro Saraiva, 26 de Abril de 2005, p.39  
. O Comércio do Porto, por Rodrigo Affreixo, fotografia de Pedro Granadeiro, 27 de Abril de 2005, p. 46 


sábado, 23 de abril de 2022

RECORD STORE PRAY 2022!

Hoje já será possível visitar e vascuhar presencialmente e sem máscara em lojas de discos aderentes ao habitual Record Store Day! Da lista, sempre massiva mas, ainda assim, decepcionante, vamos esperar que a azáfama e nervosismo assentem para tentar acertar na mouche nestes most wanted...

sexta-feira, 22 de abril de 2022

PAUL BUCHANAN, TESOURO COM DEZ ANOS!

 




















O estreia a solo de Paul Buchanan, o senhor Blue Nile, com o disco "Mid Air" fará em Maio uma década e o tesouro terá em breve um excelente aumento. A britânica Newsroom Records, casa editora fundada pelo próprio, lançará em Julho uma versão em duplo vinil que contempla, pela primeira vez, a disponibilização de uma série de bónus saídos somente em CD a que se acrescentará um livro de vinte páginas com as letras originais. 

Se forem rápidos na encomenda, poderão receber uma prova oficial da imagem de capa devidamente assinada e datada mas, se não tiverem sorte, a simples posse de tamanho disco com doze grandes canções, melhoradas na pureza por Calum Malcom no início do ano, bastará para que o vosso grau de satisfação seja exponencial!

WILCO, TESOURO COM VINTE ANOS!





















O clássico álbum "Yankee Hotel Foxtrot" dos amados Wilco faz este mês de Abril vinte anos! Foram, por isso, marcados quatro datas em Nova Iorque e duas na natalícia Chicago para réplica fiel em cima do palco de tamanha obra prima, momentos já mais que partilhados pelos fãs à vontade do freguês

Mas a comemoração ultrapassa a simples apresentação ao vivo já que a reedição projectada contempla oito edições diferentes que na opção super-luxuosa ganha contornos de verdadeira baú-tesouro de onze rodelas de vinil ao alcance por mais de duzentos e trinta euros (mesmo assim, parte já está esgotada)! Lá pelo meio há oitenta e duas canções ou instrumentais completamente inéditos para além das habituais fotografias, entrevistas e memorabilia em doses generosas, tudo com novo design e revestimento para sair em Setembro. 

A banda apresentou-se há dias no programa "Late Show with Stephen Colbert" da CBS americana onde teve como convidado o Aizuri Quartet na interpretação de "Poor Places", uma das canções-pérola retirada do tesouro inicial. Maravilha!

DUETOS IMPROVÁVEIS #258

BATTS & SHARON VAN ETTEN 
Blue (Batt) 
I Feel Fine Records, Austrália, Abril de 2022

quinta-feira, 21 de abril de 2022

S. CAREY DE SECRETÁRIA (CASA)!

RODRIGO AMARANTE, Casa da Música, Porto, 18 de Abril de 2022

          Foto de Vera Marmelo/Ritmos e Batidas (Lisboa, 19 Abril 2022)














O regresso de Rodrigo Amarante ao Porto, cidade onde tem por hábito espalhar felicidade e poesia de tempos em tempos, apanhou a sala da Casa da Música estranhamente sossegada, um rigor que levou o músico brasileiro a tentar quebrar a camada fina de gelo com risadinhas entre canções que tiveram como resposta outras risadinhas do público... 

O nervosismo, reconhecido mas gratificante ao confirmar a plenitude esgotada da plateia, haveria de evaporar-se entre a bruma de fumo desnecessário a cada canção apresentada, selecção feita de forma natural entre as que gravou para o álbum "Drama" e de que "I Can't Wait", "Maré", "Tao", "Tango" e, principalmente, "Tara", foram exemplares perfeitos de um jeito muito próprio de nos encolher o coração pela delicadeza de tamanha beleza tropical. Claro que não faltaram já clássicos como "Irene" ou "O Cometa" e o indispensável, já no encore, "Tardei" que devia ter motivado coro colectivo mais audível e intenso. 

Antes, e aproveitando a presença de um piano de cauda no palco, Amarante pousou a viola e, ao jeito de um pianista que levanta a labita formal e entrelaça os dedos, sentou-se para o melhor momento da noite e que talvez devesse ter merecido mais insistência - dois temas imensos que bateram mais alto que todos os outros e que teve em "The End", com que termina o novo disco e que serviu para uma primeira despedida, a maior ovação de uma sala, ainda assim, insatisfeita. 

