sábado, 29 de abril de 2023

UAUU #685

M. WARD, CANÇÕES DE SONHO!





















Para M. Ward escrever novas canções precisa de sonhar, previamente, com elas. É o caso de "Supernatural Thing", tema que acabou a dar nome a um álbum a sair pela ANTI-Records no final de Junho e que resulta de um sonho sobre Elvis Presley... O video ficou a cargo de Joel Trussell, animador californiano que tinha já feito o mesmo com "The First Time I Ran Way" em 2012. 

Entre as dez canções do novo disco, duas são versões ("I Can't Give Everything Away" de David Bowie, com a ajuda de Jim James e Kelly Pratt, e "Story Of An Artist" de Daniel Johnston), duas tem colaboração das First Aid Kit ("Too Young To Die" e "Engine 5") e há a ajuda de Scott McMicken, Neko Case, Gabriele Kahan e Shovels & Rope noutras tantas. 

M. Ward toca no M.Ou.Co., Porto, no dia 27 de Maio.

sexta-feira, 28 de abril de 2023

GABRIEL DA ROSA, SAMBA DA CASA!





















A curiosa história do brasileiro Gabriel da Rosa é um sinal dos nossos tempos de multiculturalismo crescente - nascido em Cruz Alta no Rio Grande do Sul, a juventude não passou ao lado do punk e do garage com os amigos tendo até formado uma banda chamada Name That Band ao lado de Beto Kauer na bateria que em 2013 alcançou o palco do Lollapalooza de São Paulo. Mas a relação conflituosa com a editora levou-o a abandonar o país e a aportar a Los Angeles para trabalhar num bar onde a noticia que fazia música se espalhou, chegando aos ouvidos dos responsáveis da Stones Throw Records, editora independente da cidade habituada a arriscar.

A proposta de gravação de um álbum era, pois, aliciante. Mas que tipo de música? A opção por um disco de samba e bossa nova foi incentivada por Pedro Dom, outro amigo que também se estabelecera em Los Angeles para colaborar com Rodrigo Amarante ou Seu Jorge, e que viria a produzir "É o Que a Casa Oferece". A estreia pela referida editora, datada de Fevereiro último, é assim uma travessia autobiográfica pela infância rural e aventuras de viagens pelo mundo com paladar tradicional no samba e bossa nova e que teve mistura final a cargo de Mário Caldato. O desenho de capa pertence ao ilustrador brasileiro Hugo Bernier, actualmente radicado em Montreal. 

Se é certo que não há por aqui nada de novo a não ser música bem feita, aos nove temas originais da Rosa juntou agora duas versões para as The Lagniappe Sessions onde escolheu "Falsa Baiana" de Geraldo Pereira e "Água de Beber" de Tom Jobim de Vinicius de Moraes para se recrear e nos entreter.  



DUETOS IMPROVÁVEIS #271

THUNDERCAT & TAME IMPALA 
"No More Lies" (Bruner & Parker) 
Brainfeeder Records, E.U.A., Abril de 2023

quinta-feira, 27 de abril de 2023

KEVIN MORBY, MAIS FOTOGRAFIAS!

À excelência do álbum "This Is A Photograph" de Kevin Morby editado em 2022 será acrescentada uma série de seis novas canções e três reinterpretações de temas aí incluídos. O processo criativo então desenvolvido prolonga-se, por isso, em "More Phtographs (A Continuum)" que a Dead Oceans fará sair no final de Maio, uma forma de se libertar em definitivo do espaço e tempo inspiradores das canções, não deixando nada para trás antes de se aventurar em novos desafios. Nós agradecemos. 

Kevin Morby têm concerto marcado para o dia 6 de Julho, quinta-feira, no Hard Club portuense.


BILL ORCUTT GUITAR QUARTET DE SECRETÁRIA!

quarta-feira, 26 de abril de 2023

AROOJ AFTAB NO VILA FLOR!

















A paquistanesa Arooj Aftab, que nos visitou no final do ano passado, parece ter bilhete de ida e volta contínuo para Portugal já que está marcado um outro concerto, desta vez único, para o Centro Cultural Vila Flor de Guimarães no dia 4 de Julho próximo, terça-feira. 

Apesar do monumental disco recentemente editado com Vijay Iyer e Shahzad Ismaily, Aftab terá a seu lado o guitarrista Gyan Shankar Riley, duo que se apresentou de forma sublime na Casa da Música em Novembro, para desfilar o reportório do maravilhoso "Vulture Prince" mas que não deve deixar de fora o extra magistral "Udhero Na". 


JULIE BYRNE, REGRESSO CUSTOSO!





















Em 2017 a bonita menina Julie Byrne editou o álbum "Not Even Hapiness" a que associou uma consequente digressão que aterrou em Braga em 2018 para uma noite esgotada de ternura. Ainda nesse ano e ao lado de Eric Littmann, gravou "Spain", tema que fez parte da excelente compilação "Dreams" onde participaram outros artistas como Bing & Ruth, Yumi Zouma ou Ricky Eat Acid sob selo da editora novaiorquina Cascine e da Stadiums & Shrine. Desde aí, o eclipse adensou-se. 

