segunda-feira, 22 de abril de 2024

ELEPHANT9, PROG TOP!

















O trio norueguês Elephant9 é um fenómeno tão brutal que merece que aqui se fixem os nomes dos seus três resistentes e lutadores: o (mais que) teclista Stale Storløkken, o baixista Nikolai Hængsle e o baterista Torstein Lofthus. São eles os autores e fazedores de dez álbuns de jazz rock + prog rock + psico + acid rock + "eu sei lá" que tem agora o novo vaivém "Mythical River" em aterragem vindo de uma já antiga órbita circular que se acentua, como convêm, em trajectória progressiva. 

Claro que haverá sempre que os acuse de copiar o que há cinquenta anos se fazia analogicamente e de forma inédita, mas um desiderato instrumental deste calibre acabará sempre por ser imune a comentários e questiúnculas ridículas pois o que se dá a ouvir feito à moda antiga poderá não ser para todos mas todos o deveriam ouvir. 

Tal como no anterior e também aconselhável trabalho "Arrival Of The Elders", o carisma e a exploração sonora brotam outra vez em seis peças de cosmometria e hipnotismo remarcáveis que induzem o ouvinte num futurismo inigualável e viciante. Prog top e de capa, como sempre, geométrica!



SLEATER-KINNEY DE SECRETÁRIA!

sábado, 20 de abril de 2024

LIANNE LA HAVAS, CHARME NO CLUBE!





















É uma das nossas perdições antigas que, infelizmente, ainda não presenciamos ao vivo. A lacuna tem os dias contados até Julho, mês em que Lianne La Havas marcou duas datas em Lisboa e Porto (16 de Julho, Hard Club) para espalhar encantamento e muito charme. Já há bilhetes.

AROOJ AFTAB, MARCA DE PERFUME!





















Para Arooj Aftab imaginar um digno sucessor do monumental álbum "Vulture Prince" de 2021 não se afigura tarefa facilitada. Certo é que ele já tem nome ("Night Reign"), data (31 de Maio), selo (Verve Records) e anúncio ("Raat Ki Rani"), o primeiro single que conta com video a cargo da actriz, e também cantora, Tessa Thompson. 

No regresso aos originais não faltam diversas ajudas amigas como a da guitarra de Kaki King e do piano de Vijay Iyer, parceiro no álbum "Love in Exile", ao lado de Shahzad Ismaily, editado o ano passado. Mantêm-se a magia do canto em urdu, língua paquistanesa e indiana de maravilhoso hipnotismo, mas há desta vez três peças em inglês. O perfume, esse, continua intenso, aceitando-se encomendas, mais uma vez, exclusivas e prateadas a partir de hoje

ANDREW BIRD, TRIO JAZZ!

Faltava a Andrew Bird um experiência jazz, isto é, uma investida cooperativa em alguns standards ao lado do baterista Ted Poor e do baixista Alan Hampton. O trio reuniu-se na Califórnia, mais concretamente no Valentine Recording Studio, para ensaiar e registar temas de Chet Baker ("I Fell In Love To Easily"), Duke Ellington ("Caravan"), Rex Harrison ("I've Grown Accustomed To Her Face", tema popularizado por Nat King Cole), Cole Porter ("You’d Be So Nice to Come Home To") e outros de inspiração nostálgica retirados do chamado "Great American Songbook". 

O resultado final é "Sunday Morning Put-On" que sai a 24 de Maio pela Lomo Vista Rcordings, no qual o saxofone é substituído pelo violino e a voz tão característica de Bird. O disco tem ainda contribuições de Jeff Parker na guitarra e Larry Goldings no piano e encerra com "Ballon de peut-être", o único original entre as dez versões. Está a partir de hoje, Record Store Day, em pré-encomenda exclusiva em vinil translúcido avermelhado.



quinta-feira, 18 de abril de 2024

RECORD STORE PRAY 2024!

Da imensidão de edições exclusivas prevista para o próximo sábado, dia das chamadas lojas de discos, retiramos da lista uma simples mão cheia de sete polegadas interessantes. O RSD - Record Store Day é, pois, cada vez mais uma (des)ilusão abusiva e... cara!
    

 

quarta-feira, 17 de abril de 2024

JAKE XERXES FUSSELL, TRADIÇÃO REINVENTADA!












O nome Jake Xerxes Fussell pode até ser nada fácil de pronunciar mas o norte-americano é mesmo um caso de imediato reconhecimento sempre que uma das suas canções se dá a ouvir. A onda folk e blues que aplica à maioria delas tem acento numa tradição Southern que ganhou, no nosso caso, expressão de vício com "Good and Green Again", um dos melhores discos de 2022. Temos a sensação que outra maravilha se aproxima sem contemplações... 

A certeza têm como fonte confirmada o tema "Going to Georgia", um tradicional americano que Fussell aprendeu em várias versões e variações e que decidiu registar à sua maneira para o álbum de regresso "When I'm Called" agendado para Julho e que marcará a estreia na Fat Possum Records. Coincidência, o músico guitarrista nasceu em Columbus, Georgia, em 1981, residindo agora em Durham, Carolina do Norte. 

No novo trabalho reúnem-se uma série de colaborações amigas como, entre outras, a de Blake Mills que toca guitarra em "Going to Georgia" e ainda em outros dois temas ("Cuckoo" e "Gone to Hilo") e a de Joan Shelley que empresta a voz no referido "Cuckoo". O acento é mesmo uma revisitação à música tradicional com produção de James Elkington, o mesmo do anterior "Good and Green Again", numa jornada que promete, por si só, uma admirável reinvenção, embebida desde jovem, da música tradicional americana. 

