segunda-feira, 30 de junho de 2025

UAUU #745

BLONDE REDHEAD, A DAR CORO!





















O misterioso trio Blonde Redhead, que nos visitou ao vivo há cerca de um ano, é uma caixinha de surpresas. A última, com poucos dias, é um disquinho chamado "The Shadow of the Guest" com quatro versões de canções clássicas do seu reportório - "Before”, “Via Savona", “Coda” e “Rest of Her Life” - ao lado do Brooklyn Youth Chorus de Nova Iorque! Um hábito, por isso, salutar e que não é coro...

Somam-se uma série de três reinterpretações ASMR (seja lá o que isso for) de temas originalmente compostos para a designer de moda parisiense Isabel Marant e ainda "Oda a Coda", que não é mais que "For The Damaged Coda" em versão mariachi, tema dos próprios Kazu Makino e gémeos Amedeo e Simone Pace imortalizada, em 2000, na série televisiva "Rick and Morty". Lá para Outubro está prometida a edição em vinil especial através da Record Store Day.



quarta-feira, 25 de junho de 2025

BADBADNOTGOOD, Theatro Circo, Braga, 22 de Junho de 2025

A expectativa quanto à estreia dos BadBadNotGood em Braga, confessamos, não era muito alta, já que o lugar de pouca visibilidade de uma das galerias inferiores que nos calhou retirava, à partida, algum do entusiasmo que a banda de Toronto desde sempre nos despertou. Não contávamos é que, mesmo noutro lugar sentado privilegiado, também seria pouca a percepção do sexteto em palco devido à inexistência de iluminação dirigida, substituída pelos simples reflexos de filmes de 10 mm projectados do fundo da sala! As imagens, sedutoras e da responsabilidade do conterrâneo Sylvain Chaussee, também não eram a componente mais importante e, mesmo na escuridão, a validade instrumental desta máquina canadiana confirmou-se uma potência. 

Talvez a onda tropical light do magnífico álbum "Mid Spiral" se adapte de imediato a qualquer que seja o recinto soalheiro ao ar livre, como, certamente, na véspera se viveu em Lisboa, mas o trio fundador comandado pelo baterista Alexander Sowinski agarrou-se a mais três parceiros para se ajustar às circunstâncias de uma plateia sentada pronta para responder a desafios. Foi assim, desde logo, na irresistível "Sétima Regra" devidamente "abanada" fora das cadeiras, estendida ao limite na sua perfeição agitadora (um sete polegadas de vinil deste tema torna-se urgente). Contudo, ainda estamos para perceber aqueles posteriores dez minutos de saxofone a solo com fundo de mar e do prévio exercício de respiração colectiva!    

O serão serviu também para homenagens a mitos inspiradores recentemente falecidos com versões de "Family Affair" de Sly Stone e de, já no encore, "Everybody Loves de Sunshine" de Roy Ayers, demonstrando-se a capacidade da banda em reinventar o jazz num género múltiplo e viajante que não receia arriscar parcerias e colaborações - faltou, por isso, a pérola "Poeira Cósmica" onde se faz ouvir Tim Bernardes, mas teria sido bom que, pelo menos, o instrumental tivesse sido eleito (pronto, estão desculpados, já que a canção estava prensada em rodela pequena de vinil à venda no átrio... maravilha!). 

Apesar da legitimidade da experiência e da sua efectiva recompensa, ficamos agora à espera de um regresso a um qualquer festival nortenho em dia de sol, o que nunca até hoje aconteceu, por exemplo, à cidade do Porto, uma estranha lacuna atendendo a que os BadBadNotGood já cá andam a fazer a festa há mais de quinze anos. Talvez, com sorte, numa próxima primavera...   

segunda-feira, 23 de junho de 2025

CASS McCOMBS, DO CARVALHO!





