No regresso quase imediato juntou ao pedido de "Tardei" um rebuscado mas saboroso "Pode Ser" que escreveu para a big-band de gafieira Orquestra Imperial, mas ao contrário da noite seguinte em Lisboa, onde teve companhia de Moreno Veloso para um dueto inesperado, o concerto haveria de ficar por ali... sem drama!

quarta-feira, 20 de abril de 2022

ANDREW BIRD, NOVO ÁLBUM!















Em Março a nova canção "Atomized" de Andrew Bird sugeria que novo trabalho de longa duração estava na forja, o que agora se confirma com o álbum "Inside Problems" a editar em Junho. O resultado é o apuramento de um registo ao vivo ao lado do seu quarteto habitual cavado de algum pessimismo e desilusão com o actual estado do mundo, a sua desagregação social ou a decadência do ser. Há já três videos de cromatismo cinzento que, apesar de tudo e longe de um derrotismo, repetem a evidência da vibração da música de imediata sedução. Um problema dos bons!



terça-feira, 19 de abril de 2022

UAUU #640

AROOJ AFTAB, MAGIA EM BRAGA!





















A digressão europeia de Arooj Aftab, uma das maiores perdições aqui da casa, chega a Portugal em Junho com concertos em Lisboa (dia 25, Rock In Rio), Sintra (dia 26, Festival Muscarium) e Braga (dia 28, talvez no Theatro Circo). A menina, agora premiada com o Grammy de Melhor Performance de Música Internacional, apronta-se para fazer magia como esta...

segunda-feira, 18 de abril de 2022

CANDE Y PAULO, Auditório de Espinho, 16 de Abril de 2022

O duo argentino Cande y Paulo, Cande Buasso no contrabaixo e voz e Paulo Carrizo no piano, estrearam em 2021 um álbum homónimo produzido nos E.U.A. por Larry Klein com uma dúzia de versões de clássicos do jazz e do pop-rock, uma viagem sonora onde se misturam décadas e géneros de forma surpreendente e que vai de Cohen a Gershwin, passando por Feist, Neil Young ou Rodrigo Amarante! A passagem única por Portugal teve no Auditório de Espinho o local apropriado e certeiro para o culminar de um périplo europeu atrasado pela pandemia mas que beneficiou de uma projecção pública mais ampla e de sucesso já com direito a concerto de secretária entre multi-elogiadas críticas. 

A recreação vagueou numa intimidade lenta onde vibrou a voz de Cande e os arranjos de teclas de aparente simplicidade e que facilmente se infiltrou num afiar cativante de melancolia e subtileza mas que está ainda longe de se esgotar nas suas potencialidades, virtudes e derivações. A sequência mereceu, desde logo, forte aplauso e aprovação para notória satisfação da dupla que nem mesmo alguma timidez de Cande disfarçou, talvez por cumprir na data mais um ano de vida. Para culminar o serão foi escolhida uma cover em japonês (!) de um original de Meiko Kaji, actriz e cantora que viu esse tema ("Shura no Hana") incluído na banda sonora de "Kill Bill" de Tarantino, surpresa maior de um espectáculo pascal de forte teor de açucar... cande!

sábado, 16 de abril de 2022

(RE)VISTO #95





















STARDUST - O NASCER DE UMA ESTRELA
 
de Gabriel Range. Canadá, Salon Pictures/Wildling Pictures, 2020 
TVCine Top, Portugal, 10 de Abril de 2022 
O universo mítico de David Bowie, que se cristalizou depois da sua morte em 2016, roda quase sempre na vertente iluminada do seu talento e deslumbre embora, como se sabe, tenha havido um lado oposto de negrura e alucinação fundamentais para a sua carreira artística. Ganhar coragem para realizar um filme fictício sobre parte importante e decisiva dessa faceta é, por si só, um acto arriscado e de cotejo imediato com legados familiares ou profissionais estabelecidos. 

As críticas conhecidas a esta biopic parcial são, por isso, maioritariamente de teor negativo e até de rejeição exacerbada. A narrativa construída assenta na rebuscada primeira digressão a solo do músico pelos Estados Unidos em 1971 depois de discos de insucesso e atitudes incómodas a uma indústria musical já aí colada ao negócio fácil e ao lucro imediato. Fama, esse fito do próprio alimentado por promessas e mentiras, é uma miragem que bordeja toda a película de forma a que o espectador, que sabe como tudo vai culminar, seja infiltrado de uma comiseração indigesta a que algumas das personagens ajudam na levedura de forma evidente. A de Angela Bowie e a do promotor americano são o perfeito exemplo desse mal-entendido e ambiguidade, embora a encarnação do próprio Bowie, longe da perfeição, não se afigure assim tão transviada. 