E assim, ao fim de seis anos, eis que a notícia de um novo disco se confirma mesmo que nebulosa - "The Greater Wings" será editado pela Ghostly International em Julho e é o resultado sofrido de uma aventura iniciada em 2020 com o já referido amigo Littmann, parceiro criativo e produtor, em sessões caseiras em Chicago que continuaram em Nova Iorque com a colaboração da harpista Marilu Donovan aka Leya. O embrião sonoro aportou depois a Los Angeles onde o violinista Jake Falby lhe acrescentou os arranjos de outras cordas mas a morte súbita de Littmann, em Junho de 2021, haveria de fazer hibernar, enclausurado, o projecto. A custo, Byrne só no Inverno seguinte haveria de o retomar com a ajuda do produtor Alex Somers no estúdio Catskills, o primeiro de âmbito profissional que experimentou, e onde se maturou um compromisso difícil entre o que já estava registado e as novas abordagens artísticas. 

A elevada estima e o pesar pelo amigo perdido, longe de esquecidas, serviram de motivação e seiva para continuar a fortalecer uma opção de vida que ela própria cantou no maravilhoso "I Live Now As A Singer" que encerrava o disco de estreia. Com "Summer Glass", o primeiro dos novos temas a dar-se a ouvir, está dado o primeiro passo no retomar do bom caminho.


terça-feira, 25 de abril de 2023

SINGLES #54





















EMÍLIO DOS SANTOS 
Grândola Vila Morena / É Preciso Dividir o Pão 
Moçambique: E.S.R. 008, 45 rpm, s/d 
Já há uns anos, num sábado de manhã pela Feira da Vandoma, a antiga, a das Fontainhas, uma imagem marcante e vistosa chamou-nos atenção numa montanha de singles de música popular portuguesa com incidência no fado. Rapidamente na mão, só quando viramos a capa deparamos com alguns dos pormenores estranhos - uma versão de "Grândola Vila Morena" de José Afonso a cargo de Emílio dos Santos com edição em Lourenço Marques, Moçambique! A editora, a ESR, era também um nome por nós desconhecido a que se juntava um "É Preciso Dividir o Pão" no lado B. Compra feita e já em casa, tratamos de ouvir o seu conteúdo com o propósito de lhe fazer a história possível mas, tal como tantos outros singles da colecção, a pretensão ficou para as calendas gregas. Chegou hoje o melhor dia, inicial e limpo, para lhe fazer justiça. 

A biografia de Emílio dos Santos foi, ao de leve, contada no blog Penafiel Terra Nossa em 2011 mas desde aí, na consulta exaustiva que fizemos, não se conhecem mais pormenores. Nascido em Vila Nova de Fôz Coa (1941), imigrou para Penafiel (1957) onde começou a dar nas vistas nas cantorias e rábulas e, rapidamente, se fixou no Porto nos anos sessenta. O "Foz Côa", como era apelidado, tornou-se profissional já depois de gravar um primeiro disco com o maestro Resende Dias. Seguiram-se, aparentemente, novas aventuras por Lisboa e África e o posterior regresso a Penafiel como empresário do som e da música. Na contracapa, que acima se reproduz, surge uma fotografia de uma sua actuação no que parece ser um casino ou festa de gala acompanhada por um conjunto de quatro músicos. 

A sigla ESR, que deverá ser um acrónimo de Emílio Santos Records, não teve muitos discos editados (este é o número 8) mas há pelo menos três singles e um álbum com sede Moçambique e, supostamente, em Lourenço Marques por volta de 1974. Deverá ter sido o selo que o cantor por lá fundou para se lançar no negócio de cariz popular onde se inclui um tema de homenagem à terra natal. Não existem no seu reportório outras versões de teor político ou de intervenção como as que fazem parte desta rodela pequena, sem referências, contudo, ao autor do desenho/design ou ao estúdio de gravação, apesar da nomeação do técnico de som (Ricardo Branco) e dos arranjos e direcção musical (Tony Viana), coautor com José Vigário S. Silva da canção "É Preciso Dividir o Pão". Da data correcta, propósitos e circunstâncias desta gravação, não são conhecidos mais pormenores, não existindo até hoje a reprodução dos seus dois temas em nenhum formato digital. Vamos lá, então, pôr o disco a rodar, mesmo que as suas condições de conservação e reprodução não sejam as ideais.

A versão de José Afonso, longe da sumptuosidade e cadência orquestral com que, por exemplo, Amália Rodrigues se aventurou pela mesma época, é uma boa surpresa muito à custa de um riff curioso de uma só guitarra e de um tambor seco para substituir aquele mítico e original arrastar dos pés na gravilha, transparecendo mais descomprometida e informal mas de captação rudimentar e de recursos, notoriamente, limitados. No lado B, a canção "É Preciso Dividir o Pão" junta-se a tantas outras que floresceram numa onda cantada pelos chamados "baladeiros da revolução" sobre a urgência de justiça e igualdade que, neste caso, nos parece de sincera acutilância e natural ingenuidade atendendo aos tempos de esperança que se deveriam, então, viver. Singulares, contudo, os já significativos "remoques" dirigidos aos políticos que a lírica comporta - por exemplo, "mandar não custa se a miséria impera" ou "é preciso avisar toda gente, é preciso estender a cultura"... Nem mais!


segunda-feira, 24 de abril de 2023

MARC RIBOT: THE JAZZ-BINS, Ovar Jazz, Centro de Arte de Ovar, 21 de Abril de 2023