Cass McCombs parece ter sido assaltado por um regresso ao passado como projecto moderno para um novo álbum: "Interior Live Oak", assim se chama, terá edição pela Domino Records, casa onde registou os cinco trabalhos antes da mudança para a americana Anti Records em 2016, e contempla a reunião com um grupo de colaboradores activos da editora inglesa como Matt Sweeney, Mike Bones, Chris Cohen e Jason Quever dos Papercuts, amigo com quem registou uma série de temas em 1999/2000 reunidos no disco arqueológico do ano passado "Seed Cake on Leap Year". 

As novas canções sofreram inspiração e aperfeiçoamento na Bay Area de São Francisco, mas obtiveram versão final em estúdio nova-iorquino ao lado de alguns dos referidos parceiros, estando já permitido o teste a duas das dezasseis escolhas - "Peace" e a já aditiva "Priestess" apresentada na sessão Tiny Desk do mês de Março. Cass McCombs terá em Paredes de Coura, entre carvalhos, a primeira das poucas datas previstas ao vivo pela Europa (13 de Agosto)...


ADELINO GONÇALVES (1959-2025)





















Eram dias da semana agarrados à rádio esses dos anos oitenta, especialmente à Rádio Comercial em modo contínuo - manhãs a cargo do Jorge Pego e a pop do "TNT - Todos no Top", pequena pausa para almoço e, logo depois, já o vozeirão de Adelino Gonçalves se fazia a ouvir obrigatoriamente na apresentação de bandas e artistas a justificar o nome, simples, do programa: "Discoteca". 

A selecção musical, desprezada por muitos que tinham já na militância do "Som da Frente" da mesma rádio um pavilhão auditivo mono segmentado, sempre nos fascinou pela surpresa das sonoridades, nem todas, é certo, de irredutível qualidade, mas todas de pertinência activa em tempos em que a soul ou o funk anglo-saxónicos sugeriam estar perdidos. Ainda hoje não dispensamos os Ashford & Simpson, os Shalamar, os reinventados Kool & The Gang e Aretha Franklin ou os incontornáveis Imagination, uma verdadeira imagem de marca do programa. Todos nunca perfeitos, impossível, mas de que aprendemos a ouvir e a gostar. Obrigado por isso, Adelino Gonçalves. Paz!


domingo, 22 de junho de 2025

FAZ HOJE (24) ANOS #103





















SOFA SURFERS, Teatro Sá da Bandeira, Porto, 22 de Junho de 2001
 
. Jornal de Notícias, por José Miguel Gaspar, 24 de Junho de 2001, p. 43

quinta-feira, 19 de junho de 2025

FAZ HOJE (32) ANOS #102
















GNR, Estádio das Antas, Porto, 19 de Junho de 1993
. Público, por David Pontes, fotografia de Adelino Meireles, 21 de Junho de 1993,  p. 30


segunda-feira, 16 de junho de 2025

MARIA REIS + NUNCA MATES O MANDARIM + HORSEGIRL + PARCELS + DESTROYER + SQUID + TURNSTILE + FLOATING POINTS, Primavera Sound Porto, 14 de Junho de 2025

















O peso da idade, o nosso e o do próprio festival, encarregou-se de fomentar uma desmotivação crescente que se vem acentuando desde que no parque da cidade se instalou um palco inexpressivo, enorme e bruto, como recurso, dito, atractivo. O preço incompreensível dos bilhetes e de umas supostas taxas, tratou de acrescentar-lhe, à tal desmotivação, condicionantes a roçar a proibição e, por isso, nada como ser selectivo quanto baste. O dia de sábado foi, pois, o escolhido para fazer do festival um género de "circuito vintage", período onde foi possível prescindir da avantesma e insistir em roteiros à moda antiga. 