UAUU #716

terça-feira, 16 de abril de 2024

BELLE & SEBASTIAN, DOENÇA DAS CANÇÕES!

Os Belle & Sebastian estão a falhar - ainda não há notícias de um novo álbum em 2024, o que fecharia o triângulo começado em 2022 com "A Bit of Previous" e que foi logo continuado com "Late Devellopers" em 2023. Mas já há sinais. 

Saiu hoje o novo single "What Happened To You, Son?" como presente cortês pelo início da digressão pela América do Norte que terá início para a semana e se alongará até ao final de Maio, tournée que só agora se concretizará depois do adiamento motivado por doença do vocalista Stuart Murdoch. Por lá e na abertura dos vinte e um concertos previstos, terão a companhia recomendada de The Weather Station e Haley Heynderickx. 

A nova canção conta a história de um fã obsessivo dos seus ídolos musicais, uma inspiração biográfica na juventude de Stuart Murdoch situada em muitas bandas dos anos 80, mania que o próprio admite agora não ter sido nada salutar, atendendo a que muitos delas acabaram por mudar no estilo e na atitude inicial de humildade. 

Atendendo a que Murdoch publicará em Setembro a sua estreia em forma de romance com o título de "Nobody's Empre" através da editora Faber, talvez aí se encontrem razões mais que suficientes para a composição de outros inéditos. O enredo do livro, em formato de memória e ficção, vagueia entre Glasgow e a Califórnia e situa-se nos primeiros anos dos anos 90, onde o personagem principal se tenta reinventar depois de uma hospitalização motivada pelo síndroma de fadiga crónica. 

Murdoch confessou, a este propósito, que anda há anos a cantar sobre o assunto, já que enquanto frequentava a universidade contraiu precisamente esta doença medicamente designada por encefalomielite miálgica. Também o filme "God Help the Girl", que realizou em 2014 inspirado pelo álbum/banda com o mesmo nome (2009), faz uma abordagem ao mesmo tema, em que a protagonista Eve é vítima da doença que a mantém no hospital, começando, então, a compor canções como passatempo e a sonhar com a formação de uma banda...

sábado, 13 de abril de 2024

(RE)LIDO #122





















SANTA-BÁRBARA CAPISTA DE ZECA
 
de Abel Soares Rosa. Lisboa; Lusitanian, 2023 
O desenho de capas para discos é um assunto sério. Em Portugal, esta atenção implícita à concepção de um todo imagem-música, que há muito se entende como sinérgico, foi desprezada na importância e demorou a ser assumida como essência de um negócio. Mereceria, por isso, maior pesquisa científica que um atento design de comunicação académico deveria incentivar e que tem conhecido, ainda assim, algumas tentativas esparsas e ténues mas bem meritórias. Este livro de Abel Rosa é, por isso, um bom exemplo de como o tal assunto se pode revelar despertador na raridade, motivador na novidade e especialmente oportuno e seminal no caso escolhido. 

Entre o "capista" José Santa-Bárbara e o músico José Afonso existiu uma cumplicidade política que a amizade transformou numa relação artística duradoira. Ambos tiveram problemas sérios com a PIDE, processos que no caso do "capista" o autor Abel Rosa consultou na Torre do Tombo como forma de provar que a luta contra a ditadura abraçou, de forma solidária, esta parceria numa demanda imaginativa e irreverente - a concepção de nove capas para álbuns de José Afonso datadas entre 1971 e 1983. 

A inspiração, quando questionada pelo "capista" junto do cantor, obteve sempre a mesma resposta: "Lê os poemas!". Foi o que Santa-Bárbara fez de todas as vezes, o que não dispensou, também, a leitura dos textos escritos por Urbano José Rodrigues ou por Bernardo Santareno para contextualizar as canções. De todas as vezes foi a partir deles que as imagens e arranjos escolhidos acabaram aprovados pelo amigo Zeca na sua acepção metafórica e figurada quanto aos tempos que se viviam ou que se adivinhavam invertidos na utopia. 

Uma pomba da paz, uma toupeira, um comboio fumarento rumo ao futuro, umas mãos que trabalham, umas fotografias do amigo tipo passe ou um planador/voador em queda, são alguns dos motivos, adereços, bonecos, ilustrações que depois de trabalhadas se estendem em maquetas, colagens ou sobreposições de um mestre intuitivo na percepção principal da mensagem que a capa do disco assumiria como imagem primeira. Constatar e descobrir as suas fontes bibliográficas em dicionários, revistas ou outras publicações, revelam a perspicácia metódica que Santa-Bárbara manteve desperta e viva, recurso de aparente lógica e conselho mas que só uma imaginação fértil aprimorou a partir dos desafios sugeridos e das oportunidades criadas.  

Antes e depois da censura, antes e depois da liberdade, as revelações que por aqui se dão a conhecer confirmam que José Afonso estava bem ciente desse impacto junto dos compradores ouvintes, nada mais nada menos, que os destinatários de um esforço artístico por vezes exaustivo mas de ferrenha militância. Ao seu lado, Santa Bárbara, o tal "capista de Zeca" numa expressão do jornalista e poeta Fernando Assis Pacheco de 1972, não foi mais que o companheiro certo e completo para realizar e concretizar, mais que uma história bonita, um notável e icónico capítulo da história do design português ainda e sempre inspirador. 

Ver, também no livro, a terminar, a forma educada e eficaz como João Morais (o também músico O Gajo) criou capas recentes para uma série de singles-digitais de José Afonso a partir de todas estas capas de Santa-Bárbara, só confirma o que de mais simples e constante elas representam no fascínio - verdadeiras obras de arte, vejam bem!     



