Nick Drake in 1974, Kevin Coyne in 1978, Gaffa in 2022.
A memoir.
de David Belbin. Nottingham, UK; Five Leaves Publications, 2022
A descoberta da música de Nick Drake é um momento marcante e, quase sempre, inesquecível. Bem o sabemos. Em 1974, o jovem estudante inglês David Belbin comprou um vinil barato e, aparentemente, promocional ("white label") com canções de Claire Hammil e dos Sunderland Brothers, nomes manuscritos num dos lados do rótulo central. Do outro, sem indicações ou sinais, só quando em casa o pôs a rodar pode ouvir dois temas de um desconhecido de voz suave e brilhante composição. Não mais descansou até conseguir identificar o autor das líricas enigmáticas e da magia das canções que só mais tarde confirmaria ("Pink Moon" e "Things Behind The Sun"). Sem ainda saber quem era, sabia que lhe seria eternamente devoto.
A demanda coeva por Drake coincidiu com a sua morte nesse mesmo ano, facto de que só se apercebeu posteriormente pela leitura e pesquisa na imprensa da época. A música passou a fazer parte de seu dia a dia, escrevendo para revistas locais, fazendo entrevistas, críticas de concertos ou de discos e nesse frenesim foi dos primeiros a publicar um texto póstumo sobre o malogrado músico e o disco "Pink Moon", o último que Drake editou em vida em 1972, no fanzine Liquorice (Outono de 1975, nº 3) da cidade de Notthingham. O texto original seria incluído nas memórias organizadas pela irmã, Gabrielle Drake. O assunto "Drake" passou a fazer parte das suas cogitações futuras, uma curiosidade que levou até John Martin que, entrevistado por si nesses tempos, recusou dar explicações sobre o amigo falecido ou sobre "Solid Air", tema que escreveu e editou em sua homenagem no álbum homónimo de 1973.
As primeiras trinta páginas destas memórias são, assim, uma prazerosa jornada pelos meandros de uma vida irrequieta e condutora a uma actividade de escritor que se foi acentuando até aos dias de hoje e que tem no papel de editor de uma publicação musical uma tarefa efervescente e empolgante contada na primeira pessoa. Mas há ainda neste pequeno livro muito mais sumo rock & roll...
A parte seguinte afigura-se mais intensa na descrição e na novidade. Com Kevin Coyne (1944-2004) o autor conviveu de perto na presença em concertos, nas conversas de backstage ou na ascensão, mesmo que tímida, da sua carreira e da sua sua onde blues rock de penetração underground. Já como jornalista estabelecido, o gosto e conhecimento sobre os discos, as canções ou as influências de um artista em constante inquietude são expressos de forma emocional e vibrante, críticas e confissões que são verdadeiras manifestações de entusiasmo com naturais altos e baixos, mas que ainda hoje não esfriaram. Basta ouvir este "The World is Full of Fools" para o compreender.
A terceira parte refere-se à banda local Gaffa, um projecto da cidade de Nottingham que apesar da separação em 1980 nunca, verdadeiramente, terminou na sua sonoridade early punk. A amizade e cumplicidade entre os seus membros e o próprio Belbin alcança momentos descritivos de saboroso deleite, percurso contado desde o início em 1977 até à recente reunião do grupo de Junho passado.
Misturando detalhes da sua própria vida, o autor consegue que a leitura das três memórias se afigure de inesperado agrado mesmo para nomes e bandas de que não conhecíamos as circunstâncias e percursos. Meritório, no mínimo.
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