A tarde, solarenga e ventosa, começou no palco de sempre, o Super Bock, espaço perfeito para iniciar trajectos e despertar sensações. Coube a Maria Reis, que nos últimos tempos se têm aventurado nos teclados de suporte a Panda Bear, aplicar aquela dose adequada de protector anti-indiferença, uma presença nestas andanças que desde 2015, na versão (em pousio?) Pega Monstro, já não repetíamos. Foi na guitarra desenfreada, virtude eriçada de travo indie e crueza, que as canções escolhidas se confirmaram de validade e enorme potencial, apresentadas que foram na sua forma rasgada e acelerada. Uma reinvenção daquilo que um power trio pode e deve obter, no caso, com a enorme vantagem de ser cantado em português inteligente e, cada vez mais, essencial.

 

Rodando à direita, salvo seja, a imensidão do palco principal (sim, será sempre este) sugeria um risco questionável. Aos muito portuenses Nunca Mates o Mandarim foi atribuída a façanha de animar o maior dos relvados, mas o cálculo espertalhão afigurou-se um relativo êxito, ora não fossem as canções uma fornada regional de pop inofensiva e liceal que muitos dos amigalhaços e familiares já dominavam na boa. Percebe-se a aposta, repara-se na herança Veloso/Abrunhosa/Zambujo, sem que se escondam as virtudes de um passeio pimba que a versão de "Uma Bela Portuguesa" arriscou no ginçanço. Até os asiáticos gostam, como testemunhado à nossa frente, na adesão espontânea de um parzinho balançante. Parece que o trio vai editar novo álbum, servindo a oportunidade para a estreia de alguns inéditos típicos de que "Gin na Mealhada" é exemplar de semelhança paradigmática - "ficha tripla de indie-pop-rock almeja, um dia, cruzar-se com uma letra sua grafitada numa parede da baixa do Porto.". Se ainda não aconteceu, vai acontecer, mas ninguém quer saber. Tabénhe abelha...

 

Mais sério, sem que melhor, foi a estadia sensaborona das Horsegirl em cima do estrado. Dizem-nos que o álbum que gravaram no estúdio dos Wilco em Chicago, e que contou com a supervisão de Cate Le Bon, é até de especialidade recomendada, mas a dose trazida até ao Porto pareceu-nos bastante requentada. Algo amedrontadas, distantes, física e emocionalmente, o alinhamento só a espaços coartou uma dormência de culpa própria que talvez tenha uma explicação na viagem intercontinental do próprio dia. Mesmo assim, percebeu-se alguma da capacidade naif de texturar canções destinadas a um requisito de intimidade que um parque ao ar livre não permite e que, talvez, encontre melhor reduto num qualquer recanto de um bar ou blackbox das redondezas. Se isso vier a acontecer, confirmamos, desde já, a presença!

 

Com excepção do genial Brian Wilson em 2016, sejam bem-vindos ao maior sunset da história do festival! Os australianos Parcels arriscam-se a ter em Portugal um summer stage contínuo e imbatível de, ao vivo, propagarem uma festa de dimensão irresistível. Não se enganem, contudo, que o alinhamento, as sequências, as posturas e os trejeitos estão há muito treinados e entrosados num género de setlist instrumental estudada com tanto de rigor como de sabedoria. É funk, é pop orelhudo, é disco, é a chiqueza do baixo e da guitarra a la Bernard Edwards e Nile Rodgers exponenciadas ao limite do suportável e que convida, sem esforço, ao êxtase colectivo. Juntem-lhe muitas imagens em directo captadas por um sexto elemento com vocação e função de aumentar, pelo pormenor, as expressões e os sorrisos, mas fere a legitimidade do espectador ter que levar com o rodar contínuo da enorme câmara na frente de palco. A previsível convocatória da amiga Maro talvez fosse dispensável, sendo a festa agigantada por um abençoado banho de sol e só faltará, um dia, experimentar a versão nocturna do forrobodó. 

[Não haverá disponibilidade de imagens em movimento que, apesar de captadas, não são permitidas na divulgação por rigorosos e automáticos direitos de autor. Fica a fotografia... do atropelo.] 