O guitarrista Marc Bibot é hoje um dos expoentes do jazz avant garde e de um art rock nunca datado. Nessas facetas vibrantes, realizou já várias visitas a Portugal onde confirmou os dotes e pergaminhos de uma carreira com mais de quarenta anos sem que, contudo, essa longevidade seja sinal de um qualquer comodismo. O projecto de The Jazz-Bins é o perfeito exemplo dessa inquietude mas também de um regresso às origens. No início da carreira, Ribot fez uma digressão, incluindo a Europa, para acompanhar Brother Jack McDuff, lenda do orgão de jazz, afeiçoando-se à sonoridade Soul Jazz que agora retoma ao lado de Greg Lewis, moderno virtuoso do orgão Hammond b3, e do baterista Joe Dyson. Como, Ribot a tocar funk-jazz e blues

Sim, sim, e sacrilégios bafientos aparte, a única data portuguesa da tournée europeia foi aproveitada por uma bem preenchida plateia mas, caramba, merecia lotação esgotada! Logo ao primeiro impacto de um groove prontamente instalado, já um solo de bateria de outro mundo tinha permeado uma cumplicidade flutuante que se estendeu a temas de Ornette Coleman ("Times Square") e, pareceu-nos, Lou Reed ("Chelsea Girls"?) ou a um sugestivo gospel onde Greg Lewis retirou do teclado vintage de madeira uma distorção abençoada e tenebrosa. 

O jogo instrumental do trio, só ao alcance de músicos desta tarimba, mereceu sempre um comando do mestre da guitarra sem que, contudo, essa supervisão se tivesse assumido como uma liderança sobranceira mas sim numa comunhão monumental e espiritual de raridade notória e, por isso, única. Sem disco gravado, foi essa dádiva complementar que um amigo, em conversa no átrio já depois do final, pediu a um Ribot bem disposto e resignado - "I should do that...". Vamos ficar, em pulgas, à espera!

sexta-feira, 21 de abril de 2023

SQUID, UMA PEDRA!





















Os brilhantes Squid editam a 9 de Junho o segundo álbum de originais pela Warp Records a que chamaram "O Monolith". O registo ocorreu em Wiltshire, sudoeste de Inglaterra, na primavera passada e aparenta continuar o manifesto futurista de resistência e agitação evocado com a estreia, em 2021, no disco "Bright Green Field". 

O evidente espírito combativo está presente nos dois temas já divulgados - em "Swing (In a Dream)", de Fevereiro último, e no mais recente "Undergrowth", com video a cargo de Louis Borlaise, um dos guitarristas da banda, e um videojogo inventado por Frank Force, especialista que trabalhou com o grupo no desenvolvimento da aplicação que sincroniza a música e os movimentos interactivos. Experimentem

Os Squid, que tocaram maravilhosamente no Parque da Cidade o ano passado no mesmo dia que os Dry Cleaning, estreiam-se em Paredes de Coura a 16 de Agosto, quarta-feira, no primeiro dia do festival. Adivinhem que está, nessa data, no alinhamento? Claro, os Dry Cleaning. (Vai ser) Uma pedra!



quinta-feira, 20 de abril de 2023

DUETOS IMPROVÁVEIS #270

NATALIE MERCHANT & ABENA KOOMSON-DAVIS 
Big Girls (Merchant) 
Àlbum "Keep Your Courage", Nonesuch Records
E.U.A., Abril de 2023

ALABASTER DEPLUME, NOVO HINO!





















Um novo single de Alabaster Deplume terá edição, agora em moda, no formato flexi-disc de 7" a 19 de Maio pela International Anthem. Trata-se do tema "Salty Road Dogs Victory Anthem", um género de hino de quatro minutos em homenagem a todos os que, simplesmente, vão desfrutando da vida, o que já não é pouco. Na versão digital será acrescentado ainda um outro inédito chamado "Child Playing in the Forbidden Ruins". 

A sua composição ocorreu durante o soundcheck de um concerto em Viena e foi posteriormente registado em Londres com a ajuda de Rozi Plan no baixo, Momoko Gill na bateria e Conrad Singh na guitarra, músico que o acompanhou na fascinante passagem por Coimbra em Setembro passado. O desenho de capa pertence a Raimund Wong, especialista consagrado na matéria.

quarta-feira, 19 de abril de 2023

BILL CALLAHAN, Theatro Circo, Braga, 15 de Abril de 2023

















Sentados à espera de Bill Callahan pela sexta vez, foi da sua passagem pelo mesmo teatro em 2008 que nos lembramos pelas coincidências singulares - a ocupação sortuda de uma primeira fila, os fundos coloridos do palco de aleatória sequência, aquela mesma voz barítona a preencher-nos o espírito e, helas, as agora mesmas cinquenta e seis primaveras!

O regresso minhoto teve como suporte o baterista Jim White, o guitarrista Matt Kinsey e o saxofonista Dustin Laurenzi. Da anunciada e impressa presença de Emmett Kelly no baixo e de Sarah Ann Phillips no piano não se vislumbrou sinal. Nada que comprometesse o serão que primou pela apresentação de muitos dos temas de "YTILAER", mais um manifesto moderno de intimismo e fragrância da natureza, que desde logo se denotaram retomados em arranjos de electricidade estremecida e de surpreendente ondulação transpositora que só um saxofone consegue alcançar. 

Desde o incial "First Bird", passando por um quase irreconhecível mas magistral "Coyotes", até a um retesado "Naked Souls", o volume e intensidade da sequência, talvez estranha e rude para muitos, mostrou-se sublime no risco e na recriação poderosa. Em duas antiguidades dos Smog ("Some Steady Friends Around" e "Hit the Ground Running") e num dos seus clássicos já no encore ("Too Many Birds") essa recriação, caramba, acertou numa magnificência plena. 

