Aos setenta e cinco e anos e em plena forma, o mestre escolheu um alinhamento de quatro longas peças que introduziu demoradamente e onde, pela agilidade e velocidade de execução, como que agitou uma penumbra sonora de que apetece não ver o fim e que se alonga, misteriosa, em intrépidas sequências circulares que só a pausa, que se sabe irá acontecer, consegue, por magia, suspender.
Na defesa e promoção de tão invulgar receita melodiosa, Melnyk tem recorrido a parcerias com músicos do seu país natal, apostando na sua inclusão, mesmo que indirecta, em concertos, como foi o caso da composição "Antiphons 2", executada com o suporte pré-gravado de um quarteto de cordas ucraniano, variação, ainda assim, de diferente efeito e absorvência.
Para a despedida e aproveitando o embalo, estava programada "The Sacred Thousand", peça de recente decalque em disco como homenagem aos soldados ucranianos que resistiram ao exército russo em Mariupol, uma guerra que Melnyk condenou e culpou, justamente, pela tirania, ultraje e horror praticados pela potência invasora. Pena que, alguns, do conforto da cadeira, não tenham sabido respeitar esse sofrimento, interpelando, a despropósito, o músico quanto à dispensa da política em favor da audição musical, como se, no caso, elas fossem separáveis e alienáveis. Sentido, Melnyk fez notar, na resposta, a grandeza eterna da arte como forma de luta, recebendo forte aplauso e vivas de uma plateia incomodada e empertigada, mas que, em silencio venerado, como que lhe foi pedindo desculpa ao longo dos vinte e cinco minutos da rendição, agora, ainda mais urgente.
Também por isso, o serão em Espinho foi, pois, mais uma dessas sessões inesquecíveis em que uma imparável e vibrante tensão nos esganou nos movimentos e na respiração, um género de castigo deleitante que só a música e este som, seja lá o que isso for, impõem sem contemplações. E, sim, a música, esta música, será sempre uma arma...
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