quarta-feira, 26 de novembro de 2025

GINA BIRCH + DEVENDRA BANHART, Theatro Circo, Braga, 24 de Novembro de 2025

Se as The Raincoats foram veia inspiradora para muitas bandas, à boa tensão entre Ana Silva e Gina Birch se deveu essa salutar desmultiplicação em que a irreverência foi (é) palavra de ordem. Regressada ao Minho (passaram por Coura em 1996 e, possivelmente, pelo GNRation em 2018), Birch só em 2021 se lançou a solo nisto dos álbuns e das canções. A primeira delas chamou-se "Feminist Song", assumindo sem contemplações a luta contra uma desigualdade secular e mantendo, como não, a tal irreverência. 

Ela não podia faltar e não faltou logo em "I Am Rage" com que abriu o pequeno set, escolhendo imagens de fundo de autoria própria, uma vertente artística tarimbada em anos de estudo e prática, e que se haveriam de mostrar notáveis logo de seguida na referida "Feminist Song", em "I Thought I'd Live Forever" ou "I Will Never Wear Stilettos". Agitadora, mas, mesmo assim, algo nervosa, foi com "Causing Trouble Again", do mais recente álbum na Third Man Records (2025), que um coro alto da plateia se fez ouvir, em bom som, na simplicidade de um grito: trouble... agitpop do bom! 

Dois anos depois, Devendra Banhart voltou ao Theatro Circo para uma esperada redenção. Não seria difícil fazer melhor que a falhada estadia de 2023 e a faceta de "sozinho em palco" mostrava-se como sendo a adequada para que a estrela se invertesse no brilho. Sem dificuldade, Devendra cedo se mostraria fino, delicado, intenso, mesmo que uma certa anarquia no alinhamento das canções tenha rodado o serão num corrupio em que emergiu muita boa disposição à volta de microfones, bexigas, casas de banho e algum portunhol... 

A proposta transmitida em jeito de aviso consistia numa sugestiva ordem cronológica dos seus melhores temas, começando pelos mais antigos, pretensão parte cumprida, parte subvertida sem consequências. Acabou por faltar umas das nossas preferidas ("Daniel"), talvez alinhada, mas esquecida, substituída de certeza por outra ainda melhor, todas de acústica refinada e certeira em que a voz se elevou, desta vez, a nível de excelência. Apesar da dupla sugestão da plateia, interacção autorizada previamente, de "Santa Maria da Feira" soaram só os primeiros dez segundos, brincadeira que foi também aplicada a outras como "Quedate Luna", mas só pelo tratamento dado a uma inesperada "Carolina" não são requisitadas quaisquer desculpas. 

Quanto a versões, que afinal ninguém sugeriu (podia ser o "Pink Moon", em dia funesto para Nick Drake, ou o "Leãozinho" que calhava sempre bem), Devendra convidou Gina Birch para uma variação de "Rilkean Heart", pérola antiga dos Cocteau Twins, parceria improvisada longe da perfeição, mas de merecida cortesia à companheira de curta partilha e de longínqua veneração. 

Playing solo (giving it a shot), assim se chama a actual digressão, foi, pois, isso mesmo, a sinceridade de um artista dono de um cancioneiro robusto, envolto de envelhecimento activo ainda essencial e de deliciosa fruição, não estranhando que, passados mais de vinte anos, a cada aproximação ao nosso país as salas continuem a esgotar-se de ansiedade e de vibração. Foi um placer...

terça-feira, 25 de novembro de 2025

CAROLINE, TRANSCENDÊNCIA GNRACIONAL!





















Os britânicos Caroline são um caso sério de indefinição. Ainda bem. Há por aqui deslizes suficientes para lhe prestarmos toda uma necessária atenção desperta pelo álbum homónimo de 2022 e de um segundo já de Maio deste ano. O género sonoro ergue-se como uma improvisação de labirinto na folk antiga, fios de pós-rock e até em alguma sofisticação orquestral a la Black Country New Road. 