Em toda esta propagação vibrante como não nomear o mestre de cerimónias Jim White, um mago da percussão que na sua inebriante habilidade e subtileza lustrou, do princípio ao fim, mais um recital fabuloso de Bill Callahan, nome de artista que se tornou uma lenda viva de incontornável prestígio e de ilimitado futuro. Do caraças...

RECORD STORE PRAY!

Um pouco por todo o mundo, no próximo sábado, 22 de abril, acontece o Record Store Day. Ao longo destes quinze anos, perdemos muito do entusiamo em relação à iniciativa dita alternativa e salutar hoje transformada num negócio imparável e, diríamos, abusivo. Mesmo assim, da lista de edições inglesa (melhor que a americana, apesar de por lá existir a promessa de um livro evocativo) vamos rezar por estas sobras:

terça-feira, 18 de abril de 2023

FAROL #151















O projecto Fruits Bats de Eric D. Johnson, que sugeria estar adormecido desde 2013, restabeleceu-se com "A River Running To Your Heart", álbum deste mês e o décimo desde 1997. No entretanto, Johnson integrou e integra os magníficos Bonny Light Horseman ao lado de Anaïs Mitchell e Josh Kaufman e dispôs de algum tempo para uma segunda sessão de versões da clássica The Lagniappe Sessions

As duas escolhas são apeletivas - "The First Time Ever I Saw Your Face" escrita por Ewan MacColl em 1957 para a sua mulher Peggy Lee e "Everybody’s Talkin’" da autoria de Fred Neil (1966) e que, três anos depois, teria a sua mais conhecida versão a cargo de Nilsson para banda sonora do filme "Midnight Cowboy". É por aqui...

LISA MORGENSTERN, INSPIRAÇÃO DURIENSE!















A estreia, aclamada, da jovem compositora Lisa Morgenstern em Portugal aconteceu em 2018 no pequeno auditório do Theatro Circo de Braga. Agendado está, agora, um regresso mais a norte marcado para o dia 12 de Maio, sexta-feira, no Teatro de Vila Real. O local será a sede de uma residência artística que deverá permitir compor um tema inspirado na paisagem duriense e de que fará a revelação nessa oportunidade.

Foi, aliás, no referido ano que editou o álbum "Chameleon", registo onde recebeu a ajuda de Sebastian Plano, no qual explora a composição a partir de vários sintetizadores e teclados, que incluem o piano clássico, e a que junta a voz de amplitude marcante. A sua assinalável destreza e delicadeza é bem nítida na banda sonora que assinou para a recente série "The Empress" da Netflix e para o documentário "Dear Memories" sobre o fotógrafo alemão Thomas Hoepker da mítica agência Magnum

Já este ano publicou o EP "The Wind Tunnel Session", três temas ao lado do Canea Quartett que, ao longo de um único dia, gravou num túnel de vento obsoleto instalado num centro de pesquisa de aerodinâmica berlinense.       
 


segunda-feira, 17 de abril de 2023

DAVE DOUGLAS & JOYE BARON DUO, Auditório de Espinho, 14 de Abril de 2023

Foto: facebook Auditório de Espinho

















Quando um trompetista e um baterista, lado a lado, se juntam em palco para tocar, serão muitos os trilhos sonoros a explorar. Podem e devem (?) ser treinados, verter sobre clássicos ou respeitar pautas e convenções de algum rigor de forma a cumprir um alinhamento estável. Quando esses instrumentistas são Dave Douglas e Joye Baron, o grau de imprevisibilidade torna-se exponencial no sentido em que os estilos, os discos, as parcerias e os cruzamentos de anos de experiência multiplicam as hipóteses de ramificação. 

Assente numa cumplicidade longínqua, o serão apostou num assumido improviso de jazz livre em que se valorizou a sonoridade, quase sem amplificação, de uma bateria que Byron percorreu nos maravilhosos recursos de batimentos e subtilezas, como que desafiando Douglas a segui-lo, sem contemplações, no sopro vibrado do trompete. Um verdadeiro testemunho da invenção a que música se obriga mas também da inquietude que ela constantemente proporciona e das questões que levanta - perguntou-se se o que se ouvia seria ensaiado ou inventado e a resposta, tal e qual e a motivar gracejos e humor, não dispensou a confissão do ensaio ou da prática prévia em separado, condição obrigatória para que o repentismo e a conivência vividas se provassem ser um imperdível e irrepetível momento de inconformismo artístico. Uma maldita-boa experiência... 

sexta-feira, 14 de abril de 2023

PATRICK WOLF, RETORNO VALENTE!





















A vida de Patrick Wolf não têm sido fácil. Já antes de pandemias, guerras e inflações, o músico britânico se tinha refugiado, sozinho, num hiato artístico motivado por problemas legais e financeiros, tempo aproveitado para preparar o livro de poesia "The Ghost Region". Juntaram-se mais azares como um atropelamento aquando de férias em Veneza e a súbita morte da mãe, aumentando a sua apreensão quanto ao futuro. 

Longe de novos discos (2012) e dos palcos (2018) - a última vez que nos visitou foi em 2013 em Famalicão - só em final do ano passado uma primeira canção, por sinal, o primeiro single de um novo EP, foi dado a conhecer. Foi escolhido o dia 11 de Novembro para publicar "Enter the Day", precisamente, vinte anos depois da estreia com "The Patrick Wolf E.P.", uma das cinco canções de "The Night Safari", EP saído hoje e com edição limitada em vinil disponível no site do autor. 

