terça-feira, 22 de dezembro de 2009

VASCULHAR #14



OPERAÇÃO PRESENÇA / NATAL 71
OPERAÇÃO PRESENÇA / NATAL 73

O Movimento Nacional Feminino, fundado em 1961, era uma organização de mulheres em torno do apoio aos nossos militares em guerra nas colónias. Realizava visitas, oferecia maços de tabaco e isqueiros, santinhos e medalhas e também discos! Estes dois LP’s, ambos denominados “Operação Presença”, referem-se ao Natal de 1971 e 1973 e a ideia original por trás destes projectos está contada na contra-capa do exemplar “Natal 71”. No “Diário de Notícias” de 25 Abril passado, o jornalista Fernando Madaíl faz a história e adianta um número: foram prensados 300 mil exemplares. Destaca o que parece óbvio e que a própria Hermínia Silva, logo no início do primeiro disco, acaba por dizer: “Aqui para nós, eu sei que não falta quem ainda esteja a pensar: 'mas para que raio quero eu um disco, se nem tenho pick-up?'. De facto, mesmo a malta com gira-discos devia escolher outras músicas”, sugere o mesmo jornalista. É que o conteúdo, apesar dos nomes sonantes (Eusébio, Amália, Artur Agostinho ou o Inpector Varatojo…), acaba por ser mesmo demasiado triste e até ofensivo para quem, longe da família e do país, defendia o indefensável. Quando ouvimos o cantor Paulo Machado a interpretar o tema “Hoje Mais Feliz Que Nunca” (!!!), a Florbela Queirós a cantar o “Franjinhas” ou algumas das anedotas secas contados pelo Francisco Nicholson e Armando Cortez, devia dar vontade de partir o vinil ao meio. Há, no entanto, uma excepção – um tema de Tomás Tembe de fazer inveja aos Vampire Wekend! Não são assim de estranhar algumas das reacções dos militares da altura que a blogosfera vai registando, embora haja alguns que reconhecem o valor histórico e documental do disco.
Interessante é mesmo o embrulho, a única razão que esteve na base da nossa aquisição. Trata-se de uma capa plástica com um desenho original impresso a quente da autoria do pintor e mestre Manuel Lapa, responsável, por exemplo, por alguns dos murais do Museu de Arte Popular de Lisboa ou desenhos para as tapeçarias da Reitoria da Universidade de Lisboa. Professor no IADE, o pintor fez parte do chamado “Pátio dos Artistas” de Campo de Ourique, juntamente com os escultores António Duarte, Leopoldo de Almeida, Roque Gameiro e o arquitecto Vítor Pala. O tal plástico envolve dois simples cartões, que na parte traseira apresenta uma ilustração alusiva do designer Luis Duran, conhecido pela sua actual ligação aos CTT e à filatelia portuguesa.



Quanto ao segundo disco, trata-se de uma iniciativa ainda menos interessante. O conteúdo resume-se a trechos musicais das colónias e distritos portugueses com alguns versos declamados por Simone de Oliveira, Laura Alves ou o Paco Bandeira que chega a cantar o seu “A Minha Cidade (Ò Elvas)" numa versão adaptada às circunstâncias… tristes. Como enaltece, com falsa moral, o Ministro da Defesa, General Sá Viana Rebelo, no final do primeiro disco “nada do que se fez em África se irá perder (…)” e que cada militar devia sentir orgulho na Nação e pensar “Custou-me bastante mas valeu a pena (…)”. O esforço que estes vinis representam, são a prova da inutilidade de uma guerra que a maioria dos portugueses nunca compreendeu.

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