NO SUBCONSCIENTE DE KEATON HENSON!





















No dia 15 de Março surgiu misteriosamente uma nova composição de Keaton Henson chamada "Tokyo Laundry". A data escolhida coincidiu com o World Sleep Day 2024, uma celebração que pretende chamar a atenção para a importância do sono e do descanso da mente e do corpo, sendo a faixa, afinal, parte de "Somnambulant Cycles", um disco instrumental que explora o subconsciente humano e que foi escrito para criar uma "sensação de calma fisiologicamente fértil, a calma de onde vêm as ideias, onde as emoções são sentidas mas passam como os peões". 

Junta-se agora uma outra peça imersiva - "Try" recebeu a contribuição do norueguês Daniel Herskedal, um jovem tocador de tuba jazzística que se junta no álbum a outros especialistas na arte de entender o som e a sua vulnerabilidade. O tema tem video registado durante uma madrugada na costa da Inglaterra através de um autocarro vazio que percorre paisagens áridas e surreais enquanto o mundo ainda dorme. A intenção é, outra vez, permitir ao espectador ter um momento de quietude e paz. Bem que precisamos!


sexta-feira, 12 de abril de 2024

KAMASI WASHINGTON, APELO À DANÇA!





















Sobre o regresso de Kamasi Washington aos longa-duração pairava uma certeza - seria em grande! O tema "The Garden Path" que o anunciava há já mais de dois anos, um acto de resistência e luz em plena pandemia e onda negacionista, não deixava dúvidas quanto ao fulgor e desiderato de um expoente moderno do jazz e para o qual, se sabe agora, se rodeou de múltiplas ajudas e conexões como Thundercat, George Clinton, Terrace Martin, Patrice Quinn ou André 3000. 

Em "Fearlees Moment", assim se chama o disco a publicar no inicio de Maio, transborda um apelo à dança como expressão espiritual e onde o movimento do corpo é simplesmente uma reacção diferenciada pelo ritmo. Podemos testá-lo em duas das novas peças: de forma lenta em "Dream State", tema onde confessa a total improvisação e flutuação dos instrumentos como a flauta de Andre 3000 e que tem video da autoria da irmã Aubrinae Washington e participação da dançarina e modelo Zenmarah; de forma agitada em "Prologue", uma pedra arrebatadora de oito minutos que encerra o álbum e que eleva a dança a um frenético alvoroço libertador. Um ritual, por isso, que queremos muito repetir na dose... 


BETH GIBBONS, CANÇÕES DE MEIA-IDADE!





















A estreia a solo de Beth Gibbons, a incontornável voz dos saudosos Portished, está marcada para 17 de Maio, dia da edição de "Lives Outgrown" pela Domino Records inglesa. A produção das dez novas canções, em parceria, junta James Ford a Lee Harris dos Talk Talk e concretiza uma composição que amadureceu ao longo de dez anos sobre muitas despedidas e desenlaces, multiplicando meditações à volta da ansiedade, da maternidade e da inevitável mortalidade. Um envelhecimento natural mas, mesmo assim, triste que demorou a ultrapassar. 

Distante da folk e jazz do disco de há vinte anos e dois anos "Out Of Season" ao lado Paul Webb aka Rustin Man, outro Talk Talk, o caminho aponta agora um notório experimentalismo e arrojo que se distinguem nos dois primeiros temas conhecidos. Os respectivos videos refelectem uma largueza e interactividade visual a que não é estranha a colaboração com Weirdcore, parceiro de Aphex Twin, para "Reching Out" e Tony Oursler, artista multimédia responsável pelas imagens de "Floating a Moment", o primeiro single saído em Fevereiro, e autor do video para "Where Are We Now?" de David Bowie em 2013.

O resultado de tudo isto merece óbvia atenção e redobrada audição, o que aumenta a expectativa quanto ao álbum de uma artista agora motivada e determinada na bravura de uma meia-idade. Gibbons tem presença confirmada no Primavera Sound Barcelona (30 de Maio) e, atendendo à legião, lá está, de meia-idade que por cá que a venera, não deverá tardar a confirmação de oportunidades ao vivo para o esperado reencontro. 


terça-feira, 9 de abril de 2024

CHILLY GONZALES, COISA SÉRIA!

Não foram já poucas as vezes que por aqui destacamos o génio do canadiano Chilly Gonzales em facetas, ora inesperadas ora satíricas, que já disseram respeito a rap orquestral, livros sobre Enya, fofuras de Natal ou discos em francês! Uma verdadeira caderneta que o cromo principal vai preenchendo ao sabor de um talento e irreverência de indiscutível pertinência. Chega (cruzes!) agora mais um avanço, embora desta vez a causa seja bastante polémica e arriscada. 

É conhecido o antisemitismo do alemão Richard Wagner (Leipzig, 1813/Veneza, 1883), compositor que foi eleito pelo nazismo como um exemplo de superioridade da música e do intelecto alemão. A viúva do seu filho Siegfried, Winifred Wagner, era assumidamente nazi e foi amiga de Adolf Hitler, pagando com a prisão, no pós-guerra, a posição adoptada. Ainda hoje este é um assunto de extremos recorrentes que motiva pesquisa, polémica e actualizações... 