O dia serve ainda para divulgar "The Bowline Knot", curta-metragem realizada por Joseph Wilson que apresenta "The Night Safari" e "Nowhere Game", mais dois dos cinco novos temas, todos com arranjos do próprio Wolf que, note-se, é o responsável pela totalidade das vocalizações, instrumentos e sons (harpa, orgão, viola, violino, piano, Moog, Prophet 5 e registos ao ar livre), numa produção de Brendan Cox. 

Sinal positivo é também a digressão "The Moonbow over Bedlam Tour” que a partir de segunda feira percorre a Grã-Bretanha durante uma semana e que se espera alcance outras paragens continentais e soalheiras. Cruzes!


quinta-feira, 13 de abril de 2023

KING KRULE, FLUTUANDO NO ESPAÇO!





















Três anos depois, o já não tão miúdo Archy Marshall aka King Krule regressa com o álbum "Space Heavy" com data de publicação agendada para 9 de Junho. São quinze novas canções escritas entre Liverpool e Londres durante 2020 e 2022 e, posteriormente, parafinadas pelos habituais parceiros Dilip Harris (produção), Ignacio Salvadores (saxofone), George Bass (bateria), James Wilson (baixo) e Jack Towell (guitarra). 

O primeiro single "Seaforth", com video de Jocelyn Anquetil, que tratou do anterior "Alone, Omen 3", confirma a boa forma que Krule nunca perdeu e desafia-nos a imaginar o poderoso e idiossincrático espaço sónico que as suas canções permitem conectar, flutuando...

(RE)LIDO #114





















NICK DRAKE - Il ragazzo sotto la quercia 
de Pipo Russo. Florença; Edizioni Clichy, 2021 
A figura de Nick Drake tem em território italiano uma expressão e culto surpreendentes. Pelo menos, é isso que transparece da inusitada quantidade de livros e recensões sobre a sua vida, canções e discos que nos últimos anos por lá florescem de surpresa mediante uma atenção ferrenha quanto à sua música. Temos por aqui feito nota dessa inquestionável perdição, centrando a visibilidade em diversas edições impressas que se sobrepõem nas informações e tratamentos das vicissitudes biográficas de uma lenda, ainda e sempre, misteriosas e sedutoras. Pena que as revelações sejam sempre inconsequentes... 

O caso deste pequeno livro de bolso é o perfeito exemplo desse repetido díssono. Bem feito e paginado, usando papel de qualidade e apostando num desenho sóbrio e cuidado, as suas noventa páginas percorrem-se, no entanto, num ápice decepcionante em partes de separação vulgar - uma pequena biografia em dez datas marcantes, um ensaio do autor que dá lhe título, uma compilação de traduções para italiano de algumas das líricas, intercaladas com uma vintena de fotografias icónicas, e a selecção de sentenças elogiosas de figuras como Robert Kirby, Joe Boyd, Robin Frederick ou Vashti Bunyan. Nada de novo, nada de significativo e inédito já que, por exemplo, a totalidade das letras de Drake mereceram já uma tradução total em italiano apesar da pobreza da publicação

Seria, pois, o referido ensaio de Pipo Russo a parte mais saborosa do esforço. Chamou-lhe "Il ragazzo sotto la quercia", ou seja e numa transcrição livre, "O rapaz debaixo do carvalho", o que poderia remeter para a série de fotografias de Keith Morris obtidas no Regents Park londrino em 1970, quatro delas usadas no interior para encerrar o livro sem qualquer anotação, tal como as restantes, quanto ao seu autor ou proveniência! A socapa talvez explique o porquê de não ter sido usada, como parecia óbvio, uma delas para a imagem de capa mas a referência é, afinal, uma alusão à tumba do próprio Drake no cemitério de Santa Maria Madalena de Tanworth-in-Arden, situada por baixo de um imponente carvalho. Mas o que esconde um título tão romântico? 

A tentativa literária começa com um "Olá Nick e obrigado pela melancolia". Estamos, assim, perante uma abordagem veneradora de feições poéticas de (in)disfarçado género epistolar pleno de perguntas e inquirições a um destinatário suspirado. Porquês sobre o "céu do norte", o "que disse o tempo" ou "um sítio para estar" que, invariavelmente, esbarram num acumular de futilidades à volta das letras, das suas eternas metáforas e significados. Nas trinta páginas de suposta conversa é como se o músico estivesse do outro lado de uma mesa ou sentado no sofá receptivo a confissões e dúvidas - "Cada um de nós teve sua própria maneira de conhecer a tua música, Nick." (pág. 28) -, uma viagem tristonha que resulta num monólogo de devoção compreensível ainda que de dimensão confusa e préstimo duvidoso, mesmo que o nosso parco italiano possa ter condicionado na exaltação. 

Se há virtude que podemos apontar a esta publicação, foi na filmografia final, de três menções, que a encontramos - chama-se "Nick Drake - Songs in a Conversation", é um documentário realizado por Giorgio Testi estreado na Festa del Cinema de Roma em 2019 e aparenta seriedade maturada no gosto e amor de Roberto Angelini e Rodrigo d’Erasmo por Nick Drake, convocando outros artistas italianos para uma série de confissões e versões de canções registadas por John Wood, o mítico produtor dos três álbuns que Drake gravou em vida. Ao filme soma-se a edição de um disco de edição recente mas já audível na sua totalidade. 

Se le canzoni fossero battute in una conversazione, la situazione andrebbe bene...


terça-feira, 11 de abril de 2023

ARTHUR RUSSELL, COMPILAÇÃO INÉDITA!





