O octecto espraia-se de forma pausada, enredando instrumentos e vozes que no disco teve, who else, Caroline Polachek como cúmplice surpreendente, um todo que será ao vivo uma experiência de intensidade assinalável já testada em TinyDesk vibrante

Será, pois, mais que recomendável não perder a próxima digressão pela Europa que terá no GNRation bracarense o espaço ideal para a estreia portuguesa (2 de Abril de 2026, quinta-feira) e que alcança Lisboa no dia seguinte (B Leza). Bilhetes transcendentes.


FAZ HOJE (24) ANOS #114





















TRICKY, Teatro Sá da Bandeira, Porto, 25 de Novembro de 2001
 
. Diário de Notícias, por Rui Frias, fotografia de Tânia Cerqueira, 27 de Novembro de 2001, p. 42

DUETOS IMPROVÁVEIS #309

ANNA CALVI & PERFUME GENIUS 
I See A Darkness (Bonnie Prince Billy) 
Carving Silver in Strange Weather (Substack),
Outubro de 2025 

domingo, 23 de novembro de 2025

FAZ HOJE (24) ANOS #113














SNOOZE + MOUSE ON MARS + KID 606 + KHAN, Festival Blue Spot, Teatro Sá da Bandeira, Porto, 23 de Novembro de 2001 
. Diário de Notícias, por Marcos Cruz, 25 de Novembro de 2001, p. 53 
. Jornal de Notícias, por Emanuel Carneiro, fotografia de Pedro Correia, 25 de Novembro, p. 44


sexta-feira, 21 de novembro de 2025

TOBIAS JESSO JR., CINTILA UM MILAGRE!





















Dez anos passaram sobre "Goon", disco de estreia de Tobias Jesso Jr. que se tornou um clássico intemporal que não teve sequela. Bem perguntámos o que era feito do, então, ainda jovem compositor e de que se sinalizou só o ano passado algum reconhecimento como compositor premiado com Grammy. Um álbum novo era hipótese remota. Até hoje! 

Podem já ouvir "shine" na sua totalidade via spotify, trinta minutos de oito canções poderosas onde o piano se evidencia numa auto-produção misturada por Shawn Everett. Aceitam-se encomendas de linda brancura em vinil e de design cintilante

Os novos temas assentam no amor pela mãe, pelo filho, mas também em alguma amargura fruto de rompimentos e separações e teve ajudas de amigos como Danielle Haim, Justin Vernon e de alguma e útil psicanálise. O primeiro single "I Love You" deverá ser sempre escutado até quase ao final... poderoso. 

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

EZRA COLLECTIVE, NATAL FOFINHO!















O colectivo londrino Ezra Collective decidiu que a proximidade do Natal merecia alguma ternura de sonoridade jazz que a envolvesse de alegria e fofura, escolhendo-se dois clássicos ingleses setecentistas ("Joy To the World" e "Hark! The Herald Angels Sing") para amaciar os excessos indesejados. 

A proposta imita um versão de "God Rest Ye Merry Gentlemen", tradicional de estação também britânico que a banda lançou o ano passado, naquilo que agora se começa a assumir como uma salutar tradição. Só falta a rodelinha de vinil...



terça-feira, 18 de novembro de 2025

RUFUS WAINWRIGHT, REINVENÇÃO WEILL!





















Em Março, a nossa RTP2 fez o favor de emitir o espectáulo de Rufus Wainwright com a Pacific Jazz Orchestra, momento ao vivo de homenagem e vénia a Kurt Weill repetido em Nova Iorque e Los Angeles. Faltava juntar um disco que o eternizasse na reinvenção. 

Pois bem, chama-se "I'm A Stranger Here Myself: Wainwright Does Weill - Rufus Wainwright with the Pacific Jazz Orchestra", e promete ser um tributo de um fã fervoroso e fascinado pela envolvência de um songbook intemporal que foi, ele próprio, uma das principais influências da composição que Wainwright imprimiu, desde muito novo, à sua carreira. Ainda por cima, tudo muito natalício


sábado, 15 de novembro de 2025

LAURIE ANDERSON & SEXMOB, Teatro Rivoli, Porto, 13 de Novembro de 2025

                         Fotografia: facebook do Teatro Municipal do Porto

















Deu muitas voltas o nosso mundo desde a última vez que Laurie Anderson se apresentou no Porto. Foram dois anos seguidos de perfomances a solo no velhinho Teatro de Sâo João (2005) e na, então, novinha Casa da Música (2006), lanças vanguardistas em torno da palavra e da comunicação. Sempre acutilantes, sempre tensionais, sempre, diríamos, necessárias. 