Gonzales, contudo, não faz a coisa por menos - publicou um novo single chamado "F*** Wagner", um retorno a um género de rap de intervenção onde não faltam alusões e acusações. Na letra explícita pode ouvir-se, por exemplo: 

"F*** Richard Wagner/What a motherfucking monster
(...)
F*** his fab club and his converts/They're not welcome at my concerts/
Harder, faster, better, stronger/Kanye West is the brand new Wagner 
(...)
So can the artist and the art ever be separated?/ It’s hard to boycott something that you love/ But it’s easy if you hate it 
(...) 
Like if I never hear Richard Wagner again/ I know I wouldn’t miss him/ But I still bang that R. Kelly remix to "Ignition"" 

Recorda-se que o rapper americano R. Kelly está a cumprir uma pena de prisão por pornografia infantil, extorsão e, suposto, tráfico sexual.

Não contente e desafiador, Gonzales lançou em simultâneo uma petição para substituir o nome de Richard Wagner por Tina Turner de uma praça de Colónia, Alemanha, acompanhada por uma carta dirigida ao presidente da Câmara local. Turner habitou em Colónia durante nove anos, acabando por falecer na Suiça em Maio do ano passado. Gonzales foi (é?) também habitante da cidade. 

A intenção e a canção foram já formalmente apresentadas no programa Magazin Royale do canal alemão ZDF. Para ler e reflectir, sem ironias, aqui.    


 

A polémica e embirração, no caso de Gonzalez, são já antigas como se pode comprovar por este video de 2015 aquando da sua presença no mesmo programa televisivo, não sendo inocente o retorno ao assunto num momento em que na Europa os movimentos nazis se agigantam perigosamente.

segunda-feira, 8 de abril de 2024

UAUU #715

BONNY LIGHT HORSEMAN, EM GRANDE!





















O trio maravilha Bonny Light Horseman pode até ter mudado de editora mas não mudou de estilo, por sinal, um bom estilo de qualidade como o provam os primeiros dois temas já conhecidos de um terceiro disco de originais. Chama-se "Keep Me On Your Mind/See You Free", um duplo álbum de vinte canções que marca a estreia na Jagjaguwar no início do próximo mês de Junho e que promete constituir-se como uma ode moderna ao mundo de incertezas e convulsões em que vivemos e viveremos. 

O trabalho de composição e gravação decorreu em cinco meses de 2023 tendo como centro de partida a pequena povoação irlandesa de Ballydehob em Cork e, principalmente, o centenário pub Levis Corne House onde Anaïs Mitchell, Eric D. Johnson e Josh Kaufman se instalaram com outros colaboradores (o baterista JT Bates, o baixista Cameron Ralston e o engenheiro de som Bella Blasko) para, em ambiente quase familiar, criarem a base principal do projecto. 

O espaço, apesar de pequeno, foi fundamental para encorpar um espírito fraterno e autêntico que se pode verificar no video de "When I Was Younger" (vide abaixo), tudo sob olhar fixo de um quadro pendurado numa das paredes que acabou por ser escolhido para a imagem de capa trabalhada pelo artista Tom Campbell. Sem o saberem, o nome que a esposa do dono do pub tinha dado aquela mulher era... Bonnie! 

O álbum teve, depois, aprumo no Dreamland Recording Studios de Nova Iorque, local onde a banda também finalizou os dois trabalhos anteriores e onde Annie Nero se apresentou para acrescentar vozes e retoques de contrabaixo a algumas das canções de um disco grande e, certamente, um grande disco!


sábado, 6 de abril de 2024

(RE)LIDO #121





















ZECA SEMPRE
 
Vários autores. Porto; Memória/Arca das Letras, 2006 
Em mês comemorativo dos cinquenta anos da Revolução de Abril, tentaremos em quatro semanas falar sobre ela através de uma das suas figuras mais evidentes e descomprometidas - José Afonso! Têm sido muitos os livros saídos sobre o músico de Aveiro mas não pretendemos ser exaustivos e apressados ao seu acesso e leitura, até porque há uma infindável colecção que ficou para trás na análise e injusto esquecimento apesar de, por aqui, já termos trazido publicações a ele alusivas. Nunca serão, no entanto, demais. 

É o caso desta recolha de histórias e tributos já de 2006, pequeno volume que pretendia antecipar os vinte anos sobre a sua morte, convidando um pouco mais de vinte pessoas a dar o seu testemunho referente ao músico, ao cantor ou, simplesmente, ao amigo. Alguns nunca sequer lhe falaram, outros viajaram e conviveram com ele, muitos partilharam palcos e estúdios, poucos ou nenhuns acederam à sua intimidade. Destacam-se, mesmo assim, os textos ou poemas de Manuel Alegre, Francisco Fanhais, José Mário Branco ou Pedro Barroso e dos jornalistas nortenhos Francisco Duarte Mangas, César Príncipe, Jorge Ribeiro ou José Viale Moutinho. São destes dois últimos duas das mais sumarentas histórias que o livro aporta e que valem a pena recontar pela curiosidade e significado mas que não disfarçam, no conjunto, um notório desnível de interesse e novidade de uma edição, ainda assim, meritória. 

Dois meses depois da sua morte, em 24 de Maio de 1987, a Galiza promoveu uma homenagem a José Afonso. O repórter Jorge Ribeiro, ao serviço de um diário da Invicta, insistiu na deslocação a Vigo, tentou que agenda do jornal não o esquecesse mas acabou, por iniciativa e viatura própria e sem repórter fotográfico, a viajar nesse sábado até lá sem certeza do tamanho do espaço disponível para o artigo ou sequer que ele seria publicado. O que viu e ouviu foi relatado somente quatro dias depois como "um exclusivo" da publicação, aqui reproduzido na totalidade, já que mais nenhum orgão de comunicação social luso esteve representado! A "coisa", afinal, foi em grande (transmissão televisiva, radiofónica, conferências, espectáculos de rua, etc.), sentida e participada e uma confirmação clara da importância e afecto que a região espanhola sempre dedicou a José Afonso, carinho que já devia ter merecido a edição de um ou mais bons livros de memórias e contextos e até a realização de documentários televisivos ou cinematográficos que recuperassem imagens, sons e demais inéditos sobre uma ligação "familiar" de raízes bem mais antigas - Galiza Homenageou Zeca "Como se fora seu filho" foi o título do artigo! 