 







A verdadeira instituição em que se transformaram os Destroyer do senhor Dan Bejar, um estatuto conferido a uma carreira de trinta anos ao serviço do prazer, não impediu que o horário escolhido fosse aquele em que as massas têm de ir para a fila do prego ou da bifana, o que acabou por ser uma bênção - quem alinhou, e não foram poucos, sabia ao que vinha, sabia ao que ia e sabia que era imperdível. Lembramos bem do bálsamo proporcionado pela banda no mesmo palco, o melhor, há nove anos atrás na tarde de Brian Wilson e logo depois de uma planante exibição de Cass McCombs e não seria difícil adivinhar que teríamos recompensa do mesmo calibre. Não duvidamos que muitos compraram bilhete só para os ver e nenhum, certamente, se arrependeu da aposta em tempos de apresentação de mais um magnífico álbum chamado "Dan's Boogie" e onde, como quase sempre, nos perguntamos "mas como é que isto resulta tão bem?" 

A figura de Bejar é, por si só, de inenarrável descrição na atitude em palco de cabelos ao vento e mão no bolso, camisa desalinhada e pequeno microfone agarrado quase sempre de forma aninhada. Depois é a alienação das letras das novas, e excelentes, canções como "Cataract Time" ou "Bologna" ou das velhinhas e obrigatórias "Kaputt" ou "Times Square", que se entrelaçam a um fundo instrumental inconfundível em que os solos de guitarra se misturam com o esticar de um trompete, um baixo hookiano e as pancadas de uma bateria, por sinal, demasiado chapadas. O acerto acústico foi, felizmente, crescendo mesmo a tempo de "The River", incandescente, poder-se-á dizer, balada em crescendo que bate e bate até aterrar não sabemos onde! Dirão os experts "que isto é música de nicho", pois que seja, não queremos outra e o festival, se ainda tem algum mérito, é mesmo o de proporcionar alguns milagres. Os Destroyer, ali e agora, foram a prova de que eles ainda continuam a acontecer. Sobrenatural!     

 

Não sabemos quando é que os Squid irão ter direito a palco principal num festival português. Será irrelevante, desde que a banda inglesa continue a comparecer por cá anos seguidos, felizmente, todas boas oportunidades para absorver de uma energia ainda pouco contaminada pela sobre-exposição. Cada vez são mais a agarrar-se à hélice de um projecto rotor propulsado a quinteto instrumental de eficácia certificada, capaz de levantar poeira e multiplicar empurrões a mil por minuto. Um caso sério e assertivo de como o rock ou o punk, mesmo que pós-qualquer coisa, continuam vibrantes e lutadores. Indispensáveis!


No olho do furacão, mesmo fazendo figurinha de estranho, estacamos no concerto dos Turnstile à procura de explicações para a enchente, os coros colectivos e o mosh. As respostas, às tantas científicas, talvez nãos sejam de dificuldade suprema, já que o estilo hardcore tem raízes antigas que, amiúde, crescem de forma desmesurada, mesmo que reavivado na fórmula e na onda. Percebemos, pois, que a banda americana é capaz de despachar cinco canções em dez minutos, que o faz sem falhas e cerimónias, mas já não temos filtros activos para aguentar tamanho turbilhão. Baixem o torniquete p.f.
  

Chama-se Samuel Shepherd, é um inglês de quase quarenta anos e é especialista em música electrónica nas suas variantes de produção, composição, mistura e djing. Nessa múltipla dimensão, passou a lançar discos como Floating Points a que nunca ligamos pevide, mas em 2021 foi dele o projecto de juntar o saxofonista de jazz Pharoah Sanders (1940-2022) à London Synphony Orchestra, registando em estúdio composições suas em nove movimentos a que chamou "Promises". Um monumento!