Vinte anos depois, e na companhia inédita da banda nova-iorquina SexMob, Anderson trouxe à cidade "X²", um (des)concerto que, não sendo só musical, também não foi só comunicacional. A hibridez aportada para a sala envolveu-se de imagens e luzes, de sons e crescendos jazzísticos em que o violino, o seu e mais dois, assumiram a centralina de alguma electrónica e demasiada, impertinente, percussão que chegou ao segundo balcão em modo quadrado, chapado, confirmando as deficiências acústicas de um teatro que não gosta nada de concertos rock ou outros... 

Foi pena, por isso, que pérolas como "Big Science" ou "Language is Virus", escolhidos logo na primeira meia-hora para reafirmar a actualidade da mensagem, não tenham despertado grande entusiasmo, como que encolhidas e despercebidas numa amálgama multimédia e instrumental excessivas. Valeram, como sempre, as vozes, as histórias, os acentos que Anderson escolheu para contar, narrativas de frisado ora político, em que o seu presidente foi o alvo-mor, ora biográfico, com destaque para Dylan e o seu Lou Reed. 

Surpreendente o capítulo dedicado ao pai, vida de um muito jovem emigrante da Suécia que a IA fez o favor de revolver e reinventar em imagens a preto e branco saborosas, engraçadas e despertadoras de alguma da maçada em que o serão, perigosamente, parecia ir patinar. Como que por magia, a noite ganhou novas asas para voar bem melhor até ao fim, um género de segunda-parte sem direito a intervalo em que a delicadeza, a cambiante visual e até o tai chi colectivo praticado sem constrangimento funcionaram, efectivamente, como um alívio compensador. 

Uma noite demasiado longa, a precisar de maior e mais pertinente restrição, confirmando, no nosso entender, que a magia única que Laurie Anderson emana se afigura ainda suficiente para brilhar sem necessidade de uma qualquer coadjuvação. A grande ciência faz-se sozinha...

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

MICAH P. HINSON, O HOMEM DO AMANHÃ!





















A connessione italiana de Micah P. Hinson, iniciada em 2022 com "I Lie to You", estende-se agora a "The Tomorrow Man", disco que conta, novamente, com a parceria de Alessandro Asso Stefana, produtor e também compositor de novas canções escritas entre o Texas e Espanha. Hinson assume que há muito as procurava e encontrou-as, pela primeira vez, no tempo presente e não no passado. 

Para trás sugere ter ficado a longínqua onda folk-rock de veia trágica que, ao vivo, era (é?) pura diversão, sobreposta que foi agora por sedutoras orquestrações e alguma melancolia de novo crooner que lhe assenta muito bem. 

Ao álbum, saído no final de Outubro na casa Ponderosa Music Records de Milão, só faltará acrescentar o teste de um concerto para a prova definitiva. Talvez ao piano, como em Cerveira no verão de 2024...



quinta-feira, 13 de novembro de 2025

ONEOHTRIX POINT NEVER, Theatro Circo, Braga, 9 de Novembro de 2025

                                             Fotografia: facebook do Thetaro Circo
















Já lá vai um quarteirão de anos quando no já demolido Cinema Terço do Porto se assistiu à estreia dos Thievery Corporation na Invicta. Na nossa inocência, saímos da sala desanimados com a prestação, melhor, a atitude da dupla norte-americana: atrás de uma vistosa mesa de aparelhagens, Garza e Hilton, sorridentes, divertiram-se em conversas, ginga-gingas e umas passas em cigarros, deixando a música pré-gravada correr sem pejo enquanto uma cantora e outros figurões na frente de palco faziam um papelão dispensável. Ficamos vacinados. 

Comparecer, por isso, a um dito concerto de Daniel Lopatin aka Oneohtrix Point Never em sala grande, distinta e nobre como a de Braga será um eufemismo que os tempos performativos foram diluindo. O género de música sintetizada que o artista tem desenvolvido nos últimos quinze anos aproxima-o a um condão efectivo de bom gosto e transcendência que tem alimentado bandas-bonoras de acutilância e mistério, capacidades que outros inovadores como Anohni, David Byrne, James Blake ou o saudoso Ryuichi Sakamoto não dispensaram para fazer abrir novos caminnhos sonoros. 