Dez anos antes, José Afonso participou no VII Festival Internacional da Canção Popular do Rio de Janeiro depois de ter recolhido quinze mil votos de leitores do "Diário de Lisboa"! Na comitiva portuguesa viajou o jornalista José Viale Moutinho que conta as peripécias de uma participação condicionada, "inclinada", onde se referem outros figurões como Moustaki, Demis Roussos ou Gilberto Gil. Coutinho conta como a DOPS (a PIDE brasileira da altura, já que o país ainda viveria em ditadura até 1985) se infiltrou no "controlo" e de como, numa mesa de piscina do Copacabana Palace, deu de caras com José Afonso em amena cavaqueira com um tal coronel Chadek da referida polícia, agente que se tinha apresentado de véspera ao jornalista mas que o músico desconhecia, naturalmente, por completo! Imaginar esta cena "tropical" é quase comédia negra a que se poderá acrescentar o que terá sido a apresentação efectiva da canção "A Morte Saiu à Rua" somente acompanhada por dois violões e uma leve percussão num Maracanãzinho cheio e propositadamente "barulhento" depois de muitos ensaios infernais e agitados num quarto de hotel... A transmissão televisiva desta participação foi realizada em directo e que bom seria ver essas imagens históricas. Onde é que elas estarão escondidas/esquecidas? 

O livro abre com a mais sentida das homenagens - o brasileiro Alípio de Freitas (1929-2017) era um preso político na Fortaleza de Santa Cruz de Niterói aquando do 25 de Abril, caso que em Portugal motivou forte empenho na tentativa de libertação. O próprio tinha enviado clandestinamente uma carta para o nosso país, relatando a sua condição mas também o seu empenho na luta anti-fascista, o que chegou ao conhecimento de José Afonso. Aquando de uma visita oficial do Cônsul do Rio de Janeiro à prisão foi-lhe entregue uma cassete que só pôs a tocar quando regressou à cela e, pela primeira vez, ouviu a voz do cantor e uma das canções com o seu nome - "Alípio Dias" (tema que encerra o disco "Com as Minhas Tamanquinhas" de 1976). Como recorda o próprio Alípio, as canções ecoaram, então, bem alto para que os restantes presos também as pudessem ouvir também pela primeira vez, momento que para José Afonso se afiguraria, certamente, reconfortante!     

Dá-se nota, no final da publicação, da intenção de organizar um volume de cinquenta testemunhos em prosa ou verso dos próprio leitores, depois de uma prévia seleccão por um júri, o que estava agendado para Fevereiro de 2007. Do interessante projecto não se conhecem quaisquer desenvolvimentos, o que é uma pena e... penoso.

sexta-feira, 5 de abril de 2024

DUETOS IMPROVÁVEIS #289

ED HARCOURT & STEVIE PARKER 
At the Dead End of the World (Harcourt) 
Álbum "El Magnifico", Deathless Recordings
Inglaterra, Março de 2024

quinta-feira, 4 de abril de 2024

(RE)VISTO #114





















RYUICHI SAKAMOTO | OPUS
 
de Neo Sora. Japão; Film Constellation/Midas Film, 2023 
UCI Cinemas, Arrábida Shopping, 2 de Abril de 2024 
O que fazem vinte cinco pessoas adultas numa chuvosa tarde de terça-feira numa sala grande de cinema? Diríamos que, na maioria das vezes, tentam passar um bocado de tempo da melhor maneira, seja pela curiosidade em relação ao que vão ver, seja na expectativa da confirmação de uma boa ou, até, má crítica sobre o filme escolhido. No caso, contudo, percebeu-se que todos lá estávamos por uma única razão - prestar homenagem a uma das maiores figuras da música dos últimos cinquenta anos pela simples audição das suas composições. Pode parecer redutor, soar pretensioso, mas terminada a sessão onde ninguém desistiu, comprou pipocas ou falou ao telemóvel, respiramos fundo e acabamos com um leve sorriso de satisfação que o maestro Ryuichi Sakamoto, certamente, replicaria com uma vénia. Mas como é que se consegue tamanho monumento?

As vinte peças escolhidas em jeito de panorâmica da sua obra/opus de cinco décadas, executadas e curadas pelo próprio numa última perfomance ao piano, funcionam como uma narrativa magnífica que não precisa de legendas, títulos ou referências. Sucedem-se numa atmosfera de intimidade que, num grande ecrã, nos enchem de uma atenção imediata pelo preto e branco dorido mas sublime das imagens, percorrendo o grande piano, as mãos de dedos finos sobre as teclas ou as feições de um rosto expressivo e cansado. Por vezes, há um candeeiro que se acende, forte, para o iluminar permitindo perceber a fixação dos microfones, o fundo do estúdio ou o leve cima-para-baixo das cordas, tudo sem nunca nos causar qualquer distracção quanto à magnificência das composições e da sua simultânea doçura e desassossego. 