Foi, assim, em sua homenagem e também para lhe fazer uma vénia à distância, que aguentamos até às três da manhã, mesmo sabendo que do palco do recinto relvado nada se ouviria da referida obra prima. De lá, envolvido por luzes e imagens de recortado bom gosto, foi (d)isto que se serviu...

sábado, 14 de junho de 2025

PULP, HINO NORTENHO!

Como já devem ter percebido, os Pulp lançaram a semana passada pela Rough Trade um disco novo chamado "More". É o regresso aos originais ao fim de vinte e quatro anos, seguindo-se a "We Love Life" de 2001, comportando onze temas entre os quais destacamos "Sunset", que encerra o alinhamento, e conta com a ajuda do amigo Richard Hawley e também "The Hymn of The North", com piano de Chilly Gonzales, outro amigo de abraço de Jarvis Cocker. 

O referido "The Hymn of The North" foi, pela primeira vez, tocado ao vivo em Julho do ano passado e não será difícil prever que ele se transformará num dos clássicos da banda, ao jeito de um "The Trees" ou "Babies". Enorme canção, fantástica lírica, monumental orquestração! 

Pensar que há um ano atrás os Pulp passaram, cintilantes, pelo Parque da Cidade num dos melhores concertos de 2024, espectáculo integrado num festival em nítida e lamentável decadência. Espera-se, mesmo assim, que no dia de hoje ainda por lá brilhe uma qualquer estrela... nortenha!

quarta-feira, 11 de junho de 2025

BRIAN WILSON (1942-2025)















Por estes dias, há nove anos atrás, um nervosismo dos bons não nos largava. Brian Wilson visitava pela primeira, e única, vez a cidade no âmbito da edição do Primavera Sound Porto e o milagre aconteceu apesar da sua já débil condição física: clima solarengo, brisa fresca, canções cantadas por todas as gerações presentes e um alinhamento para não mais esquecer. Estava, finalmente, concretizado um sonho e uma homenagem há muito suspirada

Os The Beach Boys sempre foram desprezados pela contenda Beatles/Stones e esse desleixo permitiu-lhes engrandecer um culto, de certa maneira, mais exigente e refinado que ao longo de décadas fomos escavando e descobrindo de forma metódica. A cada compilação, a cada sessão esquecida, a cada disco novo, o génio de Brian Wilson como que transbordava numa actualidade e sagacidade surpreendentes. Ter estado naquele relvado foi a confirmação tridimensional que, afinal, a clamada eternidade só está ao alcance de alguns predestinados. Obrigado por ela e por tudo o resto, Mr. Wilson. Peace!






UAUU #744

MANSUR BROWN, DIÁRIO DE VIAGEM AO VIVO!






















A guitarra do britânico Mansur Brown voltou a fazer das suas e o respectivo registo fará parte de "Rihla" (que significa viagem em árabe), álbum com data de saída no primeiro dia de Agosto. Trata-se, segundo o próprio, do seu trabalho mais verdadeiro e honesto, inventando música livre e sem contenções, já que reúne ilimitadas influências de género ou rótulo. Uma viagem em modo de "díário de bordo" de uma vida artística já com mais de dez anos, mas, verdadeiramente, intensa. Uma primeira amostra do "trajecto" está já disponível para teste. 

Cerca de um mês antes, a 5 de Julho, Mansur será o primeiro dos artistas a subir ao coreto do jardim Basílio Teles no âmbito da edição do Matosinhos em Jazz de 2005, evento recheado de outros apelos imperdíveis (Amaro Freitas, Laura Gasparotti, Allysha Joy, etc.) a que valerá a pena comparecer... gratuitamente!

segunda-feira, 9 de junho de 2025

SLY STONE (1943-2025)













Chegamos aos Sly and the Family Stone como muitos - pela fama do disco "There's a Riot Going On" de 1971, pedrada agitadora saída da mente rodopiante de Sly Stone e que se transformou num mito do soul, do funk e até de algum psicadelismo que Prince nunca rejeitou e que Stevie Wonder compreendeu. 