O legado de Arthur Russell (1951-1992), que sugere ser de fonte inesgotável, terá novo reforço em Junho com a edição de uma compilação de inéditos chamada "Picture of Bunny Rabbit" com selo da Audika Records e da Rough Trade

Trata-se de material do tempo de "World of Echo", segundo álbum de originais de 1986, nove temas retirados do seu arquivo de fitas/cassetes e de dois vinis test pressing na posse da mãe e da irmã, sendo um deles datado de 15 de Setembro de 1985. Compreende ainda uma versão a solo do longo "In the Light of a Miracle", a faixa título escrita mesmo para um coelho de um amigo e "The Boy With Smile", o primeiro dos inéditos a dar-se a ouvir.  

A nova edição junta-se a uma imparável redescoberta do vanguardismo estético e de composição de Russell que valeu já várias versões e homenagens e até autorização para experiências modernas a partir das suas canções e de que foi bom exemplo "Iowa Dream" (2019), uma curadoria do admirador Peter Broderick

sexta-feira, 7 de abril de 2023

ERLEND ØYE, EP SURPRESA!

A passagem Erlend Øye pelo México em Dezembro passado foi aproveitada para compor algumas novas canções e visitar estúdios de gravação. Num deles, o Psicopsia Studios da propriedade de Fernando Ramirez, promotor da tournée, acabou por registar sete temas incluídos num EP, melhor, mini-álbum editado digitalmente no dia de hoje. 

O disco "Winter Companion - Recorded in Mexico City January 2023" começa com "Spider", tocada semanas antes num concerto natalício e que recebeu colaboração de um trio de vozes locais entre as quais Clara Cabrián, autora da fotografia de capa, no que sugere quase uma canção infantil. Um outro tema é "Be the One", original um pouco anterior já que foi escrita em 2018 de visita ao Chile e foi agora registada coma ajuda de David Aguilar. Do alinhamento fazem ainda parte duas versões - "Wichita Lineman" (1968) de Jimmy Webb e Glen Campbell e "New for You" (2004) dos The Moore Brothers. Lá para o Verão a casa italiana Say Yes terá a rodela de vinil pronta. 

Para já, deixamos por aqui as suas duas primeiras faixas, indicando o caminho, imperdível, para as restantes ...


quinta-feira, 6 de abril de 2023

ASHLEY HENRY, AMOR VIVO!

















O jovem pianista, compositor e produtor inglês Ashley Henry promete para Maio um novo EP que será antecedido pela divulgação de dois temas - o primeiro, "Love Is Alive", tem inspiração no trabalho de Bell Hooks (1952-2021), autora, professora e activista antirracista norte-americana e funciona como um manifesto de primavera para enfrentar medos e desesperanças. 

O próximo trabalho segue-se ao aclamado disco de estreia "Beautiful Vinyl Hunter" de 2019 e que veio apresentar ao vivo no jardim de Matosinhos em Julho passado. Por lá também ecoou "Melanin", um single excelente com menos de uma ano que se aproveita para recordar. O segundo álbum está, entretanto, agendado para 2024.


quarta-feira, 5 de abril de 2023

ROCKY RACOON #17
















A 4 de Abril de 1963 os The Beatles deram um concerto em Stowe, um género de colégio privado de Buckinghamshire, sudoeste de Inglaterra, a pedido de um dos seus alunos nascido em Liverpool e mediante o pagamento de 100 libras. Em 2018, já algumas fotografias inéditas do espectáculo e da passagem pelas instalações tinham sido publicadas e agora, sessenta anos depois, surgiu a gravação do concerto feita em fita analógica e conservada em excelentes condições. 

Trata-se do primeiro registo de um concerto dos Fab 4 e que mereceu segunda-feira passada divulgação inesperada através do programa "Front Row" da BBC apresentado por Samira Ahmed, uma história captada no local com participantes e entusiastas coevos e com Mark Lewisohn, historiador da banda. 

Entretanto, a emissão radiofónica teve já diversos upgrades ilegais sempre bem-vindos, mesmo com sofríveis traduções como o de abaixo!

ALEX ZHANG HUNGTAI, PEDRO SOUSA, GABRIEL FERRANDINI, Passos Manuel, Porto, 1 de Abril de 2023

Prevista para a noite de Sábado, a perfomance do trio Alex Zhang Hungtai, Pedro Sousa e Gabriel Ferrandini só teve início já na madrugada de Domingo por motivos técnicos de última hora. Apesar do aviso quanto ao atraso dar a hipótese de reembolso para os mais apressados, ninguém arriscou perder a oportunidade esperada de ver novamente junto um trio criativo que a deslocação de Hungtai para os E.U.A. veio interromper. 

Na penumbra adequada da sala do Passos Manuel, fez-se pois uma viagem de teor percussivo longe do jazz tradicional e que explora sonoridades estranhas a um saxofone (Pedro Sousa) e uma bateria (Gabriel Ferrnadini) a que os loops e efeitos de Hungtai foram dando hipnotismo espiritual. Não será fácil descrever esta audaciosa triangulação sonora de conivência e partilha antiga e de camaradagem fortalecida. Ressaltou, poderemos no entanto dizer, uma propositada rudeza de imanência óbvia mas em que os efeitos e truques percutivos de Ferrandini se mostraram magistrais para a validade surpreendente de uma expedição de quarenta minutos "entre a descida aos infernos e a ascensão cósmica"...

terça-feira, 4 de abril de 2023

ANNA ST. LOUIS, REFRESCANTE!





