O propósito sugere uma simplicidade que, numa consulta à ficha técnica, é atropelada pela imensidão de meios e técnicos envolvidos. Sente-se, pois, esse perfeccionismo tão japonês na escolha dos ângulos, dos pormenores e de uma acentuada estética fotográfica que foi assumida por Bill Kirstein, nova-iorquino experiente na aproximação e fixação de expressões e movimentos e que aqui teve uma prova de fogo irrepetível e única - este foi mesmo o último, dito, concerto mas que o próprio assumiu como impossível de executar num único fôlego. Sem forças suficientes para uma hora ou uma hora e meia seguida ao piano, foi então necessário registar tema a tema e, apesar de transmitido para muitos países do mundo no final de 2022 como um evento em streaming pago a partir do estúdio 509 da emissora nipónica NHK em Shibuya (Tóquio), a perfomance foi previamente montada e supervisionada pelo autor de forma a sugerir um concerto convencional.  

O filme daí resultante, estreado em Veneza em Setembro passado, é assim, mais que uma apurada celebração de vida, uma dádiva sentida e destinada a vincar um testamento eterno quanto ao fulgor e nobreza de uma música intemporal e, necessariamente, sonhadora. Ao ouvir, quase no final, o inebriante "Merry Christmas Mr. Lawrence" na sua dimensão esplendorosa que todos já sentimos sempre que ele repercute, tornou-se memorável e mesmo excepcional juntar-lhe a dimensão tocante da imagem que só um grande ecrã de cinema permite alcançar e que, em boa hora, obteve distribuição comercial. Haveria, por isso, que ficar sentado mesmo, mesmo até ao fim...

Já depois da ficha técnica e do alinhamento das peças, um aforismo popularizado por Séneca fixou-se ao de leve na tela - Ars longa Vita brevis. 

Arigato, mestre!  


quarta-feira, 3 de abril de 2024

RAINHA LAETITIA, DISCO E CONCERTO!












Para Laetitia Sadier a música corre nas veias. Irrequieta, activa, arrojada ao lado dos seus queridos Stereolab, que nos visitaram em 2022, misturando-se com os brasileiros Mombojó no projecto Modern Cosmology, que deu frutos num dos melhores discos de 2023 ou em nome próprio como no último "Rooting For Love", disco que a Drag City soltou em Fevereiro e o primeiro a solo desde a reunião dos Stereolab em 2019. Em tudo isto há sempre novidade, frescura, bom gosto e um nítido toque de classe que faz da complexidade das canções e das harmonias um som retro-futurista sedutor. 

Serviu-se, desta vez, do grupo The Choir para promover em francês ou inglês, como sempre, uma dinâmica consistente onde o orgão, a guitarra, o baixo, o sintetizador, o trombone e o vibrafone fazem dos temas uma intrincada e, ao mesmo tempo, leve dose de avant-pop sem idade apesar de algum pessimismo e prevenção expressos pela letras. 

Temas, por isso, que se adivinham vibrantes em formato concerto para o que se rodeia do colectivo The Source Ensemble com quem registou "Find Me Finding You", disco de 2017 que formalizou uma colaboração extensível nos anos. A próxima digressão pela Europa durante o mês de Maio têm oito espectáculos (!) pelo país vizinho mas terá o seu término em Portugal com datas na ZBD (1 de Junho) e no GNRation bracarense (dia 2 de Junho, Domingo, 18h00). Já há bilhetes para ver a rainha e a respectiva corte...



NAS ASAS DE AMANDA WHITING!












Um novo trabalho da harpista galesa Amanda Whiting, saído no final de Março e que marca a estreia na editora First Word Records, recebeu o título de "The Liminality of Her". Algumas das dez novas peças foram apresentadas ao vivo, na altura, ainda sem nome, num soalheiro jardim matosinhense em Julho passado com a ajuda de um baterista, um baixista e do flautista Chip Wickham, o mesmo que participa activamente, ao lado de outros reputados instrumentistas, no álbum. O disco recebeu ainda a contribuição de PEACH. nas vozes. 

A fusão de jazz, música clássica e de espirituais constitui para a artista um género de rito de passagem, de alquimia artística em que a harpa assume o comando emocional de uma sonoridade planante e perfeitamente libertadora, para o que se aconselha audição tranquila nas asas de tão delicada fada-madrinha...   


terça-feira, 2 de abril de 2024

MAZARIN, JAZZ PENDULAR!





















Sobre os portugueses Mazarin não há notícias muitas vezes. Discretos na suas deambulações entre Beja, Albufeira ou Viana do Castelo, têm em Lisboa o epicentro de um projecto de novo jazz sedutor já por aqui recomendado, nomeadamente, aquando da estreia nos discos de vinil pela nortenha Monster Jix no final de 2020.  Desde aí e exceptuando a inclusão de um inédito na compilação da mesma editora "Cursed Vol.2" ("SPCWLKR", para ouvir ali em baixo), o colectivo têm agora investido seriamente na composição e gravação de um álbum de estreia que faça justiça à qualidade e frescura que cruza o jazz com outros géneros e linguagens. 

Ele aí está, de nome "Pendular", disco começado há quatro anos durante a chegada da pandemia e do qual foram retirados dois singles prévios: "R.B. - j.b." que conta com a participação de Rodrigo Brandão, artista brasileiro de spoken word que escreveu uma letra de homenagem a Jamie Branch, trompetista ligada à editora International Anthem desaparecida em Agosto de 2022, poucas semanas após ter passado por Lisboa; "Chester", o primeiro single lançado em Fevereiro que reflecte uma influência mais electrónica com origem no movimento arrebatador do actual jazz londrino. 

Os restantes seis temas são também audíveis através do youtube e neles colaboram Sara Badalo ("Colours"), o acordeonista João Frade ("Caçadores") e ainda Gil Dionísio e Soluna ("Deuses e Tolos"), num trabalho produzido pelos próprios Mazarin com a ajuda de Sickonce.

