de Nick Moran. Reino Unido; Burning Wheel Productions/Sky Cinema, 2021
TV Cine Edition, Portugal, arquivo (2023)
Em meados dos anos oitenta, a figura, melhor, o figurão Alan McGee era um nome que víamos repetido a cada edição do jornal Blitz. A razão da insistência semanal passava sempre por uma nova banda, um novo artista, uma nova visão, um novo "de olhão" por trás da Creation Records, editora que fundou, de forma independente e arriscada, emparedada por lobbies e ratoeiras das grandes majors de discos.
O jeito e a habilidade na promoção de bandas como Primal Scream, Teenage Fanclub ou os My Bloody Valentine deram-lhe o estatuto de guru da indústria mas também o rótulo de barão infame na certeza que, com a sua postura e atitude, a cultura e o próprio comércio da música se alteraram significativamente. A história, plena de exageros e loucuras, contou-a na primeira pessoa na autobiografia "Creation Stories" editada em 2013 já depois da retirada profissional. Pegando nessas confissões, os produtores Dean Cavanagh e Irvine Welsh, sim, o de "Trainspotting", escreveram o enredo para um filme, previsivelmente, difícil e controverso que, sem passar pelas salas, acabou directamente em televisão depois da estreia mundial no Glasgow Film Festival de 2021.
O “Rocks” dos referidos Primal Scream preenche o genérico de forma preventiva para que não haja enganos quanto ao que aí vem - uma infância e juventude cedo montadas em desenfreadas e inocentes cavalgadas em lojas de discos e discotecas escocesas, no definhar dos The Sex Pistols ou na descoberta de David “Rebel, Rebel” Bowie. A família, fortemente castradora na figura do pai, cedo olhou de lado tamanha afronta das vestes e cortes de cabelo, preocupada com um emprego condigno que não passava por ser baixista de uma banda rock (Laughing Apple) e rumar a Londres. Começava, a sério, um carrossel de acasos de que a droga serviria como força motriz poucas vezes intermitente.
A personagem interpretada pelo excelente Ewen Bremner, sim, também de “Trainspotting”, afigura-se, desde logo, como arrebatadora na sua frenética e continua postura de alucinação. Fundar a editora independente Creation Records com os amigos era, pois, só mais um passo no escuro de uma trajectória condenada ao fracasso e à insolvência que, mesmo assim, provocaria a inveja das concorrentes institucionais logo interessadas em “engrandecer” os My Bloody Valentine ou os Jesus & Mary Chain. McGee, resistente e quase sempre na pré-ruína pela teimosia de Kevin Shields dos Primal Scream e a quem prometeu que seriam maiores que os U2, metia-se acid house dentro por Manchester antes de todos os outros, apresentando trunfos ganhadores como os Spaceman 3 e fazendo, mais uma vez, história. Entretanto, os discos “Scremadelica” dos Primal Scream e “Loveless” dos My Bloody Valentine triunfavam nos tops e na imprensa.
Ao bafejado “sacaninha ruivo” o destino estava traçado. A reconstituição do encontro ocasional com uns tais de proto-Oasis aquando de uma estadia de regresso a Glasgow pela morte da mãe, é mesmo dos melhores momentos do filme, não tanto pelo inusitado da situação mas pela, já aí, confirmação de um certo carácter Gallanger. Contratados quase na hora, “Definitly Maybe” venderia para cima de milhões e, esses sim, quase que seriam maiores que os U2, embora a história da ligação de McGee aos irmãos Gallanger tenha diversas variações e mossas.
Feita em Los Angeles e já na reforma, há uma entrevista biográfica que percorre a película em jeito de confessionário de crimes e de muita lábia que a venda milionária da Creation à Sony Records permitiu prolongar num género de paraíso dourado. Incorrigível, a desgraça da dependência e das más companhias acabariam em esgotamento, terapias e reabilitações de um “pintas” que, quase limpo, seria arrastado por Malcom McClaren para a política, sim, a política… inglesa! Ver um “punk” transformado em “hipster” televisionado ao lado de um Tony Blair vendido e ganhador é, talvez, das maiores surpresas de um filme irregular sobre uma geração mas não sobre toda a sua música. Ufa, ainda bem!
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