Fomos reunindo de olhos fechados, ao longo dos anos, pequenas rodelas com a inscrição da banda, sabendo que, de qualquer das maneiras, num dos seus lados ou até nos dois, algo de inovador e provocador nos seria dado a ouvir. É o caso de "Time For Livin", uma das muitas canções com aquele toque... e a nossa preferência. 

Sly Stone deixou-nos no dia de hoje. As rodelas, essas, vão continuar sempre a rodar, tal como a grande parte da sua vida que está desde há meses em documentário a que vamos, um destes dias, deitar olho. Peace, Sly! 


sexta-feira, 6 de junho de 2025

FAZ HOJE (24) ANOS #101





















DAVID BYRNE, Coliseu de Lisboa, 6 de Junho de 2001
 
. Diário de Notícias, por Nuno Galopim, 8 de Junho de 2001, p. 40 
. Jornal de Notícias, 8 de Junho de 2001, p. 41


BIG THIEF, DOBRAM-SE AFINIDADES!

                               Fotografia: Genesis Báez






















Um disco-regresso dos Big Thief está apontado para Setembro via 4AD, o que é boa notícia. Sinceramente, e pela afinidade que mantemos, fomos dos que tememos que a banda iria entrar em pousio ou até em ruptura depois da saída do baixista Max Oleartchik no verão passado, uma incerteza que se foi acumulando com adiamento de concertos, reforço de álbuns e projectos a solo do restante trio e tentativas, aparentemente, abortadas de integração de novos músicos. 

Chama-se "Double Infinity", nome de uma das canções e dele já se ouve "Incomprehensible", tema assombroso que abre o disco. Foi registado em modo rápido e sem filtros durante três semanas no Power Station Studio de Nova Iorque no Inverno passado, período onde contaram com a ajuda do produtor Dom Monks, colaborador de longa data da banda. No auxílio intenso - houve dias de nove horas de prática - compareceram, entre outros, a vocalista e compositora Alena Spanger, o baterista Caleb Michel, a maravilhosa Hannah Cohen e o multifacetado Laraaji que canta em "Grandmother", um dos nove originais seleccionados para o alinhamento. 

O novo álbum, o sexto, segue-se a "Dragon New Warm Mountain I Believe in You" de 2022 que teve apresentação ao vivo por cá, mas sem chegada ao Porto. Pode ser que, com a digressão "Sommersault Slide 360" a iniciar em Setembro pela América do Norte e a previsível transposição para Europa, se concretize uma visita que já faz falta... Seria incompreensível o contrário.

quinta-feira, 5 de junho de 2025

DUETOS IMPROVÁVEIS #305

JAMES YORKSTON & NINA PERSSON 
A Moment Longer (Yorkston) 
Álbum "Songs for Nina and Johanna", Domino Record Co.
Inglaterra, Agosto de 2025

MOHAMMAD SYFKHAN + FIDJU KITXORA + KHANA BIERBOOD + USE KNIFE, Serralves em Festa, Porto, 1 de Junho de 2025

O curdo Mohammad Syfkhan toca bouzouki, instrumento popular no médio oriente de onde é originário. Não foi difícil agitar um início de tarde soalheiro com a sua alegria e festa, juntando à execução primorosa das cordas um parceiro, residente em Portugal, para o acompanhar na percussão, mas também uma base pré-gravada. Foi sempre de forma atabalhoada e quase impetuosa que, logo depois de uma curta introdução de acordes a cada tema, da máquina saíram os beats e tablas a compasso para engrossar aquele ritmo sedutor do oriente. Simpático, convidou todos à dança a que uns responderam de imediato, embora outros se tenham quedado pelo refestelo da relva. Todos, seja como for, lhe bateram muitas palmas. Irresistível!