Sobre a misteriosa e bonita Anna St. Louis há, a partir de hoje, novidades. Ufa, confessamos que temos procurado não perder o rasto às suas canções mas o recato assumido chegou-nos a assustar numa constante interrogação sobre o que andaria, ou não, a menina a fazer ou a tramar. A estreia em 2017 com o álbum apropriadamente chamado "First Songs" e a visita a Coimbra dois anos depois motivaram, da nossa parte, imediata sedução que a delicadeza das canções e a simpatia da figura acelerou na atenção. 

Aproxima-se "In The Air" (Junho), um segundo disco de originais que se promete mais descomprometido e arriscado na abordagem vocal, nos arranjos pop e na dose de libertação artística. A ajuda recebeu-a do produtor Jarvis Taveniere (Purple Mountains ou Woods) durante as sessões de gravação ao longo de 2021 na cidade de Los Angeles mas também de amigos músicos que foi fazendo como Jess Williamson, Kacey Johansing e Oliver Hill nas cordas, Alex Fischel (Spoon) no piano, Josh Adams (Bedouine, Tim Heidecker) na bateria e Keven Lareau (Cut Worms, Hand Habits) na guitarra. 

O primeiro tema "Phone", dado a ouvir no dia de hoje, recebeu realização, outra vez amiga, de Christopher Good e da própria Anna St. Louis. Refrescante!

FAZ HOJE (31) ANOS #88

 














LOU REED, Coliseu dos Recreios, Lisboa, 4 de Abril de 1992
 
Público, por Luís Maio, fotografia de Alexandra Silva, 6 de Abril de 1992, p. 29

segunda-feira, 3 de abril de 2023

THE HIDDEN CAMERAS - OWEN PALLETT, Auditório de Espinho, 31 de Março de 2023

Em 2003 foi editado "The Smell of Our Own" dos The Hidden Cameras, segundo disco da banda canadiana que chegou à Europa via Rough Trade e onde o mentor e comandante produtor Joel Gibbs se rodeou de alguns dos melhores músicos em rotação da cidade de Toronto, entre os quais, o violinista e guitarrista Owen Pallett. A música era, então, o espelho de um cruzamento artístico independente e multifacetado agregador de tendências pop e posturas libertadoras. Gibb descreveu-a como "música popular de igreja gay" mas o projecto nunca passaria ao vivo por palcos portugueses. 

Vinte anos depois, foi marcada uma digressão celebratória pela Europa onde Gibbs se junta a Pallett na interpretação das velhas canções mas também no arriscar de temas entretanto compostos para um novo álbum dos Hidden Cameras. Irrequieto, gozão, desafiador e de guitarra em punho, Gibbs logo tratou sozinho de lançar o serão num rodopio constante de animação quer pelo bombar do bombo ou dos loops quer, acima de tudo, pela energia das vocalizações de insistente e variada robustez. As prometidas lições de português, praticadas ao de leve, foram substituídas por uma interatividade performativa com o público, invariavelmente, galhofenta. 

Na ajuda e partilha preciosa, esteve um Pallett, ainda e sempre, contido na comunicação mas bem disposto - as tiradas em português sobre camarões e bifes motivaram gargalhada colectiva - e decisivo na moldagem crescente de alguns dos temas e na sua efectiva eficácia. Quando já depois da sua actuação solitária, os dois se voltaram a reunir para encerrar o espectáculo, foi com "Shame", canção chave do referido disco, que uma cumplicidade e amizade submergiu ainda mais reforçada e que só pela música transparece de forma tão natural.

 

Passaram doze anos sobre o concerto de Owen Pallett em Aveiro, uma noite esgotada e memorável e a última das visitas do canadiano pelas redondezas já depois da mudança forçada do cognome de Final Fantasy. De volta, o momento serviu para assinalar a reedição dos dois discos desses tempos de alusão ao jogo-video e confirmar a validade reluzente das suas canções, traduzida no forte aplauso logo no final do primeiro tema ("This Lamb Sells Condos"), uma luminosidade que nunca mais se dissipou durante o serão. 

Sem pânicos e sobressaltos, receios que combate, como se ouviu, com a reprodução prévia de cantos de aves, será compreensível alguma insegurança atendendo à complexidade da composição onde o violino se impõe, notável, num jogo de sobreposições e camadas mas que, mesmo assim, não impediu que fosse a sua voz de reconhecível timbre a preencher de beleza a totalidade da sala. Mesmo à guitarra, em dois dos temas do último disco "Island" (2020), foi na mesma essa transcendência vocal que se elevou em "Lewis Gets Fucked Into Space" e "Fire-Mare" a um nível marcante e de forma a vincar as líricas incisivas e cortantes (o tal disco é, nas suas palavras, um bom presente para inimigos). 

Mesmo que solitário, mesmo que prudente, Pallett permanece inigualável numa expressão sonora intemporal que junta classicismo e arrojo modernista e de que "E Is for Estranged" e, principalmente, "Lewis Takes Off His Shirt" com que terminou o set, se continuam a mostrar de extra-ordinária sedução e encantamento. A sublime fantasia ao vivo, que aqui na casa foi o primeiro dos concertos a ser (mal) relatado, está por isso longe de estar terminada... Ainda bem! 

BACHARACH & COSTELLO, TREMENDO!

Temos, aos poucos, imergido na imensidão das quase cinquenta canções da soberba colectânea "The Songs of Bacharach & Costello" saída o mês passado. O mergulho, sempre reconfortante, tem rodado insistente num dos discos, o segundo de quatro, chamado "Taken From Life" onde se concentra um maior número de preciosidades. 