O motivo da, dita assim, perfomance chama-se "Tranquilizer", um novo álbum a sair para semana na Warp Records, e o serão do Domingo serviu com uma refinada e antecipada listening party colectiva da totalidade das quinze peças, a que se juntou uma notável imersão visual da responsabilidade de Freeka Tet, entremeada por fumarolas e strobes que nos pareceram de exagero desnecessário, talvez porque já não estamos há muito habituados a isto das noitadas e das batidas... 

O disco e os videos, contudo, são de justa e, sem esforço, recomendada fruição.



 

PULP DE SECRETÁRIA!

terça-feira, 11 de novembro de 2025

BONNIE PRINCE BILLY, GNRation, Braga, 9 de Novembro de 2025

São muitas e boas as memórias de concertos de Will Oldham aka Bonnie Prince Billy. Serão imbatíveis, contudo, as que se aclaram saídas do granito do saudoso bar Mercedes da Ribeiro portuense em 2008, bem diferentes de uma anterior e mais atribudada passagem pelo Theatro Circo minhoto. Estava, pois, na hora certa para a insistência ao vivo num, há muito, mítico trovador americano que faz da música a única e virtuosa forma de vida - "I want to make music all the time / Not just in fits and skirmishes / I wanna be wholly consumed in rhyme / And bend my whole to her wishes", faria ele o favor de recordar em "Behold! Be Held!". 

O cancioneiro é, assim, de uma vastidão infindável, mas o motivo principal residia no novo, de meses, "The Purple Bird", mais um disco de consistência e validade assinalável que se arriscou passar para cima do palco de forma surpreendente - sem qualquer percussão, as canções como que se ondularam, eruditas, numa intimidade e simbiose de perfeição tocante ou não fosse Eamon O’Leary no bouzouki, Thomas Deakin na guitarra eléctrica e clarinete e o, literalmente, grande Jacob Duncan na flauta e saxofone, um trio de astuta e rara cumplicidade. Tamanha elevação, mesmo com alguns atropelos irrelevantes nos acordes, teve na caixa negra do último piso do antigo quartel bracarense um reduto de resguardo e conforto a uma audiência esgotado de devotos silenciosos, apreço de requisito bendito em tempos de banalização lesiva do ruído. 

No seu trejeito engraçado (aquele equilíbrio em pé de galo continua intratável), Oldham mostrou-se empenhado e certeiro na abordagem a um reportório de veia na americana de raiz folk, em que a liberdade e a camaradagem continuam a ser a seiva de uma composição peculiar e em contínuo batimento. Respirou-se, por isso, tanto em palco como na plateia, um amor verdadeiro pela boa música, daquela que há décadas o mestre Billy não se cansa, sem poluentes, de produzir milagrosamente. Uma lenda viva, viva a lenda! 

BILL CALLAHAN, TEMOS HOMEM!





















Uma reedição de uma sessão clássica, um disco ao vivo, uma digressão que circulou por perto, um álbum de originais. A sequência que Bill Callahan traçou não falha e para 27 de Fevereiro de 2026 está agendado o desfecho programado, dia em que "My Days of 58" se fará iluminar por exclusiva culpa. 

A contenda, a oitava em nome próprio, parece continuar um trilho experimental que "Reality" de 2022 desbravou, um género de registo sitiado numa sala de estúdio onde os erros e as surpresas continuam a acontecer. Um milagre é o que é, que só ele e os parceiros sabem fazer e que, neste caso, têm nome - Matt Kinsey, guitarrista, Dustin Laurenzi, saxofonista e Jim White, baterista. 

Depois de umas poucas amolgadelas e muitos cruzamentos instrumentais, o resultado afigura-se enérgico, de profundeza desconhecida como convêm, mas de uma espontaneidade bravia que crescerá naturalmente. Ouça-se "The Man I'm Supposed To Be"... temos homem!

terça-feira, 4 de novembro de 2025

FAZ HOJE (31) ANOS #112

 





















CHIEFTAINS & JÚLIO PEREIRA, Coliseu do Porto, 4 de Novembro de 1994
 
. Diário de Notícias, por Miguel Carvalho, fotografia de Orlando Teixeira, 6 de Novembro, p. ?
. Público, por Fernando Magalhães, fotografia de Paulo Pimenta, 6 de Novembro, p. 38

KEATON HENSON, O PONDERADO!





