Para memória futura, de frisar que o quinteto é formado por Léo Vrillaud nos teclados, Francisco Bettencourt no saxofone e flauta, Vicente Booth na guitarra, João Spencer no baixo e João Romão na bateria. Logo que houver notícias, esperamos vê-los num qualquer palco ou sala das redondezas. 



UAUU #714

segunda-feira, 1 de abril de 2024

BRIAN ENO, O(S) FILME(S)!





















Aos setenta e cinco anos, o britânico Brian Eno mantêm sobre si toda uma aura mítica que foi acumulando desde quando se juntou aos Roxy Music em 1970 até ao presente, carreira que se desdobrou e desdobra, para além de músico, na produção, na composição e teoria ou ciência sonora, sendo uma daquelas figuras indissociáveis da história moderna da música. 

Será, assim, natural que até aqui chegado, não seja surpreendente a estreia inglesa de "Eno" agendada para o Barbican londrino no próximo dia 20 de Abril, um documentário biográfico inovador que promete ser diferente sempre que for projectado, já que a inteligência artificial fará o favor de definir, aleatoriamente, o layout da película! Foi o que já aconteceu no Festival de Copenhaga no passado dia 17 de Março ou em Nova Iorque aquando do Festival Sundance de Janeiro, o que se repetirá na novidade nesse sábado no Barbican onde está também marcada uma conversa pós-filme com a presença do próprio, do fotógrafo Gary Hustwit, realizador do documentário, e do compositor e criativo Brendan Dawes. 

O filme terá acompanhamento sonoro oficial com a edição de uma banda sonora de dezassete faixas que cobre trabalhos a solo datados de 1974 e 1975, parcerias com outros génios como David Byrne ou John Cale e também música retirado do último "FOREVERANDEVERNOMORE" (2019), o vigésimo nono álbum de estúdio, e da colaboração empreendida em 2023 com o irmão Roger num concerto ao vivo na Ácrople ateniense com o registo de "By This River". Incluídos, estarão ainda três inéditos ("Lighthouse #429", por exemplo, vide abaixo). 

O tema "All I Remember", que encerra o filme, foi escrito propositadamente para este projecto e nele Eno refere as suas influências iniciais como Ketty Lester, Dee Clark ou Bobby Vee e as experiências vividas. Para o respectivo video, estreado o mês passado, são apresentadas um conjunto de imagens nunca vistas. 


SAKAMOTO EM SALA GRANDE!

O desaparecimento do mestre Ryuichi Sakamoto a 28 de Março de 2023 tem no novo filme "Opus" uma celebração da sua vida e arte a partir de um último concerto, sozinho com o piano, registado em 2022 com a sua supervisão e em que as vinte peças seleccionadas da longa carreira falam por si. Ao seu lado, só os colaboradores mais próximos, incluindo o seu filho Neo Sora a quem foi dada a primazia na realização. 

Desde a passada quinta-feira, 28 de Março (Piano Day) e até quarta-feira, 3 de Abril, está agendada a projecção em sala desta rara película, o que no Porto e arredores pode e deve ser presenciado nos cinemas UCI (sala 7) do Arrábida Shopping em duas sessões diárias (16h10 e 21h10).

sábado, 30 de março de 2024

NICK GARRIE, SINGLE DE COLECÇÃO!





















A história, que se tornou lenda, conta-se em poucas linhas: no final dos anos sessenta, o jovem inglês Nick Garrie deambulava pelo Sul de França a tocar e a cantar onde pudesse quando foi descoberto e contratado para gravar para a Disc'AZ, o que aconteceu com "The Nightmare of J. B. Stanislas", álbum de 1969 de que só foram produzidos e distribuídos cem exemplares devido ao suicídio de Lucien Morisse, dono da editora parisiense. 

O trabalho tornou-se, depois, uma apreciada obra de culto do chamado psych pop/rock na qual foi, originalmente, utilizada uma orquestra de mais de cinquenta elementos, sendo por diversas vezes reeditada. Em 2005, o disco recebeu um importante reconhecimento da imprensa especializada, alcançando comparações a "Forever Changes" dos Love e permitindo a Garrie voltar ao activo artístico e às digressões depois de alguns anos a trabalhar como professor ou instrutor de esqui! São desses tempos viagens pela Europa que chegaram a Portugal onde registou, de modo obscuro, um disco que o ano passado viu, de surpresa, a luz do dia

Muitas destas histórias foram contadas pelo próprio de viva voz no concerto que o juntou aos Beautify Junkyards em 2014 no Maus Hábitos, serão que marcou a estreia oficial na cidade depois de, dois anos antes, ter sido apontado ao cartaz do Primavera Sound da Invicta, presença que, julgamos, não se ter concretizado. Na edição catalã do festival, uma semana antes, Garrie tocou na íntegra "The Nightmare of J. B. Stanislas" em duas noites seguidas no Auditòri del Forum com a ajuda de um quarteto de cordas. 