Trata-se de um repositório de dezasseis temas escritos nos últimos quinze anos pela dupla para uma proposta de musical à volta do disco original "Painted From Memory" (1998), adaptação ainda inédita do criador de séries para televisão Chuck Lorre e de Steven Sater a subir, um dia, aos palcos da Broadway. A pretensão, datada de 2014, envolveu a composição de novos temas, alguns já dados a conhecer no disco "Look Now" que Costello editou em 2018, e que foram gravados sob batuta do mestre Bacharach em Setembro de 2021 nos Capitol Studios de Los Angeles. 

Para lhe dar voz e encorpar a suposta banda sonora, foram convidados vários artistas como Audra Mae ou Jenni Muldaur, os pianistas Thomas Bartlett ou Jim Cox, que se juntaram a Bacharach, aos The Imposters e ao próprio Elvis Costello. É dele esta rendição do inédito "Look Up Again", uma canção com arranjo de Vince Mendonza e toque de Midas do mestre Bacharach, entretanto falecido no início de Fevereiro. Tremendo (literalmente)!

domingo, 2 de abril de 2023

RYUICHI SAKAMOTO (1952-2023)















Ao talento de Ryuichi Sakamoto, por aqui venerado desde há muito, juntamos sempre um respeito sentido pela sua resiliência, postura e bondade. Mestre das bandas sonoras, mestre da partilha, mestre da transcendência, um lutador pela arte até aos últimos tempos. Mestre, nunca a palavra fez tanto sentido. Peace, master!

sábado, 1 de abril de 2023

UAUU #681

(RE)LIDO #113





















OS BEATLES - Aventuras Pop Portuguesas
 
de Abel Soares da Rosa. Lisboa; Âncora Editora, 2022 
A façanha já com uma década continua a ser para o autor uma demanda obstinada - que raio se editou, publicou ou viu sobre os The Beatles e tudo à volta em Portugal? As respostas fazem já parte de, pelo menos, quatro livros a rondar os discos de vinil, as revistas, os jornais ou os filmes e as suas vicissitudes, um conjunto de imagens, documentos e textos que servem de fundo arquivístico revisitado de utilidade e prazer para aficionados, melómanos ou simples curiosos de uma temática eterna. O mais recente contributo é um género de best of das pesquisas anteriores às quais se juntam abordagens e averiguações inéditas que continuam a somar lanços saborosos às gavetas do arquivador. 

Neste particular, são deliciosos os pormenores contados por Hunter Davies, autor da única biografia autorizada sobre a banda, que de visita ao Algarve deu de caras com Paul e Linda (Eastman) McCartney e por ali se fixaria com a família em algumas temporadas até aos dias de hoje. A história e o convívio contados pelo próprio são uma preciosa panorâmica de um país em ditadura mas também das suas incontornáveis virtudes climatéricas e gastronómicas ou da estranheza de alguns dos costumes. "Oh Happy Days...", no título do texto que Davies escreveu para o livro. 

É desta altura "Penina", canção nascida num bar de hotel que se fez plena pelos portugueses Jota Herre e que a receberam por oferta de um simpático Paul McCartney, conhecendo posterior edição oficial. O livro surpreende no número de edições e versões que o tema acabaria por receber ao longo dos anos um pouco por todo o mundo, uma compilação de referências rebuscada e inédita que confirma a teimosia salutar de Abel Rosa sobre uma das tais aventuras pop portuguesas, talvez a mais conhecida e inesperada. 

A monografia contempla a reprodução, já publicada, da totalidade dos discos/EP's de 45 rotações que os The Beatles editaram em Portugal, acrescentando-lhe edições das colónias e das carreiras a solo no mesmo formato, bem como a totalidade do selo Apple em território nacional. Mas há mais. São mais de oito dezenas as versões de canções dos de Liverpool ou em sua homenagem que artistas e bandas portuguesas registaram ao longo dos anos e elas cá estão - quinze páginas de capas de discos de uma variedade de estilos abrangente, do proto-pimba ao fado, do prog ao coro infantil, desde o Conjunto Mistério em 1963 ("I'll Get You"/"Sem ti Não Sei Viver") até José Cid em 2018 ("The Fab 4") de 2018. Uma verdadeira ode aos Beatles... sem data previsível de término. 

O relato inédito de César Faustino, jornalista do "Diário de Lisboa" que cobriu a passagem efervescente da banda por Estocolmo em 1964, onde já tinham estado no ano anterior, afigura-se uma leitura de aprazível novidade. Os pormenores da entrevista que então realizou, o convívio inesperado com o quarteto e os meandros da sua publicação no vespertino lisboeta, são um contributo flagrante para perceber o fenómeno ciclónico que, em turbilhão, varria a Europa e que atingia países frios sem contemplação mas que não chegou a alcançar um jardim à beira-mar plantado, quase tropical, sem flores mas próspero nos preconceitos, a criar bolor e a limitar ousadias como filmes com gente a gritar e a dançar à custa de música perigosa. Estas histórias e facetas cinematográficas o autor faz, outra vez e de passagem, questão de recordar. 

Ou seja, mais uma colectânea despretensiosa mas oportuna que, para além de revelar o infindável esforço de um entusiasta, é um espelho das virtudes do coleccionismo e de uma paixão única - despertar admiração, motivar concorrência leal e ficar à espera de mais matéria "beatlesca". Nunca serão demais as "aventuras dos quatro"!