Na sua habitual suavidade, a carreira artística de Keaton Henson sugere ser um percurso que se alimenta num temperamento de imprevisibilidade assumida. A calmaria dos últimos discos, a sua serenidade, tem agora abanão previsto com "Parade", álbum, como sempre, de embrulho e desenho do próprio em variadas edições e versões limitadas

As novas canções quase nos fazem regressar a tempos do grunge, uma marca que na sua juventude se impregnou sem direito a dissolvente de nódoas, que isto das raízes não permite cortes profundos. A vontade com que gravou o disco é só sinónimo de uma sinceridade aberta a memórias e facetas antigas que não se escondem, não se apagam e que, na sua impetuosidade, ajudam a moldar uma evidência - temos homem confiante. 

Curiosa a estratégia aplicada - a cada novo single têm-se seguido uma versão acústica caseira, talvez lembrando os fãs que a delicadeza continua activa, mesmo assim, validada por um desses novos temas de nome "Past It". Outras pérolas, como "Lazy Magician", tema que conta com a ajuda de Julia Steiner, são só mais contrapesos de um balanço ponderado. 





UAUU #749

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

JO ALICE + HAMILTON LEITHAUSER, M.Ou.Co., Porto, 31 de Outubro de 2025

A virtude da primeira parte de um qualquer concerto deverá ser a de descontrair e preparar a plateia, seja lá o que isso for. Por vezes, o momento torna-se dispensável e, por isso, desnecessário. Outras vezes, a pertinência e desafio dessa antecipação a um nome ou banda maior redunda numa chance envolvente. Que agradável surpresa!, alguém gritou pouco depois de Jo Alice tocar dois dos oito temas com que se deu a conhecer no Porto. Nem mais, a Angel Olsen que se cuide.

Do nada, a noite ganhou memória de densidão assinalável, muito à custa de um vozeirão enleado a uma guitarra com tanto de roufenho como de negra delicadeza e agarrada, nalguns casos, às batidas de Stephen Patterson, ele próprio baterista de Leithauser. Sabemos agora da sua cumplicidade na gravação e apuramento das primeiras canções de uma jovem artista de nacionalidade portuguesa e vivência algarvia, mas que se move entre a Irlanda, França ou o Texas americano. Escolheu, também por isso, algumas pérolas pertencente a outros para se dar a ouvir (identificamos os The Last Shadow Puppets ou o Jacques Brel), como essa monumental "Magnolia" que o grande JJ Cale escreveu em 1971 e que, ali, se confirmaria como um dos melhores momentos de um serão ainda madrugador. Grande Alice na cidade das maravilhas. 

 

Com excepção de um Primavera Sound com oito anos e um Paredes de Coura com onze, esta era a estreia a sério de Hamilton Leithauser no Porto e teve merecida casa esgotada por fãs de fidelidade antiga. Logo agora que o vocalista dos The Walkmen pôs cá fora, há uns meses, "This Side of the Island", um quarto disco de originais de nove canções certeiras e robustas, notou-se que o álbum está já mais que absorvido e aprovado, tendo sido ele o fio condutor de um alinhamento a apelar à compartilha e proximidade em que o tema-título e "What Do I Think?" bateram todos os outros por décimas. 

Os atributos da banda, mesmo que nem sempre alinhados, estenderam-se a memórias mais antigas de validade confirmada e frescura renovada - "A 1000 Times", "In a Black Out" ou "Peaceful Morning" foram exemplos perfeitos dessa consistência a que se esperava a adição de um obrigatório "Alexandra" que, afinal, foi inexplicavelmente preterido. Em noite de bruxas e numa imaginária contenda entre doçuras e travessuras, os sustos perderam por larga margem para uma variedade de guloseimas coloridas de sabor duradoiro e de receita Leithauser há muito patenteada. A tradição não engana e, por isso, este continua um artista que interessa acarinhar e proteger de uma América ainda salutar e diversa. Longaevitas...