Sofrível é mesmo o recurso a um intervalar de passado e presente que aporta fantasmas da vida em Inglaterra e a esquizofrenia do irmão Terry, outra das personagens equívocas que deveria ter merecido mais cuidado e acutilância pela importância efectiva na forma como Bowie lidou com demónios e trilhou alter-egos como um extraterrestre Ziggy Stardust. De resto, para que o filme falhe, estão lá todos os condimentos nas doses erradas - as drogas, a importância da crítica e boa imprensa e até da fama suspirada que não dispensou sorrateiramente Andy Warhol ou Lou Reed. Anjo ou diabo, como ele próprio cantou, que venha neste caso o diabo para nos fazer esquecer tamanha sonsice...


sexta-feira, 15 de abril de 2022

SESSA, Maus Hábitos, Porto, 12 de Abril de 2022

A sessão ao vivo de Sessa, há muito prometida mas multi-adiada por razões conhecidas, teve casa cheia animada pela presença de muitos brasileiros radicados na cidade mas também de muitos da cidade e arredores radicados na oportunidade imperdível. O guião foi ainda o magnífico álbum "Grandeza" de 2019, com tempo de assimilação e crescimento sustentado, mas o momento serviu para um primeiro teste a algumas das canções do novo "Estrela Acesa" e de que, por exemplo, "Ponta de Faca" e "Irmão de Nuvem" nos parecerem sublimes. 

Para os temas eleitos de ambos os álbuns, Sessa aplicou uma toada de afro-samba muito próprio que a percussão incisiva do baterista e a gentileza da dupla de vozes femininas acentuaram numa onda airosa de tradição mas também de modernidade rítmica. Juntou-se, como se nota em qualquer prévia audição atenta, um jogo linguístico idiossincrático pleno de uma intimidade e uma sexualidade excitantes que muitos soletraram baixinho, deixando que a entoação cantada de Sessa alastrasse na sedução e na beleza do chocalhar esporádico dos colares de conchas agitados pelas parceiras.

No alinhamento couberam ainda duas versões perfeitas dos mestres Cartola ("Acontece", sozinho em palco) e João Donato ("Flor de Maracujá") com que se encerrou um serão calorento que talvez merecesse um espaço mais confortável mas que, mesmo assim, funcionou numa plenitude e partilha saborosas ou não fossem elas fecundadas numa secular e única conexão luso-brasileira. Com este Sessa, a estrela guia dessa amizade continuará bem acesa! 

quinta-feira, 14 de abril de 2022

JOSH ROUSE, EFICÁCIA POP!


















Depois de uma gostosa dose dupla de versões, Josh Rouse terá novo álbum pela Yep Roc Records, casa editora da Carolina do Norte que em Julho fará sair "Going Places", mais um consistente manual de pop em dez lições. Para a eficácia da receita foram feitas, nos dois últimos anos, apresentações informais por vários bares e pequenos espaços nocturnos espanhóis, uma rodagem ao lado dos parceiros de banda que foi depois registada e produzida pelo próprio no estúdio caseiro ao jeito de concerto. 

Não se estranha, por isso, que as canções se adivinhem mais que prontas para que a partilha e comunhão que se respira entre uma plateia e um palco transpareçam como perfeitas para serem tocadas ao vivo. Façam lá o teste a este excitante "Hollow Moon".

quarta-feira, 13 de abril de 2022

THE WEATHER STATION, VERSÕES DE AMIZADE!

Um dos sonhos de Tamara Lindeman aka The Weather Station sempre foi ouvir as suas canções interpretadas por outros artistas. A partir da experiência vertida para o novo álbum de baladas "How Is It That I Should Look At The Stars", foram feitos convites a amigos para realizarem covers de temas desse disco e de que se conhecem, para já, duas maravilhas. 

O também canadiano Luka Kuplowsky tratou de adornar "March" e Joan Shelley, ao lado do marido Nathan Salsburg, ambos presentes no espaço Tranzac de Toronto aquando da apresentação dessas canções inéditas por parte de Tamara há alguns anos atrás, deram tratamento ao ar livre e à chuva a "Endless Time". Em Junho haverá concertos por perto. 


terça-feira, 12 de abril de 2022

NINA NASTASIA FEZ UM DISCO!

















A ausência de Nina Nastasia da vida pública nos últimos doze anos terá, certamente, diversas explicações. Depois do álbum "Outlaster" de 2010, o sexto de originais que a trouxe numa última visita a Guimarães, parou de perseguir a música profissionalmente enquanto se agravavam problemas pessoais que a levaram, nas próprias palavras, à miséria, ao caos, à doença mental e ao isolamento e que uma relação problemática e antiga com um tal Kennan acelerou num descontrolo. A separação, ao fim de vinte cinco anos, foi decidida num dia de Janeiro de 2020 e teve como consequência, no dia seguinte, o suicídio do ex-companheiro para sua dor profunda e triste culpa... 