 

O trio que se assume como Fidju Kitxora tem em Cabo Verde um laboratório vivo onde a diáspora, o colonialismo, a emigração ou o preconceito funcionam como segmentação de memória, mas, acima de tudo, de luta. O projecto comandado por André China, com base em Lisboa, serve-se da música para que as suas pesquisas se espalhem e anunciem como apelos à libertação pela assemblagem do funaná ou do semba. Esses ritmos africanos são, ainda hoje, despertadores de energias e fortes catalisadores de dança e folia que rapidamente se instalaram no antigo espaço de ténis da casa muito por culpa das travessuras do baterista e guitarrista em contínua acção. A chegada de um dançarino ao palco para uma lenta perfomance de homenagem às crianças indefesas - a todas, certamente às de Gaza, remetendo também para o nome da banda que em criolo se pode associar a "filho choroso" - haveria de resultar numa agitada e poeirenta folia colectiva. Está tudo em "Racodja", álbum do ano passado, mas o conselho é que seja ao vivo que a plenitude da façanha seja sentida. Um fulgor!

 

Sol, brisa e mais sol. Não há nada para disfarçar nos tailandeses Khana Bierbood a não ser a falta de areia e mar asiáticos que os rodeava quando começaram em 2012. De resto, é surf-rock vintage feito a rigor por personagens quase saídos do Dragonball, carregando como deve ser em todos os trejeitos e linhas desse género quase septuagenário. Baixo ondulante, teclado roufenho e muitos solos de guitarra de filtro wah-wah foram moldando as canções de letras indecifráveis, o que para o caso não teve nenhuma importância. Mais que entretido, divertido!

 

Um iraquiano e dois belgas juntaram-se sob o nome de Use Knife para engrossarem uma sonoridade de hibridez misteriosa. Um jogo sonoro oriente/ocidente que confunde géneros e que tanto pode remeter para alguma da crueza do electro como para a fragilidade da música ou canto árabes. Desse atrito resultou uma pesada camada de instrumentação que, mesmo assim, recebeu a aprovação dos muitos resistentes de uma festa diversa e inclusiva. Para o ano, espera-se, há mais!

terça-feira, 3 de junho de 2025

ECHT! + SPIRITUALIZED, Serralves em Festa, Porto, 31 de Maio de 2025

A estreia portuguesa dos ECHT! só aconteceu ao fim de quase uma década de actividade. Centrados em Bruxelas, adoptaram o nome a partir de uma expressão do dialecto brabantino da cidade, o que, em tradução livre inglesa, significa, "real thing", sendo apresentados como um género de enérgico DJ set ao vivo, fundindo jazz, hip hop eletrónico e algum psicadelismo. A versão trazida ao Porto, contudo, deu primazia ao velhinho drum'n'bass e até ao acid-house, o que foi desde logo bem recebido pela plateia já faminta de uma agitação que só costuma acontecer mais tarde na madrugada, antecipação que foi engrossando e alargando o recinto de dança. 

Pena que, na frente de palco, o protagonismo dos seguranças tenha causada algum embaraço com a colocação de grades em pleno concerto ou sobrancerias bacocas quanto a uma bandeira e kufiya palestinianos trazidos para o palco e que só o assentimento e atenção da banda conseguiu manter e promover... Indelicadezas que não impediram a consagração e os aplausos merecidos.

 

Em 2012, na edição de estreia do Primavera Sound fora de Espanha, o Porto recebeu no parque da cidade uma verdadeira e abençoada catadupa de bandas e artistas. Os Spiritualized fizeram parte desse alinhamento, agendados para o sábado de muita chuva e, nessa altura, apostamos noutros estrados, mas lembramos bem o fundo sonoro do concerto a pairar, inconsequente, entre a neblina húmida instalada. "Fica para a próxima", sem que o regresso ao norte (Paredes de Coura, 2019) tenha conseguido despertar a nossa vontade em comparecer, o que a insistência gratuita promovida por Serralves relembrou na motivação. Helas... 