Para juntar a todas as boas colecções, o tema título do mítico álbum conhece agora uma inédita rodela pequena de vinil em parceria com a 9x9 Records de Liverpool a que se junta, no lado B, "Around The World", canção da mesma época regravada em 2023 e que tem imagens agrupadas e editadas por Alger Landau a partir da partilha de variadas e inéditas fotografas, uma cortesia de admiradores e aficionados de todas as idades! 


sexta-feira, 29 de março de 2024

(RE)LIDO #120





















MÚSICA, SÓ MUSICA 
de Haruki Murakami e Seiji Osawa. Lisboa; Casa das Letras/Leya, 2022 
Um maestro e um escritor de diferentes gerações acordaram partilhar a sua paixão pela música dita clássica da melhor forma - conversando sobre ela ao longo de dois anos (Novembro de 2010 a Julho de 2011) em ambiente amistoso e informal. Haruki Murakami, afamado escritor japonês também conhecido pela sua infindável, e de qualidade, colecção de discos de vinil quer de jazz ou de pop-rock, acumula também preciosidades relativas a compositores clássicos como Beethoven, Mahler ou Brahms, dominando ainda os respectivos directores de orquestra, os solistas ou algumas circunstâncias da composição e gravação. Mas, colocando estes discos a rodar, escondem-se uma série de pormenores que a simples audição não permite distinguir a não ser um ouvido apurado, experiente e cirúrgico como o de Seiji Osawa... 

O premiado maestro, também japonês e falecido aos oitenta e oito anos no mês passado, é parte decisiva quanto ao imediato fascínio do livro. Mesmo para leigos como nós em música clássica, isto é, que não distinguimos correctamente autores, estilos, épocas ou andamentos, as seis conversas funcionam como um banquete de curiosidades e confissões vindas, principalmente, da experiência de vida de Osawa em rotação pelo comando de orquestras prestigiadas (Boston), de fintas e rodopios para agradar e corrigir os músicos, os cantores de ópera, as administrações ou mecenas e as amizades com lendas como Leonard Bernstein (1918-1990) ou solistas como o pianista Glenn Gould (1932-1982). Tudo em modo de mergulho no pormenor, na historieta ou na traquinice e que, a partir do diálogo estabelecido, resultam numa narrativa de plena e entusiástica melomania. 

O jovem maestro Martim Sousa Tavares, no prefácio da edição portuguesa, assinala duas características que, muito justamente, ajudam a perceber este indiscutível encanto: o dom da palavra (Murakami) e o dom da musicalidade (Osawa) ofuscam-se pela complementaridade na audição e na observação, uma excepção temporal de irrepetibilidade certa e que Tavares anota ainda no facto pertinente de termos, no caso, "o génio literário que ouve como um músico". 

O resultado, contagiante na leitura e multiplicador do amor pela música, acelera a vontade inaudita de também ouvir sobre o que se leu, para o que existe disponível uma lista de cento e cinquenta e cinco "músicas" curadas pelo próprio Murakami de forma desafiadora e, como não dizê-lo, impressionante. Música, só música!  
 

quinta-feira, 28 de março de 2024

THE CHURCH, IGREJA FIEL!





















Ao fim de um hiato de seis anos, os australianos The Church editaram "The Hypnogogue" em 2023 e não foi preciso esperar muito mais para um novo álbum que aos poucos se foi destapando no último semestre. 

Um ano depois e chegados ao final de Março, aí está "Eros Zeta and the Perfumed Guitars", quinze temas em jeito de segunda parte de um projecto em movimento e que tem nas guitarras uma tradição que a nossa casa continua a "gastar" fielmente há mais de quarenta anos


VIKINGUR ÓLAFSSON DE SECRETÁRIA!

quarta-feira, 27 de março de 2024

SOUNDWALK COLLECTIVE & PATTI SMITH, Theatro Circo, Braga, 24 de Março de 2024

Por antecipação, a noite minhota de Domingo passado adivinhava-se histórica. A presença, em estreia, de Patti Smith na cidade criou, desde a data de venda dos bilhetes, um frenesim compreensível entre uma geração que tem por ela uma veneração longínqua que não se resume a saber de cor muitas das suas canções. Muitos lemos os livros, os poemas ou as entrevistas e admiramos a sua versatilidade e coragem artística o que ali, num dos mais bonitos teatros portugueses, ganhava uma proximidade e intensidade previsíveis e irrepetíveis. 

Foi dessa tensão e vibração que a perfomance se (pre)encheu desde o início com a leitura e, por vezes, uma leve cantoria de textos agrupados sob o titulo de "Correspondences" com fundo sonoro do Soundwalk Collective e projecção de belas e notáveis imagens e efeitos visuais a cargo do realizador português Pedro Maia. Tudo, por isso, de estética e justaposição narrativa intencionalmente preparada para nos obrigar à concentração e atenção ao que Smith, mesmo só em inglês, relatava e contava de forma sublime. Sem mácula ou enganos, entre golos de chã, vimo-nos submersos pelos seus discursos de permuta, de acusação, de apelo ou perigo que as imagens de fundo acentuaram na urgência da ecologia, da insubmissão ou da igualdade. Uma gramática visual e sonora que transbordou, imensa, na última sequência dedicada a Pasolini, também ele um artista irrequieto na sua múltipla e insubordinada provocação agitprop

O encore que se seguiu trouxe ao palco a mãe Patti e a filha Jess Paris para dois temas como que desanuviadores de uma energia que se foi acumulando, pela contenção, ao longo de oitenta minutos. Já de luzes acesas e confessando a participação, como não, nas procissões de Domingos de Ramos, foram escolhidos a critério os temas "Wing" do álbum "Gone Again" (1996) e o inevitável e adorado "People Have the Power" de "Dream of Life" (1988), hino que hoje em dia se multiplica, essencial, na sua imprescindível vigência activa e vigilante e que mereceu, também por isso, coro uníssono. O poder de sonhar, esse Patti Smith há-de continuar a exaltar como ninguém! (para quando o Prémio Nobel?)

DUETOS IMPROVÁVEIS #288

FATOUMATA DIAWARA & ANGIE STONE 
Somaw (Diawara) 
Álbum "London Ko", 3eme Bureau Records/Wagram Music
França, Maio de 2023