A reacção, diríamos, natural foi o regresso à composição para o disco "Riderless Horse" onde conta com a ajuda de Steve Albini e Greg Normam, todos reunidos numa casa de amigos em Esopus, Nova Iorque, onde a cumplicidade, a camaradagem e a partilha ajudaram na recuperação e no retomar do gosto pela música. Nina Nastasia fez um disco. Bem-vinda, Nina!

segunda-feira, 11 de abril de 2022

VETIVER, FRAGRÂNCIA DE VERÃO!















Uma dica de amigo mais atento deu-nos conta que Andy Cabic aka Vetiver tem regresso marcado ao Porto a 19 de Julho próximo (M.Ou.Co.) onde termina a digressão europeia depois de passar na véspera pela capital (Musicbox). 

O formato intimista e acústico promete ser em duo de vozes e guitarras, sem que seja conhecido quem o acompanhará, mas ao jeito da memorável parceria com Devendra Banhart que passou por Espinho em 2015, com quem tem, aliás, mantido cumplicidades. Prova-a primeira parte do amigo pelo Porto há dois anos mesmo que a oportunidade de apresentação dos temas do mais recente "Up On High" tenha passado ao lado da maioria barulhenta... Já há bilhetes.

sábado, 9 de abril de 2022

MRS JOAN SHELLEY, FELIZ HARMONIA!





















A vida de Joan Shelley, como a de muitos, mudou significativamente com a chegada do confinamento pandémico. Nem sempre isso significa tempos perdidos ou dramáticos, embora o isolamento físico e os constrangimentos aportem, de forma implícita, algumas agruras mas que o conforto de uma nova vida familiar sobrepôs sorridente - o casamento com Nathan Salsburg, guitarrista e cúmplice de longa data, o nascimento da filha, o retorno à natureza ainda pura que rodeia a casa do Ohio, Kentucky, ao lado dos inseparáveis animais de estimação, são alguns dos motivos e impulsos que, de qualquer forma, alteraram uma rotina cansada de digressões e correrias e afinaram o gosto pelo passado, pelo recato do lar ou pela simples escuta da água do rio a correr. "Like the River Loves the Sea" era o nome do anterior álbum já com perto de três anos... 

Em "The Spur", um novo trabalho produzido por James Elkington que recebeu contribuições de Bill Callahan, de Meg Baird, do escritor Max Porter e do marido Nathan Salsburg e que sairá em Junho, há uma dúzia de temas, tapeçarias como lhe chama, que reflectem esse renovado mundo limpo que a colocou a cantar, em primeira mão, para a família as canções que nunca deixou de compor e que teve nos silêncios e contemplações as brisas harmoniosas que ajudaram sempre o sol a furar as nuvens. Aqui fica uma metáfora em movimento dessa nova felicidade senhoril!

UAUU #639

sábado, 2 de abril de 2022

DUETOS IMPROVÁVEIS #257

SONDRE LERCHE & AURORA 
Alone In The Night (Lerche) 
Álbum "Avatars of Love", Lerche/Mona Records
Abril de 2022

sexta-feira, 1 de abril de 2022

RHYE TAMBÉM NO CLUBE!





















O projecto Rhye, antiga perdição da casa, apresenta-se no dia 28 de Junho próximo (um dia antes dos The Avalanches!) no Hard Club, chegando a Lisboa no dia seguinte. A sofisticação de Mike Milosh não vai desiludir, como nunca o fez, embora a notícia pareça mentira de dia dos enganos... até já há bilhetes

GOSTAR DE SESSA!





















Logo agora que há digressão de Sessa, desta vez, confirmada pelas redondezas (12 de Abril, Maus Hábitos), anuncia-se um novo disco onde cabem doze canções novas, todas registadas pelo próprio com Biel Basile entre Junho e Agosto do ano passado maioritariamente nos Estúdios Grilos em Ilhabela, São Paulo, mas com retoques orquestrais e de mistura em várias paragens técnicas norte-americanas. 

Aos inéditos chamou-lhes "Estrela Acesa", conjunto que receberá bonito desenho de capa a cargo de Joshua Nazario a editar pela Mexican Summer a 24 de Junho e do qual se pode ouvir "Gostar do Mundo", um precedente deleite com video do amigo Gabriel Rolim aka Rollinos registado na amada cidade de Sampa. Acende-se o gosto!