Se os vinte primeiros minutos afiguravam uma torrente prometedora - "Hey Jane" e "She Kissed Me (It Felt Like a Hit)" de enfiada -, certo é que Jason Pierce e companhia resvalaram, depois, para uma sequência infindável de baladas arrastadas por solos de guitarra a que nem mesmo o excelente trio vocal de fundo conseguiu disfarçar na maçada. Talvez a excepção tenha sido o longo "Cop Shoot Cop…", tema que encerra "Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space", álbum mítico de 1997, sem que a decepção tenha desaparecido até ao derradeiro acorde. O tal fundo sonoro de 2012 mantêm-se, afinal, espiritualmente cristalizado.

segunda-feira, 2 de junho de 2025

NADAH EL SHAZLY + JULES REIDY + TRÊS TRISTES TIGRES + THE HELIOCENTRICS, Serralves em Festa, Porto, 30 de Maio de 2025

Entramos na festa mesmo a tempo da primeira descoberta - a egípcia Nadah El Shazly aprontava-se para iniciar o concerto no palco tenístico já bem composto, isto é, de público sentado na bancada, expectante. Demorou um pouco o acerto da voz e da sobreposição electrónica, mas logo que o nivelamento se estabeleceu foi possível desfrutar de uma simbiose refinada de traços árabes, a que uma harpista acrescentou todo um mistério flutuante. Seria de Shazly a primeira lembrança para a tragédia de Gaza e da Palestina, uma evocação que se viria a revelar como constante ao longo do fim de semana festivo e que sugere que os próximos festivais de primavera e verão serão de luta... como se impõe!

 

Do jovem Jules Reidy não saiu uma única palavra de cortesia ou de ocasião. Também não foi preciso. A não ser um "thank you" final, o que se ouviu e imaginou em contínuo foi um sublime e fino jogo de guitarra eléctrica, primeiro, e semi-acústica, depois, camadas de subtileza adornadas por leves líricas onde a melodia quase se contrai pelo inesperado do arrojo samplado. Na escuridão das Azinheiras, o momento serviu para se destapar "Ghost/Spirit", álbum saído em Fevereiro que gravou para a Thrill Jockey Records, momento de cinematografia sonora saborosa e futurista que as fumarolas ondulantes projectaram no sombreado. O respeito, silêncio e fixação dos espectadores "agarrados" deveriam ser medalhados. Obscuro, nunca um adjectivo fez tanto sentido.

 

Os Três Tristes Tigres vão ter álbum novo ("Arca") lá para Setembro e não se pode, por isso, desperdiçar pontos em casa, o que palco enorme do Prado se afigurava como desafiante. A banda contínua contemporânea, incomodada quanto baste, remexendo em antiguidades de corte e cose reciclado e incisivo que se alinham de forma surpreendente com as novas canções. Sem tempo para acústicas, é ainda a guitarra inconfundível de Alexandre Soares a comandar a turba numa onda rock de alguma dureza, o que deve ter desiludido quem se preparava para cantar em coro velhos êxitos, não muitos. Duro, mas necessário, o apelo à indignação quanto à triste situação palestiniana... 

 

Os The Heliocentrics têm sido visita nortenha desde, salvo o erro, o saudoso Milhões de Festa (2018?) e até um desafiante filme/concerto no Curtas de Vila do Conce (2019). De ambas as vezes pecamos e não comparecemos. Seria indesculpável cair no mesmo erro e, por isso, fila da frente! 

O colectivo londrino, que vai refazendo músicos e vocalistas, têm no mentor e baterista Malcom Catto o pino rotundo de uma centrifugação de géneros, do jazz ao prog psicadélico, que logo em dezoito minutos de abertura se confirmou como notável. A enchente auditiva teve depois na irrequieta Barbora Patkova na frente de palco, um vozeirão que regulou a extensão sonora, para bem e para o mal, já que nos pareceu que é, e foi, na magistral complementaridade e crescendo dos instrumentos que o grupo atinge a melhor e mais vibrante onda. De qualquer das maneiras, muito bom!